A equação econômico-financeira dos serviços públicos de abastecimento de água potável e de esgotamento sanitário é sujeita a um dilema ambiental. Se, por um lado, as receitas financeiras dos prestadores aumentam proporcionalmente ao maior consumo de água dos usuários ou dos esgotos tratados, de outro, porém, a água, insumo comum a ambos os serviços, é um "um recurso natural limitado, dotado de valor econômico" (art. 1º, caput, II, da lei 9.433/97).
A nova lei 12.862/13, que alterou a lei nacional de saneamento básico (lei 11.445/07), tentou conciliar este dilema por meio de duas medidas: uma de caráter programático, consubstanciada na inclusão da moderação do consumo como princípio fundamental dos serviços públicos de saneamento básico e, outra, de caráter pragmático, condicionando o acesso aos recursos federais à observância de determinadas diretrizes e objetivos relacionados à moderação no consumo de água.
O fato é que a lei 12.862/13 acrescentou às diretrizes e objetivos da Política Federal do Saneamento Básico (art.s 48 e 49 da lei 11.445/07) o estímulo ao comedimento do consumo de água por meio de ações de educação ambiental, de pesquisa e aportes tecnológicos e do apoio à adoção de equipamentos sanitários mais consentâneos com a preservação dos recursos hídricos. Mais do que representar normas meramente programáticas, tais diretrizes e objetivos têm efeitos diretos sobre os investimentos em saneamento básico, na medida em que orientam a "alocação de recursos públicos federais e os financiamentos com recursos da União ou com recursos geridos ou operados por órgãos ou entidades da União" (art. 50 da lei 11.445/07).
Portanto, para acessar aos recursos federais, sejam eles onerosos (como aqueles do Programa Saneamento para Todos) ou não onerosos (como os incluídos no PAC ou sujeitos a transferências voluntárias), os entes beneficiários deverão comprovar que, além de atender o princípio da universalização, devem atender também a premissa de uso racional (ou moderado) de água. Tais objetivos, nos termos da nova Lei, poderão ser alcançados tanto pelo desenvolvimento de novas tecnologias como pela promoção de ações de educação ambiental.
O próximo capítulo dessa alteração legislativa é a adequação das normas de repasse de recursos editadas pelas Unidades Gestoras, das quais se destacam a Funasa e o Ministério das Cidades. Se bem instrumentalizada, essa alteração promovida na lei 11.445/07 poderá efetivamente fomentar o desenvolvimento tecnológico na área de saneamento básico, conciliando os interesses dos prestadores de serviços com o adequado uso dos recursos hídricos. No entanto, se manejada de forma incorreta, configurará mais uma entre tantas restrições à contratação e execução dos recursos federais destinados aos serviços públicos de abastecimento de água e de esgotamento sanitário, frustrando a todos que almejam a universalização desses serviços.
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* Diego Gonçalves Fernandes é advogado do escritório Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados.