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Um olhar crítico sob o projeto do marco civil da internet no Brasil

O projeto é em sua essência repetitivo e legisla sobre garantias já conquistadas pelo cidadão.

25/3/2014

O PL sobre o marco civil da internet estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil, determinando a alçada dos Estados, do DF e dos municípios em relação à matéria. Esse projeto busca, no meu pensar, trazer para o ambiente on-line os princípios e fundamentos constitucionais já garantidos a todos os brasileiros através da Carta Magna.

O estabelecimento de diretrizes para a internet é interessante para que cada ente público tenha delimitada a sua atuação, mas deve-se ter o cuidado para não extrapolar a necessidade de normatizar, em detrimento da liberdade de expressão, comunicação e interação proporcionados hoje pela internet.

O excesso de normas e regulamentos poderá romper as conquistas até aqui alcançadas, pois devemos entender a possibilidade do uso da internet como uma extensão de tudo aquilo que podemos e fazemos no mundo “real”, pois a prática de qualquer ato no mundo chamado de “virtual” é realizado por pessoas que já são protegidas e amparadas pela legislação hoje existente, que garante, em tese, a vida livre em sociedade organizada.

O projeto prevê proteções individuais já garantidas pelo CDC a todos os cidadãos brasileiros, como por exemplo, a obrigatoriedade da manutenção da qualidade contratada da conexão à internet; caso básico que não precisava de lei para fixar tal garantia, pois é dever daquele prestador de serviços entregar ao usuário, aquilo que foi contratado, e não há necessidade de legislar sobre o que já é lei, mas sim punir aquele que prometeu entregar e não entregou o que contratou.

Referido projeto assegura a não suspensão da conexão à internet, salvo por débito diretamente decorrente de sua utilização. Essa previsão é lógica e evidente, pois se você contratou um serviço, terá que recebê-lo a contento, não sendo mencionado no projeto, a necessidade de regulamentação, punição e fiscalização caso haja a suspensão da conexão, o que se sabe ocorre com certa frequência.

O Projeto onera e dificulta os direitos do cidadão quando diz que o provedor é responsável pela guarda de dados, mas que somente será obrigado a disponibilizar os registros de conexão e de acesso a aplicações de internet, de forma autônoma ou associados a outras informações que possam contribuir para a identificação do usuário ou do terminal, mediante ordem judicial, ou seja, para que o cidadão prejudicado tenha acesso aos dados e registros de conexão, depende da contratação de um advogado, para que este obtenha uma ordem judicial, para que tenha acesso, por exemplo, aos registros de conexão. Neste sentido, levando-se em conta a morosidade do Judiciário e a velocidade com que as coisas se propagam e acontecem na internet, verifica-se a dificuldade de adaptação para o cumprimento e solução dos casos urgentes.

Um ponto positivo é a definição, nos casos de provisão de conexão à internet, de que cabe ao administrador do sistema autônomo respectivo o dever de manter os registros de conexão, sob sigilo, em ambiente controlado e de segurança, pelo prazo de um ano, sendo que, esse dever não poderá ser transferido a terceiros.

Outra vantagem é a previsão de entendimento já firmado pela Jurisprudência, de que o provedor de conexão à internet não será responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros; e somente poderá ser responsabilizado se, após ordem judicial específica ou comunicação do ofendido, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.

Acertadamente, o Projeto deixou para a Lei dos Direitos do Autor, as regras no que se refere às infrações aos direitos do autor e conexos na internet.

Também coloca como dever constitucional do Estado na prestação da educação, em todos os níveis de ensino, a capacitação integrada a outras práticas educacionais, para o uso seguro, consciente e responsável da internet como ferramenta para o exercício da cidadania, a promoção de cultura e o desenvolvimento tecnológico, no sentido de promover a inclusão digital; buscar reduzir as desigualdades, no acesso às tecnologias da informação e comunicação.

Concluindo, o projeto tratado como marco civil, é em sua essência, repetitivo e legisla sobre garantias já conquistadas pelo cidadão, quando a real necessidade que se vislumbra hoje, é a necessidade dos poderes legislativo, executivo e judiciário, cada um no seu limite de atuação, legislar no sentido de dar cumprimento principalmente, ao dever do Estado de dar educação, saúde, segurança e transporte de qualidade, garantindo aos cidadãos, o que já é dever constitucional, e não é cumprido.

Os cidadãos desejam e precisam que as leis já existentes sejam fiscalizadas de forma mais dinâmica, isonômica e prática; que haja punição justa e definitiva dos infratores e que haja vontade política para fomentar o exercício da cidadania, disseminar os valores da vida em sociedade, informar e educar a população sobre quais são os seus direitos e seus deveres, na busca da construção de uma sociedade justa e livre, com respeito mútuo entre os cidadãos, em qualquer ambiente, “virtual” ou “real”.

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* Jane Resina F. de Oliveira é advogada, sócia fundadora do escritório Resina & Marcon Advogados Associados.







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