Normalmente, o empresário brasileiro necessita captar recursos financeiros junto a instituições bancárias para o desenvolvimento de suas atividades. Para isso, é extremamente comum que o empresário realize com uma instituição financeira um contrato de mútuo, no qual se obriga a restituir a quantia emprestada, com os acréscimos remuneratórios, no prazo contratado.
Na prática, para a celebração da operação financeira, o banco exige certas garantias da sociedade empresária, tais como, alienação fiduciária de bem imóvel, penhor de mercadorias, aval de seus sócios etc. Nessa medida, ao emitir um título de crédito em favor da instituição financeira, comparecem usualmente no ato os sócios da empresa na condição de avalistas da obrigação pecuniária e, portanto, responsáveis pelo pagamento desse título nas mesmas condições que o devedor principal (artigo 30 da lei Uniforme de Genebra).
Ocorre que é possível que estas empresas atravessem um período de abalo em sua saúde econômico-financeira e acabem por se socorrer do benefício legal da recuperação judicial, com o fim de superar essa dificuldade e propiciar condições para a manutenção de sua fonte produtiva, dos seus postos de trabalho e dos tributos gerados (artigo 47 da lei Federal 11.101/05).
A decisão de concessão desse benefício legal tem como efeito imediato, dentre outros, a suspensão de todas as ações e as execuções em curso contra as empresas em recuperação judicial (artigo 6º da lei Federal 11.101/05). Tal suspensão se aplicaria aos avalistas dos títulos de crédito das empresas em recuperação judicial?
De acordo com o artigo 49, § 1º da lei Federal 11.101/05, “os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso”, isto é, o deferimento da recuperação judicial não impede o prosseguimento das ações e das execuções em face dos avalistas dos títulos de crédito emitidos pela empresa em recuperação judicial.
Corroborando esse entendimento, o Enunciado 43 da Jornada de Direito Comercial consolidou que: “a suspensão das ações e execuções previstas no art. 6º da Lei n. 11.101/2005 não se estende aos coobrigados do devedor.”
Entretanto, mesmo com a clareza da dicção do artigo 49,§1º da lei Federal 11.101/05 e a vertente doutrinária que se firmou, a temática referente à suspensão das ações e execuções individuais propostas em face dos avalistas dos títulos de crédito foi levada repetidamente à discussão perante nossos tribunais.
No final do ano de 2014, em sede de julgamento do REsp 1.333.349, sob o rito dos repetitivos estabelecido no artigo 543-C do CPC, a 2ª seção do C. Superior Tribunal de Justiça, sob a relatoria do ministro Luis Felipe Salomão aprovou a seguinte tese: "A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das execuções, nem tampouco induz suspensão ou extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória, pois não se lhes aplicam a suspensão prevista nos artigos 6º, caput, e 52, inciso III, ou a novação a que se refere o artigo 59, caput, por força do que dispõe o artigo 49, parágrafo 1º, todos da Lei 11.101/2005.”
Nesse sentido, o C. STJ colocou uma pá de cal sobre o assunto, garantindo às instituições financeiras a possibilidade jurídica de executar os avalistas dos títulos de crédito emitidos pela empresa, independentemente da concessão da recuperação judicial à sociedade empresária ou mesmo depois de aprovado o plano de recuperação judicial.
Assim, conferiu-se maior segurança jurídica e econômica aos bancos para a concessão dos empréstimos financeiros às sociedades empresárias, uma vez que restou garantido às instituições financeiras, na hipótese de inadimplência do mútuo bancário, o direito de perseguir a satisfação do crédito junto aos avalistas dos títulos de crédito emitidos pela empresa, independentemente da concessão da recuperação judicial ou da aprovação do plano de recuperação judicial. Como se sabe, não há desenvolvimento econômico sem o mínimo de segurança jurídica. Dessa forma, é de se aplaudir a tese recentemente firmada pelo STJ.
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*Thiago Vinícius Capella Giannattasio é advogado da banca Chiarottino e Nicoletti – Advogados.