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STF: A criminalidade de bagatela e a reincidência

A Suprema Corte trouxe um interessante posicionamento sobre o tema em questão: acostumado a invocar os requisitos para a concessão deste benefício, o STF se deparou com uma situação um pouco diferente da comumente analisada na prática forense.

2/2/2014

A Suprema Corte trouxe um interessante posicionamento sobre o tema em questão: acostumado a invocar os requisitos para a concessão deste benefício, o STF se deparou com uma situação um pouco diferente da comumente analisada na prática forense.

Com efeito, um paciente socorreu-se de um habeas corpus ao STF para que fosse reconhecida a insignificância de sua conduta, consistente na prática de um crime de furto duplamente qualificado, mediante escalada e rompimento de obstáculo. Todavia, não teve sua pretensão atendida porque a Suprema Corte, em razão de ter sido reconhecida sua reincidência, além da incompatibilidade da modalidade delitiva com o princípio da insignificância, indeferiu a pretensão.1

Inicialmente, cumpre ressaltar que o princípio da insignificância (ou criminalidade de bagatela) tem a natureza jurídica de causa supralegal (não está prevista em lei) de excludente da tipicidade. Isto é, uma vez reconhecida torna a conduta do agente atípica.

A origem deste instituto remonta aos romanos, que já vislumbravam que determinadas questões, dada a sua insignificância jurídica, não necessitavam da intervenção de seus pretores: de minimis non curat praetor (o pretor não cuida do que é mínimo).

Da mesma forma, com a evolução do pensamento jurídico, a doutrina e jurisprudência passaram a entender, de forma extremamente pacífica na seara penal, que determinadas condutas, quando atendidos certos requisitos, não demandam a atuação do Poder Judiciário. Ou seja, existem conflitos penalmente insignificantes que, por si sós, descaracterizam o caráter criminoso da conduta do agente.

De qualquer modo, o STF é cristalino ao trazer requisitos de ordem objetiva, para que se possa aplicar de forma justa e coerente o princípio em análise, a saber:

- Conduta Minimamente Ofensiva do Agente;

- Ausência de Risco Social da Ação;

- Reduzido Grau de Reprovabilidade do Comportamento;

- Inexpressividade da Lesão Jurídica

Desta feita, o STF, valendo-se desses requisitos, combinou-os de forma interessante com outro instituto, com o objetivo de atingir uma das finalidades sociais do direito penal: a prevenção da reincidência.

Sendo assim, o STF entendeu que ainda que seja possível, em tese, reconhecer a insignificância da conduta, há que se atentar para o fato do agente ser reincidente, posto que:

1. A tipicidade penal não pode ser percebida como o exercício de mera adequação do fato concreto à norma abstrata. Além da correspondência formal, a configuração da tipicidade demandaria uma análise materialmente valorativa das circunstâncias do caso concreto, para verificar a ocorrência de alguma lesão grave, contundente e penalmente relevante do bem jurídico tutelado.

2. Reincidência do Recorrente assentada nas instâncias antecedentes. O criminoso contumaz, mesmo que pratique crimes de pequena monta, não pode ser tratado pelo sistema penal como se tivesse praticado condutas irrelevantes, pois crimes considerados ínfimos, quando analisados isoladamente, mas relevantes quando em conjunto, seriam transformados pelo infrator em verdadeiro meio de vida.
3. O princípio da insignificância não pode ser acolhido para resguardar e legitimar constantes condutas desvirtuadas, mas para impedir que desvios de conduta ínfimos, isolados, sejam sancionados pelo direito penal, fazendo-se justiça no caso concreto. Comportamentos contrários à lei penal, mesmo que insignificantes, quando constantes, devido à sua reprovabilidade, perdem a característica da bagatela e devem se submeter ao direito penal.2

Percebe-se, portanto, que o STF exige que o intérprete não verifique única e tão somente a possibilidade em tese de aplicação do princípio da bagatela. É preciso um plus: o criminoso contumaz, mesmo que pratique comportamentos penalmente insignificantes (de forma isolada), deve ser repreendido pelo Direito Penal, posto que a gravidade em sua reiteração de condutas é incompatível com a criminalidade de bagatela.

Portanto, o posicionamento do STF veio ao encontro dos anseios de estudiosos do Direito Penal, de forma a racionalizar a aplicação do princípio da insignificância, com a intenção de garantir que o direito penal atue quando seja de fato necessário, sem considerar apenas o fato praticado, mas também a pessoa do agente.

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1 HC N. 112.811-SP, Relatora: Ministra Cármen Lúcia.

2 HC N. 112.811-SP, Relatora: Ministra Cármen Lúcia.

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* Eudes Quintino de Oliveira Júnior, promotor de justiça aposentado, mestre em Direito Público, doutorado e pós-doutorado em ciências da saúde, advogado, reitor da Unorp;

* Antonelli Antonio Moreira Secanho, advogado, bacharel em Direito pela PUC/Campinas e Pós Graduação “Lato Sensu” em Direito Penal e Processual Penal pela PUC/São Paulo.




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