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Lei de lavagem - Avanço para o Brasil, mas sua aplicação ainda deve ser objeto de uma regulamentação, serena, equilibrada e respeitadora das instituições e do Estado Democrático de Direito

Apesar da lei ser um avanço para o país, sua aplicação ainda deve ser objeto de regulamentação serena, equilibrada e respeitadora das instituições e do Estado Democrático de Direito.

4/12/2012

A lei 9.613, de 3 de março de 1998, que dispõe sobre os crimes de "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos, recentemente, foi alterada pela lei 12.683/2012, que tornou mais rigorosa a fiscalização e ampliou as punições para os referidos crimes.

A aludida fiscalização merece destaque especial no que tange à inclusão das Juntas Comerciais e dos Registros Públicos em manterem seus cadastros atualizados, nos termos das instruções emanadas pelas autoridades competentes.

Segundo a alteração legislativa, os órgãos responsáveis pelo registro, seja mercantil ou civil, deverão informar ao Coaf qualquer operação ou transação em moeda nacional ou estrangeira que se relacione com títulos e valores mobiliários, títulos de crédito, metais, ou ativo passível de ser convertido em dinheiro, toda vez que ultrapassar o limite fixado pela lei.

Os registradores adotarão procedimentos e controles internos compatíveis com o volume de operações que lhes permitam atender todas as demandas para controle, criando bancos de dados em nível nacional, com informações sobre todos os movimentos das atividades negociais do país.

Será necessário, assim, um cadastro atualizado na forma e condições formuladas pelo Coaf, contendo as informações relativas às operações que, nos termos de instruções emanadas pelas autoridades competentes, possam constituir-se em sérios indícios de crimes, ou com eles relacionar-se.

Cumpre ainda dizer que para aqueles que deixarem de cumprir as obrigações previstas serão aplicadas, cumulativamente as sanções de advertência; multa pecuniária que poderá chegar ao valor de R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais).

Como se vê, o intuito do legislador foi permitir que os órgãos de controle e fiscalização tivessem acesso automático aos atos da vida empresarial e também civil das pessoas físicas e jurídicas, evitando que determinados meios, ainda que legais fossem inadequadamente utilizados para evasão fiscal, lavagem de dinheiro e crimes de corrupção.


As informações que o Poder Público terá acesso “online” impressionam pela grandeza, considerando que deverão ser catalogados todos os dados pelas juntas comerciais, pelos cartórios de registros civil de pessoas jurídicas e pelos tabeliães em que serão lavradas procurações, escrituras públicas de qualquer ato da vida civil praticados nos mais de 7 mil cartórios brasileiros – como nome da pessoa, tipo de ato e local em que o ato foi lavrado.

Diante dessa novidade, é interessante e oportuno também mencionar que os “contratos de gavetas” poderão facilmente ser detectados, observando que, doravante, será possível fazer uma pesquisa no sistema e saber se consta uma procuração em qualquer local do país em nome do indivíduo ou se há qualquer outro documento que o atrele àquela operação societária (cessão de quotas, cisão, incorporação, transformação de tipo societário ou venda de ações de companhia fechada).

Nesta toada, não há dúvidas quanto à necessidade, validade e importância de adoção de novas e vigorosas medidas que combatam a lavagem de dinheiro, ou ocultação de bens, contudo, algumas reflexões e críticas são necessárias quanto às escolhas do legislador quando da propositura da Lei em comento.

Não se está aqui, neste artigo, pelo menos por ora, se mencionando a questão da violação do sigilo profissional do advogado e a confiança que devem nortear as relações com o cliente, expediente, a meu ver, escancaradamente violado pela lei 12.683/2012, uma vez que não se pode permitir, em nenhuma hipótese, qualquer espécie de flexibilização do sagrado dever do sigilo profissional, porque representa um atentado contra as garantias constitucionais do cidadão.

O que se quer aqui é tratar do ponto de vista "técnico- jurídico" acerca do Registro Público de Empresas Mercantis – Juntas Comerciais -, assim vejamos: as Juntas deverão, com o escopo "fiscalizador", comunicar ao Coaf toda a transação e operação societária que possa ser indício de crime, ou com ele relacionar-se.

Ocorre que, na realidade, as Juntas não têm a atribuição legal de "fiscalização" e nem possuem condições técnicas para discernir se uma operação societária se trata ou não de um crime de lavagem de dinheiro. Grosso modo, dependendo da análise e da ótica, qualquer operação que tenha por finalidade uma cisão, fusão, incorporação, transformação de tipo societário, aumento de capital social com incorporação de bens imóveis ou simplesmente uma cessão e transferência de quotas, pela dubiedade da Lei pode ser interpretada como indício de crime de lavagem de dinheiro. Quer dizer: há, por certo, uma lacuna, uma subjetividade excessiva na interpretação legislativa; deixando a cargo de Assessores Técnicos e Vogais (serventuários e membros representantes da sociedade civil nas Juntas Comerciais), sem o devido treinamento ou amparo legal para tanto, a avaliação sobre a possibilidade de tratar-se ou não de crime de lavagem de dinheiro.

O problema é muito sério, como se vê, tendo em vista que qualquer ato societário, a partir de agora, poderá ter sua operacionalidade enquadrada numa daquelas previstas na Lei como forma de ocultação de bens! Na verdade, falta uma melhor orientação às Juntas Comerciais, pois, para solucionar o problema, bastaria que o Departamento Nacional do Registro do Comércio baixasse uma Instrução Normativa regulamentando e elencando as hipóteses de lavagem ou ocultação de bens, cujos atos societários dependem de arquivamento perante as Juntas Comerciais, sem que isso implique em injustiças ou abusos para as sociedades e seus sócios.

Enfim, para concluir, nada obstante o todo exposto, a Lei de Lavagem de dinheiro é um importante avanço para o Brasil, mas sua aplicação ainda deve ser objeto de uma regulamentação, serena, equilibrada e, principalmente, respeitadora das instituições e do Estado Democrático de Direito.

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* Armando Luiz Rovai é doutor pela PUC-SP, professor de direito comercial do Mackenzie e da PUC-SP. Foi Presidente da Junta Comercial do Estado de São Paulo por três mandatos e do Ipem/SP. Presidente da Comissão de Direito de Empresa da OAB/SP. Conselheiro da OAB/SP






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