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O parcelamento do aluguel sem a anuência do fiador o desonerade sua obrigação de principal devedor?

O parcelamento do aluguel sem a anuência do fiador o desonera de sua obrigação de principal devedor ? O advogado responde à questão.

14/2/2013

A fiança é uma das espécies de garantia dos contratos de locação disposta no artigo 37 da lei 8.245/19911. É uma garantia pessoal e assegura o cumprimento das obrigações do locatário para com o locador, o proprietário do imóvel2.

A espécie de garantia comentada está presente com certa frequência nos contratos de locação, especialmente quando se fala em negócio jurídico de locação de imóveis comerciais, sendo o fiador o devedor solidário. E este responde pela dívida no limite de seu patrimônio, mesmo tendo um único bem e sendo ele de família3, conforme artigo 3º, inciso VII da lei 8.009/19904.

Às vezes, por conveniência ou mesmo descuido do locador, o locatário que é o afiançado, estando inadimplente e sendo, portanto, devedor do locador, firma acordo com este no sentido de parcelar o débito sem alterar as partes do contrato e/ou a obrigação principal do negócio jurídico, tampouco dar ciência do fato ao garantidor do negócio (fiador).

O fiador, por óbvio, com o objetivo de afastar a sua obrigação de devedor solidário dos aluguéis, uma vez que não teve conhecimento do parcelamento do débito, normalmente questiona no Judiciário, frequentemente, a extinção da sua obrigação. Sustenta a aplicação da súmula 214 do Superior Tribunal de Justiça (STJ)5 e do artigo 838 do Código Civil Brasileiro (CC)6.

Os Tribunais de Justiça, especialmente o de São Paulo e do Rio Grande do Sul, têm se posicionado no sentido de que o mero parcelamento dos aluguéis não pagos não é motivo determinante para a exoneração do fiador, ou seja, os Tribunais entendem que, se o parcelamento não altera a obrigação originária, não trazendo mudança de conteúdo capaz de agravar a situação econômica do locatário ou a obrigação do fiador, não há que se falar em extinção da fiança:

[...] Locação. Acordo para parcelamento do aluguel. Hipótese que não exonera o fiador de sua obrigação, mesmo não tendo participado da avença. Decisão mantida Recurso improvido. (28ª Câmara Cível do TJ/SP. Apelação 9119213-66.2008.8.26.0000. Rel. Eduardo Sá Pinto Sandeville. Julgado em 7/2/2012) [...]

[...] APELAÇÃO CÍVEL. LOCAÇÃO. EXECUÇÃO. EMBARGOS DO DEVEDOR. FIANÇA. MORATÓRIA. [...] 1. O contrato de locação escrito é título executivo mesmo sem assinatura de testemunhas. 2. O simples parcelamento do débito, quando inclusive já havia sido desocupado o imóvel, não exonera o fiador. 3. Capitalização de juros afastada. (Apelação Cível 70029126349, 15ª Câmara Cível do TJ/RS, Relator: Paulo Roberto Felix, Julgado em 12/5/2010) [...]

No Superior Tribunal de Justiça (STJ), órgão responsável pela uniformização das decisões dos Tribunais Estaduais, há entendimentos antagônicos. Para exemplificar, recentemente, a 6ª Turma do STJ proferiu decisão no sentido de que mero parcelamento não é determinante para a extinção da fiança, assim como decidido pelos Tribunais locais, ao passo que a 3ª Turma proferiu decisão em sentido contrário:

[...] RECURSO ESPECIAL. LOCAÇÃO. FIANÇA. ACORDO. INEXISTÊNCIA DE NOVAÇÃO. [...] 1. O acordo entre o locador e o locatário exclusivamente sobre as condições de pagamento do débito, sem a anuência explícita do fiador, não enseja novação e decorrente exoneração de fiança locatícia, porquanto ausente a substituição da relação jurídica, com alteração do devedor, do credor, ou do objeto de prestação. (6ª Turma do STJ. Resp. 1.140662/RS.Julgamento em 16/3/2010) [...]

[...] CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. [...] FIANÇA. EXONERAÇÃO. NOVAÇÃO. - Os fiadores exoneram-se da garantia prestada no contrato de locação, bem como da solidariedade em relação ao locatário, se não houve anuência em relação ao pacto moratório, a teor do art. 838 do Código Civil (art. 1503, I, do Código Civil/1916), devendo ser aplicado o enunciado da Súmula nº 214 desta Corte. (3ª Turma do STJ.Resp. 1322215. Rel. Nancy Andrighi. Julgado em 13/11/2012) [...]

Mesmo diante da disparidade de decisões proferidas pelas diferentes Turmas do STJ, que, frise-se, dão margem à insegurança jurídica e impõem obrigação de recorrer à parte, parece-nos que a orientação mais razoável é a de que o parcelamento do débito e retardamento para o cumprimento da obrigação (pagamento dos aluguéis em aberto), sem alteração significativa da obrigação principal, não podem exonerar o fiador da obrigação assumida.

Não é nada razoável que o fiador continue a ser favorecido pelo Judiciário para afastar a sua obrigação de garantidor quando houver simples parcelamento da dívida sem alterar as disposições do contrato de locação. Nunca é tarde lembrar que a súmula 214 do STJ fala em novas obrigações não anuídas pelo fiador, o que não é o caso do parcelamento, uma vez que a obrigação permanece a mesma (pagamento dos aluguéis em aberto). E o artigo 838 do Código Civil dispõe acerca de moratória que, conforme leciona Sílvio de Salvo Venosa (in "Direito Civil, Vol. 3, p. 401"), não pode ser confundida com mera tolerância do credor.

Por essas razões, entendemos que as decisões dos Tribunais de São Paulo e do Rio Grande do Sul, além da 6ª Turma do STJ, são absolutamente coerentes e prestigiam a boa aplicação da Justiça e da própria legislação, sendo certo que o assunto merece um pronunciamento definitivo da Corte Especial do STJ.

"O presente trabalho não representa necessariamente a opinião do escritório, servindo apenas de base para debate entre os estudiosos da matéria. Todos os direitos reservados."

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1Art. 37. No contrato de locação, pode o locador exigir do locatário as seguintes modalidades de garantia:

I - caução;

II - fiança;

III - seguro de fiança locatícia.

IV - cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento. (Incluído pela Lei nº 11.196 , de 2005

2No Código Civil (CC), a fiança é disciplinada nos artigos 818 a 839.

3Supremo Tribunal Federal. Segunda Turma. RE 544651 AGR/RS. Relator Cezar Peluso [...] I - O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 407.688/SP, considerou ser legítima a penhora do bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, ao entendimento de que o art. 3º, VII, da lei 8.009/90 não viola o disposto no art. 6º da CF/88 (redação dada pela EC 26/2000). [...]

4Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:

VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

5Súmula 214. O fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu.

6Art. 838. O fiador, ainda que solidário, ficará desobrigado:

I - se, sem consentimento seu, o credor conceder moratória ao devedor;

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* Ezequiel Frandoloso é advogado do escritório Trigueiro Fontes Advogados

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