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O terrorismo fiscal do CONFAZ contra os exportadores

O que torna o terrorismo tão devastador é que, em nome de uma causa qualquer, atacam-se inocentes, ao invés de atacar de modo direto os inimigos. É justamente da sensação de terror dos inocentes, atacados sem qualquer motivo justo, que se alimenta o terrorismo. É da sensação de pânico dos mais fracos, que vive o terrorismo. Em busca de se promoverem as mais diversas causas, opta-se deliberadamente por atacar aqueles que sabidamente são inocentes.

23/1/2006


O terrorismo fiscal do CONFAZ contra os exportadores

Leandro Marins de Souza*

Bernardo Strobel Guimarães**

O que torna o terrorismo tão devastador é que, em nome de uma causa qualquer, atacam-se inocentes, ao invés de atacar de modo direto os inimigos. É justamente da sensação de terror dos inocentes, atacados sem qualquer motivo justo, que se alimenta o terrorismo. É da sensação de pânico dos mais fracos, que vive o terrorismo. Em busca de se promoverem as mais diversas causas, opta-se deliberadamente por atacar aqueles que sabidamente são inocentes.

Exatamente essa atitude de puro terrorismo, adotaram os Estados em relação à compensação pelas perdas de receita decorrentes da isenção do ICMS para as exportações que lhes é devida pela União. Vejamos.

A chamada Lei Kandir (LC n.° 87/96) instituiu em seus arts. 3°, II 32, I, de modo absoluto, a isenção do ICMS para as exportações de mercadorias, desde a publicação da lei. Ainda, está garantido por essa Lei o direito do aproveitamento dos créditos gerados aos exportadores pelo ingresso de insumos que sofrem a incidência do ICMS; mais ainda, por força do contido no art. 25, §1°, I e II, os os créditos acumulados em virtude das operações de exportação podem ser aproveitados mediante a imputação a outro estabelecimento do contribuinte, bem como a transferência a outros contribuintes. É de fundamental importância destacar que esses direitos do contribuinte exportador estão plenamente definidos na Lei Kandir, que é lei nacional que sujeita a Estados e ao Distrito Federal. Além disso, a Lei Kandir, neste ponto, não se remete à aprovação da legislação estadual para o aproveitamento e transferência dos créditos, sendo injunção direta da lei nacional.

De outro lado, a mesma Lei Kandir, em seu art. 31, estabeleceu compensação aos Estados e ao Distrito Federal a ser paga pela União, nos exercícios de 2003 a 2006, disciplinada a matéria em seu anexo.

A compensação a ser paga pela União por conta da isenção conferida aos contribuintes exportadores não vem sendo paga, deixando os Estados de receber aquilo que lhes foi deferido em lei.

Com vistas a resolver essa situação, optaram os Estados (por intermédio do Protocolo ICMS CONFAZ n.º 30/2005, publicado em 26/11/2005) em buscar uma solução para o problema, invocando a má vontade da União para compor a questão. Para tanto, o Protocolo CONFAZ (órgão nacional que reúne todos os Estados representados por seus Secretários da Fazenda) dispõe – “Acordam os Estados e o Distrito Federal a não autorizar novas transferências de créditos de ICMS acumulados em decorrência da desoneração das exportações”.

Eis aí, legítimo ato de terrorismo, cometido contra quem é absolutamente inocente: o contribuinte exportador que, segundo os Estados, deve ser penalizado na sua cruzada contra a União.

Na briga por recursos entre a União e os Estados e Distrito Federal, houve-se por bem buscar solucionar o problema, justamente, tentando suprimir direitos dos contribuintes, absolutamente definidos em lei complementar. Nada além do que rasteiro terrorismo fiscal. Tal medida --- escancaradamente inconstitucional e ilegal, como se verá --- busca apenar contribuintes inocentes, causando terror entre eles com vistas a obter algum ganho diante de um inimigo que não se ousa atacar de modo direto. Nada muito diferente, em sua concepção, do que atacar a população civil inocente, ainda que invocando para isso uma nobre causa.

Todavia, o ato de “retaliação”, já alardeado aos quatro ventos, esbarra em tão sólidos obstáculos constitucionais tributários que é de se crer que o referido “Protocolo” busca cumprir um papel de ameaça à União e não se destina a ser aplicado na prática. Não quer se crer que algum dos articuladores da medida espere ou acredite, de fato, que o indigitado “Protocolo” possa derrogar lei complementar. Parece a solução muito mais medida de propaganda do que algo que de fato se pretenda implantar na prática.

Mas como prudência nunca é demais, caso se busque aplicar a restrição criada pelo “Protocolo” está-se diante de situação absolutamente injurídica. Isto porque não cabe aos protocolos do CONFAZ redefinirem as condições para que os contribuintes fruam do direito aos créditos acumulados de ICMS por força das exportações, bem como não pode angustiar a possibilidade de sua transferência nestas hipóteses, eis que já devidamente definida em lei complementar.

Assim, a intenção exposta no referido “Protocolo” é francamente ilegal, por contrariar norma vertida em lei complementar, bem como inconstitucional na medida em que a Constituição outorga à lei complementar a competência para regular as limitações constitucionais ao poder de tributar (art. 146, II) e a exportação não se sujeita à incidência de ICMS por força da própria Lei Fundamental (art. 155, §2º, X, a), além de garantida, nestes casos e pelo mesmo dispositivo, a utilização dos créditos gerados nas operações anteriores. Com efeito, não compete ao CONFAZ regular nada acerca do direito de fruição dos créditos de produtos exportados; mesmo que isso fosse possível não se poderia contrariar, frontalmente, a lei complementar que disciplina o tema. Do ponto de vista jurídico, o “Protocolo” é absolutamente despido de valor jurídico e não poderá implicar em qualquer constrangimento ao aproveitamento e à transferência dos créditos, conforme regulado na Lei Kandir.

Parece que os Secretários de Fazenda, reunidos no CONFAZ para a edição do malfadado “Protocolo”, fizeram vistas grossas a estes todos argumentos jurídicos que demonstram a possibilidade de, em se fazendo valer o “Protocolo”, gerar contendas judiciais entre contribuintes e os fiscos estaduais cujo panorama tende a acolher a ilegalidade e a inconstitucionalidade do “Protocolo” e, neste caso, a sucumbência dos Estados em honorários – mais uma vez prejudicando os cidadãos, que arcam indiretamente com este custo.

Todavia, diante da gravidade do incidente, mais importante não é a análise dos aspectos jurídicos da questão. Mais importante é notar o sistemático desrespeito ao contribuinte brasileiro, usualmente, bode expiatório das questões que envolvem a tributação. Sem dúvida a celebração do “Protocolo”, pautado na mais firme lógica terrorista, apenas vem a aumentar o rol de atrocidades contra o contribuinte brasileiro.
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*Mestre em Direito Econômico e Social pela PUCPR e advogado em Curitiba

**Mestrando em direito do Estado, na Universidade de São Paulo, Professor da Unibrasil e advogado em
Curitiba





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