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Principais alterações à lei de arbitragem

A lei de arbitragem avançou de forma a melhor condizer com o panorama jurídico atual e a solucionar lacunas que anteriormente originavam amplos debates no meio jurídico.

5/8/2015

Após anos de discussão, foi sancionada pela Presidência da República e já está em vigor, a lei 13.129/15, que reforma a lei de arbitragem1, trazendo consigo uma série de novidades que modernizaram o instituto.

Uma das primeiras mudanças notáveis trazidas pela nova lei se encontra logo no artigo 1º da lei de arbitragem com a inclusão dos parágrafos 1º e 2º, permitindo a utilização do instituto da arbitragem pela administração pública direta e indireta.

Vale ressaltar que a prática de arbitragem por parte da administração pública indireta já era aceita pela maioria da doutrina. Neste sentido, o Poder Judiciário vinha admitindo procedimentos arbitrais para entidades públicas2, sendo que o STJ decidiu que, quando os contratos celebrados com entes públicos versassem sobre serviços públicos de natureza industrial ou atividade econômica de produção ou comercialização de bens, suscetíveis de produzir renda e lucro, ou seja, atividade econômica em sentido estrito, os direitos e obrigações deles decorrentes seriam transacionáveis, disponíveis e, assim sendo, sujeitos à arbitragem3.

A lei 13.129/15 também modificou a lei das Sociedades Anônimas4, ao inserir o artigo 136-A. O novo dispositivo regula a inserção de convenção de arbitragem no estatuto social, obrigando todos os acionistas, quando observado o quórum qualificado do artigo 1365 da mesma lei.

Antes da aprovação da nova lei, o § 3º do artigo 109 da lei das Sociedades Anônimas permitia a inclusão da convenção arbitral no estatuto social. Todavia, a falta de uma definição legal sobre a vinculação dos acionistas era utilizada como argumento por aqueles contrários à utilização da arbitragem nos casos em que o acionista não tivesse aprovado a respectiva cláusula compromissória. Tal controvérsia foi dissipada com a inclusão do artigo 136-A.

Ainda que a redação do referido artigo 136-A garanta o direito de retirada do acionista dissidente, o seu parágrafo 2º traz duas ressalvas: (i) caso a convenção represente condição para que os valores mobiliários de emissão da companhia sejam admitidos à negociação em bolsa de valores ou mercado de balcão organizado que exija dispersão acionária mínima de 25% das ações de cada espécie ou classe; e (ii) caso a convenção seja inserida em estatuto social de companhia aberta que cujas as ações sejam dotadas de liquidez e dispersão no mercado6.

Podem, portanto, não só as sociedades anônimas utilizar tal procedimento, mas também, as sociedades limitadas que contiverem cláusula de aplicação supletiva da lei das Sociedades Anônimas em seu Contrato Social. Contudo, tal convenção só terá eficácia após 30 (trinta) dias contados da Assembleia Geral que a aprovou.

Outro aspecto importante é a nova redação dos artigos 35 e 39 da lei de arbitragem estabelece que o STJ, e não mais o STF, homologue ou denegue sentença arbitral estrangeira. Tal alteração formalizou uma prática que já vinha sendo utilizada nos últimos anos. Isto porque a EC 457 transferiu a competência do STF para o STJ para processar e julgar sentenças estrangeiras.

Os artigos 22-A e 22-B foram também acrescentados à lei de Arbitragem. Com esses novos dispositivos, as partes poderão, antes de instituída a arbitragem, recorrer ao Poder Judiciário para a concessão de medida cautelar ou de urgência. As partes, contudo, nesta hipótese, deverão instituir a arbitragem no prazo de 30 dias contados da data de efetivação da decisão que concedeu a medida cautelar ou de urgência, sob pena de cessar sua eficácia. Depois de instituída a arbitragem, caberá aos árbitros manter, modificar ou revogar a medida cautelar ou de urgência concedida pelo Poder Judiciário.

Caso a parte tenha interesse em requerer uma das medidas e a arbitragem já esteja instituída, deverá dirigir-se diretamente aos árbitros.

Além disso, a lei 13.129/15 trouxe a inovação da carta arbitral com a inclusão do artigo 22-C, que nada mais é que um novo veículo de cooperação com o Poder Judiciário, caracterizando uma modernização e avanço da lei. Através da carta arbitral, os árbitros poderão requerer a colaboração do Poder Judiciário em medidas que demandem um ato estatal de força à distância para, por exemplo, o cumprimento de tutelas emergenciais.

Não obstante, a lei 13.129/15 não foi sancionada incólume. A Presidência da República vetou a alteração do parágrafo 2º e a inclusão dos parágrafos 3º e 4º ao artigo 4º da lei de arbitragem, que trata sobre o conceito de cláusula compromissória8.

De acordo com sua redação original, ficaria permitida, com limites, a inserção dessa cláusula em contratos de trabalho e em contratos de adesão relacionados a consumo.

No caso trabalhista, o Congresso Nacional havia aprovado que a cláusula só poderia ser inserida por iniciativa do trabalhador e apenas em casos de cargo de confiança ou de executivos.

A argumentação para o veto veio por parte do Ministério do Trabalho, ao declarar que tal cláusula acabaria por realizar distinção indesejada entre os empregados, assim como, recorreria a termo não definido tecnicamente na legislação trabalhista.

No caso de contratos de adesão, a inserção de cláusula de compromisso arbitral teria de ser por iniciativa do consumidor ou, ainda, mediante expressa autorização dele, sendo que a cláusula deveria ser redigida em negrito ou em documento apartado.

O respectivo veto foi a pedido do MJ, que alegou que a aprovação do parágrafo acarretaria em interpretação ampla da arbitragem nas relações de consumo, sem especificar que a manifestação de vontade do consumidor deva se dar também no momento posterior ao surgimento da controvérsia e não apenas no momento da assinatura do contrato. Tal ampliação, assim sendo, poderia significar um retrocesso, segundo o Ministério da Justiça, e ofensa ao princípio norteador de proteção ao consumidor.

Neste sentido, ainda que os vetos tenham ocorrido, a lei de Arbitragem avançou de forma a melhor condizer com o panorama jurídico atual e a solucionar lacunas que anteriormente originavam amplos debates no meio jurídico.

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1 Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996.

2 (REsp 606.345/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/05/2007, DJ 08/06/2007, p. 240).

3 Resp 612.439/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/10/2005, DJ 14/09/2006, p. 299.

4 Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976.

5 “Art. 136. É necessária a aprovação de acionistas que representem metade, no mínimo, das ações com direito a voto, se maior quorum não for exigido pelo estatuto da companhia cujas ações não estejam admitidas à negociação em bolsa ou no mercado de balcão, para deliberação sobre:”.

6 Nos termos do artigo 137, inciso II, alíneas “a” e “b”, da Lei das S/A.

7 De 31 de dezembro de 2004.

8 Mensagem de Veto nº 162, de 26 de maio de 2015.

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*André de Almeida e Ruy Menezes Neto são advogados da banca Almeida Advogados.

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