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Recuperação judicial da empresa : Novo paradigma

Para a maioria dos estudiosos do conhecimento humano, ciência é um conjunto orgânico e sistemático de teorias, métodos e fatos, produto de acumulações sucessivas e constantes de invenções e descobertas e da eliminação paulatina de erros, mitos e superstições.

20/10/2005


Recuperação judicial da empresa : Novo paradigma


Jorge Lobo*


Para a maioria dos estudiosos do conhecimento humano, ciência é um conjunto orgânico e sistemático de teorias, métodos e fatos, produto de acumulações sucessivas e constantes de invenções e descobertas e da eliminação paulatina de erros, mitos e superstições.


Essa arraigada crença foi contradita por THOMAS KUHN, que lhe opôs a doutrina segundo a qual o progresso da ciência não é fruto de acréscimos contínuos, mas de processos revolucionários, eis que a ciência avança por “revoluções científicas”, que ocorrem em momentos de crise, baseadas em “mudanças de paradigmas”.


Em seu excelente livro “A estrutura das revoluções científicas”, KUHN declara, ainda, que o paradigma nasce da intuição e da imaginação criativa de um cientista ou de um grupo seleto de cientistas como “resposta dirigida à crise”, quando “novas” teorias, incompatíveis com as até então existentes, surgem para resolver problemas que as “velhas” foram incapazes de solucionar.


Na Ciência do Direito, no campo do Direito Falimentar, o paradigma, vigente até a década de oitenta do século XX por toda Europa Continental e América Latina e Central, era favorecer o devedor, com dilação dos prazos de pagamento de suas dívidas vencidas e vincendas e a remissão parcial de seus débitos, através dos institutos da concordata preventiva e suspensiva da falência.


Nos EUA, desde 1978, e, a partir da década de noventa do século XX, na Alemanha, Espanha, Portugal, por exemplo, o paradigma é garantir os direitos e interesses dos credores, se insolvente o devedor, e, na França, desde 1985, o paradigma é proteger o devedor e os empregos dos trabalhadores.


Esses paradigmas, infelizmente, fracassaram, pois não conseguiram dar soluções satisfatórias para os problemas das empresas em estado de crise econômico-financeira, o que levou o legislador pátrio a empreender uma autêntica “revolução”, através de uma radical “mudança de paradigma”.


Com efeito, a LRFE brasileira, afastando-se dos sistemas jurídicos tradicionais, criou um “novo” paradigma, verdadeiramente inovador e instigante, mas, também, de complexa e intrincada aplicação, segundo o qual o instituto da recuperação judicial visa, a um só tempo, a assegurar a manutenção da atividade produtiva, a salvaguardar os empregos dos trabalhadores e a preservar os direitos dos credores!


Mas, pergunta-se, com certa perplexidade: como atender, plenamente, a essa multiplicidade de interesses, por vezes conflitantes?


A resposta, que vislumbro e desenvolvi no livro “Comentários à Lei de Recuperação e Falência da Empresa”, da editora Saraiva, coordenado por Paulo Toledo e Carlos Henrique Abrão, é: através de criteriosa “ponderação de fins e de princípios”, com fundamento na “teoria da ética da solidariedade”, no fato de que a ação de recuperação judicial é um “procedimento de sacrifício” e no interesse público e social, coletivo e geral imanente às empresas de grande porte, pondo de lado o debate hegeliano entre beneficiar o devedor ou beneficiar o credor.


Ponderar os fins da lei significa sopesar os vários interesses e direitos que ela visa proteger, que são, repita-se, salvar a empresa econômica e financeiramente viável, manter os empregos dos trabalhadores e assegurar o recebimento dos créditos de fornecedores e financiadores.


Ponderar os princípios da lei significa sopesar o princípio da conservação e da função social da empresa, o da dignidade da pessoa humana e valorização do trabalho e o da certeza, segurança e efetividade do direito.


Por isso, nas assembléias gerais de credores da VARIG, PARMALAT, etc., que se aproximam, seus controladores, administradores, empregados e credores devem empenhar-se na solução da crise consoante o “novo paradigma”, sob a direção do Poder Judiciário e a fiscalização do Ministério Público.

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*Advogado e Livre - Docente em Direito Comercial pela UERJ





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