Migalhas de Peso

Alteração nas regras de obtenção do RADAR

O Governo mostrou-se insensível à situação de importadores que basearam seus negócios no modelo de importação por encomenda.

1/11/2012

No dia 3 de setembro, entrou em vigor a Instrução Normativa nº 1.288/2012, da Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), que altera substancialmente os procedimentos de habilitação de (a) importadores, (b) exportadores e (c) internadores da Zona Franca de Manaus para operação no Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex) – habilitação conhecida pela sigla RADAR.

No lugar das antigas habilitações simplificada, ordinária, especial e restrita, a nova regulamentação classificou as habilitações nas seguintes modalidades e submodalidades:

1) modalidade pessoa jurídica: (a) expressa, (b) ilimitada, e (c) limitada; e

2) modalidade pessoa física.

Em síntese, as hipóteses previstas nas antigas modalidades simplificada e especial estão atualmente previstas na modalidade “pessoa física” e nas submodalidades “expressa” e “limitada” da modalidade “pessoa jurídica”. A antiga habilitação “ordinária” foi substituída pela submodalidade “ilimitada”, e a hipótese anteriormente prevista na habilitação “restrita” está atualmente dispensada de habilitação.

Dessa forma, as novas modalidades e submodalidades de habilitação no RADAR incluem as seguintes entidades e transações:

“I - pessoa jurídica, nas seguintes submodalidades:

a) expressa, no caso de:

1. pessoa jurídica constituída sob a forma de sociedade anônima de capital aberto, com ações negociadas em bolsa de valores ou no mercado de balcão, bem como suas subsidiárias integrais;

2. pessoa jurídica autorizada a utilizar o Despacho Aduaneiro Expresso (Linha Azul), nos termos da Instrução Normativa SRF nº 476, de 13 de dezembro 2004;

3. empresa pública ou sociedade de economia mista;

4. órgãos da administração pública direta, autarquia e fundação pública, órgão público autônomo, organismo internacional e outras instituições extraterritoriais;

5. pessoa jurídica habilitada para fruir dos benefícios fiscais previstos na Lei nº 12.350, de 20 de dezembro de 2010; e

6. pessoa jurídica que pretende atuar exclusivamente em operações de exportação;

b) ilimitada, no caso de pessoa jurídica cuja estimativa da capacidade financeira a que se refere o art. 4º e seus parágrafos seja superior a US$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil dólares dos Estados Unidos da América); ou

c) limitada, no caso de pessoa jurídica cuja estimativa da capacidade financeira a que se refere o art. 4º e seus parágrafos seja igual ou inferior a US$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil dólares dos Estados Unidos da América); ou

II - pessoa física, no caso de habilitação do próprio interessado, inclusive quando qualificado como produtor rural, artesão, artista ou assemelhado.”

É ainda importante destacar que a Instrução Normativa RFB nº 1.288/2012 não apenas reenquadra e reclassifica as hipóteses de habilitação no RADAR previstas na revogada Instrução Normativa RFB nº 650/2006, mas faz duas alterações relevantes que podem gerar impactos para inúmeros importadores e exportadores, conforme adiante comentado.

Fim da submodalidade conhecida como “RADAR de encomendante”

O artigo 2º, II, “b”, item 4, da revogada Instrução Normativa RFB nº 650/2006, admitia a obtenção de RADAR na modalidade simplificada para importadores que atuassem na condição de encomendante nas importações por encomenda. Tal habilitação era usualmente conhecida como “RADAR de encomendante”.1

Desde então, a utilização do RADAR de encomendante sempre foi uma alternativa para empresas que tinham a pretensão de importar mercadorias em valor superior a USD 150.000,00 por semestre, mas que não tinham interesse em obter o RADAR na modalidade ordinária – ou que apenas estavam aguardando os trâmites burocráticos na RFB para a obtenção da habilitação.

Nesse particular, é importante destacar que os trâmites para a obtenção do RADAR na modalidade ordinária sempre foram complexos, lentos e caros. A depender do nível de detalhamento exigido pelo fiscal responsável pela análise do pleito (análise, frise-se, muitas vezes subjetiva), alguns casos chegavam a demorar 6 meses. Por essa razão, era comum que empresários, principalmente aqueles que estavam ainda testando e conhecendo o mercado brasileiro, não obtivessem o RADAR ordinário e importassem mercadorias em montante superior a USD 150.000,00 utilizando-se do “RADAR de encomendante”.

Ocorre que, para a surpresa de inúmeros importadores que estruturaram seus negócios com base nessa alternativa, a RFB revogou a previsão regulamentar para o “RADAR de encomendante”. A partir da entrada em vigor da Instrução Normativa RFB nº 1.288/2012, não há mais a possibilidade de importar mercadorias em valor superior a USD 150.000,00 por semestre que não seja com a habilitação na submodalidade ilimitada (antiga ordinária).2

Durante o exíguo prazo de 30 dias previsto para a entrada em vigor da Instrução Normativa RFB nº 1.288/2012, algumas associações e sindicatos tentaram postergar a revogação do “RADAR de encomendante” – ou mesmo criar uma norma que concedesse uma habilitação ilimitada precária desde o protocolo do pedido –, a fim de evitar que a demora por parte da RFB atrasasse as importações em andamento.

Até o momento, porém, o único ato normativo publicado para regulamentar a referida Instrução Normativa foi o Ato Declaratório Executivo Coana nº 33/2012, que não faz qualquer referência a esse respeito.

Diante desse cenário, caso não seja publicada qualquer disposição transitória, a grande esperança dos importadores que serão afetados com essa medida reside no afrouxamento dos requisitos e condições impostos pela RFB no exame dos pedidos de habilitação na submodalidade ilimitada. Caso tal habilitação possa ser conseguida em prazos3 e sob condições mais suaves que os da antiga habilitação ordinária, os prejuízos podem ser minimizados; contudo, caso as dificuldades sejam as mesmas, corre-se o risco de paralisação das atividades de inúmeras pessoas jurídicas importadoras.

Por fim, é importante destacar, para que não haja dúvidas, que a Instrução Normativa RFB nº 1.288/2012 não revogou a importação por encomenda, mas apenas a possibilidade de o encomendante utilizar os limites da importadora por encomenda (trading company). Assim, caso o encomendante tenha limite disponível em sua habilitação no RADAR, poderá importar diretamente ou indiretamente, tanto na modalidade conta e ordem quanto encomenda.

Facilitação da habilitação na exportação

Sob a égide da Instrução Normativa RFB nº 650/2006, os exportadores também estavam sujeitos a um limite de valor em mecanismo semelhante ao dos importadores. Caso exportassem até USD 300.000,00 por semestre, poderiam optar pela modalidade simplificada; contudo, teriam de obter o RADAR ordinário caso exportassem mercadorias em valor superior a USD 300.000,00.

Como mencionamos acima, o procedimento de obtenção do RADAR na modalidade ordinária sempre foi muito lento e burocrático, de modo que se colocava como um entrave às empresas exportadoras (do mesmo modo que para as importadoras).

Objetivando corrigir tal problema, a Instrução Normativa RFB nº 1.288/2012 a nosso ver acerta ao revogar qualquer limitação quantitativa para as exportações. A nova regulamentação do RADAR classifica as pessoas jurídicas exportadoras, qualquer que seja o valor de suas exportações, na submodalidade expressa, que congrega as demais hipóteses anteriormente previstas na modalidade simplificada. Por essa razão, cremos que o processo de obtenção do RADAR para exportadores junto à RFB será mais simples.

Como se vê, portanto, os exportadores, em tese, terão caminho mais fácil a partir de agora para se habilitar para a prática de atos no Siscomex, o que é uma importante medida de desburocratização adotada pelas autoridades aduaneiras brasileiras.

Conclusão

Dentre outras alterações, a Instrução Normativa RFB nº 1.288/2012 muda substancialmente a habilitação no RADAR para exportadores e importadores que realizavam importações por encomenda. Se por um lado houve uma salutar desburocratização dos procedimentos administrativos relacionados à exportação de mercadorias, o Governo brasileiro mostra-se insensível à situação de inúmeros importadores que basearam seus negócios no modelo de importação por encomenda.

O fim abrupto do chamado “RADAR de encomendante”, a nosso ver, além de possuir características protecionistas de acerto duvidoso, revela-se uma medida de profundo desrespeito à segurança jurídica dos importadores, o que certamente cria um desincentivo a investimentos estrangeiros no país.

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1 Esse nome não consta em nenhum ato oficial conhecido da RFB, mas é usualmente adotado por trading companies e demais operadores de comércio exterior.

2 Exceto para as hipóteses que admitem a habilitação expressa e que anteriormente estavam previstas na modalidade simplificada.

3 Vale destacar que o prazo de obtenção da habilitação ilimitada é de 10 dias, o que representa uma redução significativa em comparação com o prazo de 30 dias para a habilitação ordinária previsto na antiga Instrução Normativa RFB nº 650/2006. Contudo, mesmo sob a égide da Instrução Normativa anterior, a fiscalização não raramente excedia em muito o prazo estabelecido na legislação. Resta, portanto, a esperança de que o novo prazo de 10 dias seja realmente cumprido

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* Renata A. Pisaneschi e Carlos Eduardo de A. Navarro são, respectivamente, integrantes das áreas de Contratos e de Importação e Exportação do escritório Machado Associados Advogados e Consultores

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