Migalhas de Peso

Indenização por dano existencial

Se há extensa demanda de trabalho, deveria o empregador contratar mais mão de obra, e não sobrecarregar um único empregado.

12/9/2014

Nos atendimentos pessoais que realizo no dia a dia, é comum clientes relatarem que a jornada de trabalho diária é tão extensa que acaba não sobrando tempo para as simples atividades diárias, como o lazer, e tampouco para o convívio em família. Em alguns casos, clientes relatam que acabaram se divorciando por conta do excesso de trabalho, pois não tinham tempo para se dedicarem a vida conjugal, para os filhos, etc., e sempre me questionam se tais fatos podem acarretar algum tipo de indenização na esfera judiciária. Assim, resolvi escrever um pouco sobre essa nova modalidade de indenização concedida na Justiça do Trabalho, a indenização por dano existencial.

O dano existencial consiste na violação dos direitos fundamentais da pessoa, direitos estes garantidos pela CF, que resulte algum prejuízo no modo de ser ou nas atividades executadas pelo individuo.

Em outras palavras, o dano existencial trata-se de um dano que decorre de uma frustração que impede a realização pessoal do trabalhador, reduzindo sua qualidade de vida. É uma forma de frustração de projetos (não profissionais) ou relações sociais dos trabalhadores, causadas por condutas ilícitas praticadas por seus empregadores.

Como exemplo de conduta ilícita do empregador, podemos citar a extensa jornada de trabalho que diversos empregados são submetidos constantemente. Em que pese tanto a Constituição Federal quanto a CLT determinem que a jornada de trabalho diário seja de 8 horas, podendo ser acrescida de no máximo mais 2 horas suplementares, e que tal regra visa proteger a saúde do trabalhador, a realidade fática é outra. Infelizmente é muito comum nos depararmos com empregados trabalhando sob jornadas de onze, doze, treze horas, e não raras vezes, até mais que isso.

Não raro também é o fato de que muitos empregados laboram por dois, três, e até mais anos, sem a percepção de período de férias de pelo menos 30 dias para descanso. Ou ainda trabalhando sem descanso semanal. E questiona-­-se: quando esses empregados terão seus momentos de lazer, prazer e convívio familiar...?

Em razão de fatos como estes, a jurisprudência e até mesmo o TST passou a conceder a esses trabalhadores indenização por dano existencial.

Ao contrário do dano moral e material, o dano existencial não diz respeito a esfera íntima do ofendido. Trata-­-se de um dano que decorre de uma frustração que impede a realização pessoal do trabalhador, com a perda da sua qualidade de vida.

Como caso concreto, podemos citar o recente julgado do TRT da 4º Região, que condenou uma empregadora a indenizar sua empregada em R$ 20 mil por danos causados aos seus projetos sociais, devido a exigência patronal de jornadas extensas. A citada empregada trabalhou por quase cinco anos das 8h00 às 20h00, entre as segundas e sextas-feiras, nos sábados das 8h00 às 16h00 e, em dois domingos por mês, das 8h00 às 13h00. Para os desembargadores do TRT da 4º região, a extensa jornada de trabalho, bastante superior ao limite fixado pela CF e pela CLT, gerou dano existencial à trabalhadora, já que acarretou no fim do seu casamento por causa de desentendimentos gerados pela sua ausência.

Ora, se há extensa demanda de trabalho nas dependências do empregador, deveria o empregador contratar mais mão de obra, e não sobrecarregar um único empregado.

Assim, penso que, com intuito de coibir determinados empregadores nos acometimentos ilícitos como os citados neste artigo, correto está o posicionamento da Justiça do Trabalho em condenar os empregadores que extrapolam de seu poder diretivo ao não permitirem que seus funcionários desfrutem de período de lazer, convívio familiar e projetos pessoais. Penso também que os empregadores deveriam investir em seu setor de recursos humanos, que hoje é considerado o ativo mais valioso de uma empresa, pois a partir de uma cuidadosa análise e prevenção de situações com as descritas, esta poderia ser a chave para evitar possíveis condenações em indenização por dano existencial. Além disso, sabemos que, funcionários felizes e dispostos, produzem mais.

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*Aline Carla Lopes Belloti é advogada do escritório Loguercio, Beiro e Surian Sociedade de Advogados.


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