O fenômeno da terceirização é um segmento relativamente novo no ordenamento jurídico, sua incorporação se deu na década de 70 através da lei 6.019/74 que vem tratar do trabalho temporário, bem como por meio da lei 7.012/83 que regula o trabalho de vigilância bancária. Ocorre que devido ao processo de terceirização ser ramo recente e estar crescendo abruptamente no mercado de trabalho atual, surge daí a necessidade de regulamentação para sua aplicabilidade, principalmente, pela precariedade na qual os trabalhadores terceirizados se submetem e pela falta de limitação legal que venha a proteger as empresas terceirizadas dos entendimentos diversos dos Tribunais do Trabalho quanto à licitude ou ilicitude da prestação dos serviços.
Atualmente, a súmula 331 do C. TST trata da terceirização, sua edição veio para tentar regular as criticas existentes relacionadas à finada súmula 256 do C. TST na tentativa de solucionar os conflitos havidos entre empresas terceirizadas. A súmula 331 do TST manteve a mesma linha da raciocínio quanto à os efeitos jurídicos da terceirização ilícita, no entanto trouxe inovações na responsabilização do ente estatal afastando a responsabilidade objetiva do estado.
V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da lei 8.666, de 21/6/93, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre do mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
Para Maurício Godinho, a "terceirização é o fenômeno pelo qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação justrabalhista que lhe seria correspondente". Diante da situação o trabalhador seria inserido dentro da atividade desenvolvida pelo tomador, através de uma atividade produtiva assessória à principal, sem que a ele se aplique os mesmos direitos justrabalhistas decorrentes da prestação direta de serviço para a empresa tomadora. A súmula 331 do TST, hoje, limita a terceirização aos serviços de vigilância, limpeza e aos ligados a atividade-meio do tomador, desde que inexistente a subordinação e a pessoalidade, requisitos de um contrato de trabalho regular.
III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (lei 7.102, 20/6/83), de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
Ocorre que, o conceito de atividade-meio vem sendo constantemente derrubado pelos Julgadores nos conflitos envolvendo os serviços de terceirização, pois, diante da falta de delimitação da aplicabilidade do instituto, os Tribunais passaram a utilizar-se de um conceito meramente subjetivo na prolação de sentenças e decisões colegiadas decidindo, na maioria dos processos, pela ilicitude da terceirização.
Cumpre esclarecer que atividade-meio, segundo prescreve o doutrinador Maurício Godinho Delgado "são aquelas funções e tarefas empresariais e laborais que não se ajustam ao núcleo da dinâmica empresarial do tomador de serviços, nem compõem a essência dessa dinâmica ou contribuem para a definição do seu posicionamento no contexto empresarial e econômico mais amplo". São atividades desvinculadas do "foco" principal do tomador, que visam apenas prestar um suporte à atividade principal desenvolvida pela empresa. Em casos como este, não existe a subordinação jurídica e a pessoalidade do contrato de trabalho entre o terceirizado e a empresa tomadora dos serviços.
I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vinculo diretamente com o tomador de serviços, salvo o caso de trabalho temporário (lei 6.019, de 3/1/14).
Diante da inexistência de subordinação jurídica e pessoalidade entre a empresa contratante e o empregado prestador de serviços, não haveria a nulidade da terceirização tendo em vista que o empregado não esta inserido dentro da dinâmica estrutural da empresa, o que corrobora a tese de que não existe a responsabilização da empresa contratante pelos direitos trabalhistas decorrentes de uma relação de trabalho clássica.
Em decorrência dessa polêmica acerca do reconhecimento ou não da ilicitude da terceirização e, diante da avalanche de processos envolvendo a matéria, discute-se a respeito da viabilidade de delimitar o alcance da terceirização dentro do mercado de trabalho e no grande número de processos que vem sendo julgados por mera aplicação subjetiva da opinião dos Magistrados e Desembargadores em razão da ausência de posicionamento legal.
Ainda a respeito do tema em comento, atualmente, tramita perante o STF o Agravo de Instrumento em Recurso Extraordinário que discute a validade da terceirização das atividades de call center pelas concessionárias de serviços de telecomunicações. A grande discussão gira em torno do disposto no art. 94, II, da lei 9.487/97, que prevê a terceirização dos serviços de telecomunicação para as atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço prestado. A celeuma jurídica encontra-se, primordialmente, no fato de que a grande maioria dos julgados entende pela não aplicação no disposto na lei 9.487/97, e em consequência o TST acaba por negar a vigência do art. 97 da Carta Magna, que trata do Princípio da Reserva de Plenário.
Como se sabe, o principio da reserva de plenário previsto no artigo 97 da Constituição Federal visa, em linhas gerais, limitar o controle de constitucionalidade das normas infraconstitucionais, delimitando que apenas pela maioria absoluta dos membros do tribunal competente poderia ser declarada inconstitucional lei ou atos normativos. No entanto, grande parte dos Tribunais procuram meios de esquivar-se da aplicação do referido principio, situação ocorrida nos casos dos serviços de terceirização de serviços de telecomunicação.
Em decorrência do desrespeito ao principio em debate, inúmeros julgados acerca da constitucionalidade ou não da lei em comento surgira sem se quer ser observado o devido processo legal, gerando nada mais nada menos que uma insegurança jurídica diante da ausência de credibilidade legal e desrespeito ao disposto no texto Constitucional.
Segundo o Ministro Teori Zavascki, "O requerimento, formulado à base do art. 328 do RISTF e do precedente fixado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento da Questão de Ordem no RE 576.155, está amparado nas seguintes razões: (a) o Tribunal Superior do Trabalho consolidou linha jurisprudencial arredia à cláusula constitucional de reserva de plenário que, ao invalidar a legitimidade das terceirizações realizadas no âmbito dos serviços de call center, negou vigência ao art. 94, II, da lei 9.472/97; (b) a uniformização da jurisprudência trabalhista nesse sentido, com desconsideração ostensiva da legislação vigente, atingiu aproximadamente 10.000 (dez mil) processos, obrigando as empresas especializadas no oferecimento desse tipo de serviço a desembolsar vultosas quantias a título de depósito recursal para prosseguirem resistindo à aplicação do entendimento (...)".
Importante esclarecer que a Terceirização é um segmento que vem crescendo consideravelmente dentro do mercado de trabalho a fim de atender as demandas do mundo globalizado, conforme exposto anteriormente. E as atividades de telecomunicação concentram uma grande parte das atividades terceirizantes da atualidade, a discussão consiste essencialmente na possibilidade ou não de terceirizar os serviços de "call center" e se os ditos serviços se incluem na atividade-meio ou atividade-fim da tomadora.
A lei 9.472/97 que trata da lei geral de telecomunicações que prevê em seu art. 94, II, a possibilidade de terceirizar atividades inerentes, acessórias ou complementares a atividade-fim desenvolvida pela empresa de telefonia. Diante da previsão legal, cumpre esclarecer que as atividades de "call center" não constituem atividade principal das empresas de telecomunicação, representam mera complementariedade ao serviço por ela desenvolvido.
Art. 94. No cumprimento de seus deveres, a concessionária poderá, observadas as condições e limites estabelecidos pela Agência:
II - contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço, bem como a implementação de projetos associados.
Ocorre que mesmo diante da previsão legal, grande é o número de demandas trabalhistas envolvendo a discussão da legalidade da terceirização de serviços de telecomunicação, sob o argumento de que constitui atividade-fim das empresas de telefonia o serviço desenvolvido em centrais de "call centeres".
RECURSO ORDINÁRIO. TERCEIRIZAÇÃO. TELECOMUNICAÇÕES. CALL CENTER. LICITUDE. LEI 9.472/97. É fato incontroverso que a hipótese dos autos está ligada à prestação de serviços relacionados às telecomunicações, submetendo-se à disciplina legal traçada na Lei 9.472/97, cujo diploma legal possibilita no inciso II do seu art. 94 a terceirização daquelas atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço, ou seja, relacionadas à sua atividade-fim, mas que, com as quais não se confunde. A despeito da controvérsia que ainda existe a respeito da matéria, entendo que o dispositivo mencionado não deixa margem para dúvidas, ao falar em “atividades inerentes”, “acessórias” ou “complres ao serviço”. Não há razão, para que, prima facie, seja negada validade à contratação havida entre as demandadas. Em princípio, deve-se admitir, pois assim quis o legislador, a transferência do serviço de call center a terceiros, sem que isso signifique ofensa à lei ou tentativa de burla à legislação. (TRT-6 229542011506 PE 0000229-54.2011.5.06.0010, Relator: Ruy Salathiel de Albuquerque e Mello Ventura, Data de Publicação: 27/09/2012).
EMPRESAS DE TELECOMUNICAÇÕES. TERCEIRIZAÇÃO. SERVIÇOS DE CALL CENTER . LICITUDE. LEI 9.472/1997. SÚMULA 331 DO TST . Esta Corte vem adotando o entendimento de que é ilícita a terceirização dos serviços de call center por ser atividade fim das concessionárias dos serviços de telecomunicações, tomadoras dos serviços. Precedentes da SDI-1 desta Corte. Assim, ressalvo meu entendimento, para adotar a diretriz inscrita nos referidos precedentes. Recursos de Embargos de que se conhece e a que se dá provimento. (TST - E-ED-RR: 2201620105030106 220-16.2010.5.03.0106, Relator: João Batista Brito Pereira, Data de Julgamento: 10/10/2013, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 18/10/2013).
RECURSO DE REVISTA. PROCESSO ELETRÔNICO - TERCEIRIZAÇÃO. EMPRESA DE TELECOMUNICAÇÕES. -CALL CENTER- ATIVIDADE-MEIO. LICITUDE. RECURSO DE REVISTA. PROCESSO ELETRÔNICO - TERCEIRIZAÇÃO. EMPRESA DE TELECOMUNICAÇÕES. -CALL CENTER-. ATIVIDADE-MEIO. LICITUDE. Esta Corte tem entendido que é lícita a terceirização das atividades denominadas inerentes, acessórias ou complementares ao serviço de telefonia, nos termos do art. 94, II, da Lei nº 9.472/97 - Lei Geral das Telecomunicações -, sendo, portanto, indevido o reconhecimento de vínculo direto com a empresa tomadora dos serviços. No caso dos autos, a atividade terceirizada foi de call center , o que implica dizer que a Reclamante executava atividades alheias à oferta de telecomunicações, conforme definido pelo § 1º do art. 60 da Lei nº 9.472/97, não se ajustando ao núcleo da dinâmica empresarial da tomadora dos serviços, mas configurando mera atividade-meio. Precedentes desta Corte. Recurso de Revista conhecido e provido. (TST - RR: 875004420095030014 87500-44.2009.5.03.0014, Relator: Márcio Eurico Vitral Amaro, Data de Julgamento: 25/04/2012, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 27/04/2012).
RECURSO DE REVISTA. PROCESSO ELETRÔNICO - TERCEIRIZAÇÃO DE SERVIÇOS. EMPRESA DE TELECOMUNICAÇÕES. CALL CENTER . ILICITUDE. Esta Corte tem entendido que o artigo 94 da Lei nº 9.472/97 - Lei Geral das Telecomunicações -, ao autorizar a contratação de terceiros para o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complres ao serviço, não se refere à atividade-fim da empresa, mas apenas autoriza a terceirização de atividades-meio. No presente caso, o serviço terceirizado foi o de call center , o qual, nos termos da atual jurisprudência da SBDI-1 do TST e desta Turma, classifica-se como atividade-fim das empresas de telefonia, razão por que a hipótese dos autos revela-se enquadrada no item I da Súmula 331 do TST. Recurso de Revista não conhecido . (TST - RR: 9676320105030106 967-63.2010.5.03.0106, Relator: Márcio Eurico Vitral Amaro, Data de Julgamento: 06/02/2013, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 15/02/2013).
Em razão da instabilidade dos julgados em matéria de terceirização de serviços de telecomunicação, o Supremo Tribunal Federal entendeu por apreciar a questão de perto e constatar se a terceirização dos serviços complementares, acessórios ou inerentes são de fato atividades-fim das empresas de telefonia. Com a apreciação do STF, tem-se a esperança de que a celeuma jurídica chegara finalmente a um ponto de equilíbrio, limitando a atuação subjetiva dos Tribunais quando à interpretação das leis, tendo em vista os inúmeros recursos interpostos aos Tribunais Superiores na tentativa de impedir o desrespeito aos ditames Constitucionais e a não aplicação da lei por parte dos Julgadores.
Busca-se, com isso, afastar a insegurança jurídica das decisões envolvendo terceirização dos serviços de telecomunicação e a solidificação dos entendimentos jurisprudenciais a fim de que tanto a aplicação prática dos contratos de trabalho como as decisões proferidas pelos Tribunais estejam em consonância com o que prevê a lei.
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*Marina Rosado Dias é advogada do escritório Martorelli Advogados.