Migalhas de Peso

Taxa de juros no Brasil: expectativa de queda?

Consequências práticas da decisão do STF sobre a implicação da capitalização de juros na conjuntura econômica atual do Brasil.

11/3/2015

Como já amplamente divulgado pela imprensa nacional, o Plenário do STF manteve a validade da MP 1.963-17/00 (reeditada até a MP 2.170-36/01), que permite às instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a capitalização mensal de juros com periodicidade inferior a um ano.

Ressalvado o impacto jurídico da decisão, como a liberação dos 13.5841 processos que estavam com tramitação suspensa e a segurança jurídica assegurada acerca do tema, não é possível afirmar quais serão os reflexos objetivos da manutenção da MP quanto à prática corrente no mercado para aplicação de juros. O que se sabe, é que o burburinho gerado pela discussão sobre a validade x invalidade do referido dispositivo reascende a reflexão sobre a real implicação da capitalização de juros na conjuntura econômica atual.

Em uma análise histórica da legislação brasileira, é possível observar que o nosso sistema jurídico permite, dentro de certos critérios, a capitalização de juros desde 1850, quando o então vigente Código Comercial dispôs sobre a cumulação de juros vencidos aos saldos liquidados em conta corrente de ano a ano. Posteriormente, o Código Civil de 1916 (art. 1.262) também previu, desde que estabelecido em cláusula expressa, a possibilidade de fixar juros capitalizados aos empréstimos, ainda que acima da taxa legal. Em 1933, o referido dispositivo foi parcialmente revogado pelo decreto 22.626 (lei de usura), que permitiu a acumulação dos juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente, desde que em periodicidade anual2.

Mesmo não se tratando de matéria inédita, foi grande o alvoroço quando da reedição da MP 1.963/00. Dentre os diversos debates quer cercaram o tema, foi defendido que a capitalização de juros seria um forte instrumento para a redução das taxas, já que na prática bancária, existe a inclusão de um valor adicional as taxas nominais para compensar a capitalização não cobrada3. Dessa forma, a vedação da capitalização promoveria um efeito de penalizar os tomadores de créditos que são solventes, já que seriam onerados pela majoração generalizada dos encargos de mútuo.

Na mesma linha de argumentação seguiu a Exposição de Motivos da referida medida, elaborada pelo então ministro da Fazenda Pedro Malan. Foi ressaltado pelo i. Ministro a necessidade de adequar o valor do spread bancário por meio da diminuição do risco das operações, o que seria viabilizado pela redução das taxas praticadas em decorrência da possibilidade de capitalização de juros4.

Em resumo, os debates ocorridos no início da década indicavam a expectativa de créditos mais baratos e acessíveis no mercado, em virtude da equalização do risco bancário pela possibilidade de aplicação de juros de mora acima do patamar legal.

Já em 2015 o que se observa, em uma análise informal sobre o assunto, é que a tendência prevista de redução da taxa de juros não se concretizou. Como apontou o Procurador-Chefe do Banco Central, Isaac Sidney Menezes Ferreira, a insegurança causada pela potencial invalidade da mencionada MP causou um efeito reverso, ou seja, "os bancos assinavam contratos com juros capitalizados e altíssimos — caso o Judiciário viesse a declarar o contrato ilegal, o preço dos juros compensaria o risco"5.

Conforme dados fornecidos pelo Banco Central e compilados na tabela abaixo, é possível inferir que a taxa média mensal praticada nos últimos 6 anos pelas instituições selecionadas ultrapassa em mais de 50% o patamar de juros legais estabelecido em 1%.

TABELA - TAXA MENSAL PRÉ-FIXADA PESSOA JURÍDICA6

Instituição bancária 2009 2010 2011 2012 2013 2014
ITAU BBA S A 1,63 1,07 1,31 1,14 0,93 2,29*
CITIBANK S A 1,68 1,04 1,27 1,4 1,03 1,38
CAIXA ECONOMICA FEDERAL 1,79 1,54 1,73 1,98 1,52 1,67
SANTANDER S A 1,91 2,02 2,16 2 1,55 1,86
BANCO DO BRAISL S A 2,02 1,63 1,8 1,37 0,96 1,87
Média de Taxa de Juros 1,80 1,46 1,65 1,57 1,19 1,81

*Dado referente ao Itaú Unibanco

Vale lembrar que a capitalização de juros para empréstimos na Europa é, em geral, praticada e usual, o que coexiste em perfeita harmonia com taxas de juros estabelecidas em patamares acessíveis e muito inferiores aos disponíveis no Brasil.

Em conclusão, o que realmente se espera é que a decisão acerca da validade da MP 1.963/00 traga o efeito vislumbrado quando da reedição da medida: o barateamento do crédito e aplicação de taxa de juros pelas instituições financeiras que fomentem o investimento e aumento da capacidade produtiva do país.

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1 Clique aqui.
2 BABILÔNIA, Paulo Álvares; BARBOSA, Theresa Karina F.G; FERREIRA, José Coelho. A capitalização de juros no nosso sistema jurídico. Revista Jurídica do Planalto, Brasília, vol. 2, n. 12, maio 2000. (Clique aqui) Data de acesso: 25/02/2015.
3 LOYOLA, G. A pior maneira de reduzir os juros. Estado de São Paulo, São Paulo, 23 abr. 2000. In.: A capitalização de juros no nosso sistema jurídico, Revista Jurídica do Planalto, Brasília, vol. 2, n. 12, maio 2000.
4 ________. A capitalização de juros no nosso sistema jurídico. Revista Jurídica do Planalto, Brasília, vol. 2, n. 12, maio 2000. (Clique aqui) Data de acesso: 25/02/2015.
5 CANÁRIO, Pedro. Supremo autoriza capitalização de juros em empréstimos bancários. Conjur Consultor Jurídico. (Clique aqui)
6 Tabela elaborada de acordo com os dados fornecidos pelo Banco central do Brasil. (Clique aqui)
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*Carolina Barros Pires é integrante da equipe de Recuperação Extrajudicial de Créditos do Chenut Oliveira Santiago Sociedade de Advogados.

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