Verticalização
Hugo de Brito Machado*
O Tribunal Superior Eleitoral decidiu, com absoluto acerto, que nos termos da Constituição a verticalização é inafastável. O Congresso Nacional, todavia, aprovou a Emenda Constitucional que alterou a redação do § 1º, do art. 17, da Constituição, permitindo coligações “sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal,” vale dizer, extinguiu a verticalização. E disse ser aplicável “as eleições que ocorrerão no ano de 2006.”
Segundo o noticiário, tem sido questionada apenas a anterioridade anual exigida pelo art. 16 da Constituição, segundo o qual “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até 1 (um) ano da data de sua vigência.” Mas o assunto envolve, além da questão de direito intertemporal, também uma questão de fundo consistente em saber se é constitucional a própria extinção da verticalização.
A questão de direito intertemporal passa em primeiro lugar pela de saber se a palavra lei, no art. 16 da CF, inclui emenda constitucional. Resposta negativa nos foi dada pelo Professor Roberto Martins Rodrigues, em programa coordenado por Arnaldo Santos (TV canal 14), com inteira propriedade. Resta a questão de saber se a exigência da anterioridade de um ano é cláusula imodificável. Se for, mesmo por Emenda a inovação não vale. Esbarra no art. 60, § 4º, da Constituição.
Mais importante, porém, nos parece ser a questão de fundo, de saber se é válida a própria extinção da verticalização. E nos parece que a resposta a essa questão deve ser negativa. Em outras palavras, a interpretação do Tribunal Superior Eleitoral deve prevalecer porque a Emenda aprovada pelo Congresso Nacional é inconstitucional. Contraria flagrantemente o art. 60, § 4º, incisos I e IV, da Constituição Federal, que proíbem emendas à Constituição tendentes a abolir a forma federativa de Estado e os direitos e garantias individuais.
Realmente, a Constituição assegura a liberdade na criação de partidos políticos, desde que observados os preceitos que indica, dos quais o primeiro é precisamente o caráter nacional. Todo partido político deve ter caráter nacional. Com isto se preserva a unidade nacional, elemento essencial na Federação.
Note-se que a Constituição Federal considera tão importante a unidade nacional como elemento da federação que ao cuidar da intervenção federal nos Estados estabeleceu que a União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal exceto para manter a integridade nacional.(Art. 37, inciso I). E ao cuidar do sistema tributário proibiu à União instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional.(Art. 151, inciso ). Por outro lado, a disciplina dos partidos políticos está no Capítulo V, do Título II, da Constituição Federal, que trata precisamente dos Direitos e Garantias Fundamentais. E o estabelece, como garantia fundamental, ao lado dos direitos e deveres individuais e coletivos, dos direitos sociais, da nacionalidade e dos direitos políticos, os partidos que expressamente exige tenham caráter nacional.
A verticalização é, portanto, uma imposição do art. 17, inciso I, da Constituição Federal, que só admite partidos políticos de caráter nacional. E essa regra não pode ser alterada, mesmo por Emenda à Constituição, por força da proibição constante de seu art. 60, § 4º, incisos I e IV. A Emenda Constitucional 52, recentemente promulgada, ao mudar a redação do parágrafo 1º, do art. 17, desmentiu flagrantemente o estabelecido em seu inciso I, que impõe aos partidos o caráter nacional.
Resta-nos aguardar a decisão do Supremo Tribunal Federal, na esperança utilize a oportunidade para dar uma valiosa contribuição no sentido do fortalecimento de nossos partidos políticos e da unidade nacional, importante pilastra da Federação.
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