Geralmente os negócios celebrados por meio de contratos entre empresas brasileiras e estrangeiras contêm uma cláusula compromissória que estabelece, em caso de litígio entre as partes, que a questão será decidida por um juízo arbitral previamente designado.
Assim, na maioria dos casos, resolve-se o litígio no país designado, por meio de um tribunal arbitral, cuja decisão, posteriormente, é submetida ao STJ, que deverá homologá-la, para que, então, possa ser executada perante o Poder Judiciário brasileiro, nos termos do artigo 105, inciso I, alínea "i" da CF/881.
No caso de ambas as empresas estarem localizadas no Brasil, quando há, no contrato, previsão de referida cláusula compromissória, muitos ainda assim submetem o litígio ao juízo arbitral, mesmo quando se trata de inadimplemento contratual, formalizado por título de crédito, visando "atender" o quanto disposto no contrato.
Ocorre, contudo, que todo esse processo para a perseguição do crédito nem sempre é necessário. Senão, vejamos. Se a obrigação que se pretende exigir estiver pautada em um título executivo que atenda os requisitos de liquidez, certeza e exigibilidade2, o interessado pode se valer diretamente do Poder Judiciário brasileiro, com a propositura de uma ação de execução, ainda que exista a previsão expressa da cláusula compromissória no contrato celebrado entre as partes.
A ação de execução não poderá, portanto, ser extinta fundamentada na previsão de cláusula compromissória, que continua produzindo efeitos para resolver outras questões de natureza cognitiva, possibilitando, dessa forma, a convivência harmoniosa das duas competências: judicial e arbitral.
Nesse sentido, inclusive, se pronunciou recentemente, em 12/3/13, a ministra Nancy Andrighi, da 3ª turma do STJ, ao analisar o REsp 1.277.725/AM e decidir que "a existência de cláusula compromissória, de um lado, não afeta a executividade do título de crédito inadimplido". Aliás, ao contrário, "admite-se a convivência harmônica das duas jurisdições – arbitral e estatal –, desde que respeitadas as competências correspondentes, que ostentam natureza absoluta".
Sobre a matéria, também já se manifestou a 31ª câmara de Direito Privado do TJ/SP ao julgar o AI 0047019.51.2013.8.26.0000, em 2/4/13, e concluir que "a existência de cláusula compromissória é prevista para a finalidade de solucionar conflitos que ensejem atividade cognitiva, com expressa ressalva a respeito da possibilidade de utilização da via jurisdicional para a atividade executória".
Dessa forma, resta claro, portanto, que a empresa credora, portadora de um título executivo, poderá ingressar com sua demanda executiva diretamente perante a Justiça estadual, ainda que exista previsão expressa de cláusula arbitral no contrato celebrado entre as partes, tendo em vista tratar-se o Poder Judiciário e o juízo arbitral de competências distintas que se complementam na busca pela solução dos litígios.
____________
1Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
I – processar e julgar, originariamente:
i) a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias;
2Art. 580. A execução pode ser instaurada caso o devedor não satisfaça a obrigação certa, líquida e exigível, consubstanciada em título executivo.
____________
* Paula Camila O. de Oliveira Cocuzza é advogada do escritório Rayes & Fagundes Advogados Associados.