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O equilíbrio de forças no direito internacional do meio ambiente

Quando os chamados países em desenvolvimento incorporaram a questão ambiental em suas pautas políticas internacionais, mediante a reivindicação de mecanismos de desigualdade compensadora, sistema de preferências e não reciprocidade, houve um incremento do Direito Internacional do Meio Ambiente.

29/9/2005


O equilíbrio de forças no direito internacional do meio ambiente


Ana Carolina F. de Melo Brito*


Quando os chamados países em desenvolvimento incorporaram a questão ambiental em suas pautas políticas internacionais, mediante a reivindicação de mecanismos de desigualdade compensadora, sistema de preferências e não reciprocidade, houve um incremento do Direito Internacional do Meio Ambiente.


O impulso que a Conferência Rio-92 deu à proteção ambiental é um marco importante para a matéria, sobretudo porque ocasionou a valorização do fator ambiental no âmbito das Nações Unidas, que é o principal fórum de criação desse ramo do Direito Internacional. Impulso semelhante se deu com a convenção-quadro sobre mudanças no clima, origem do já conhecido Protocolo de Quioto, que isentou os países em desenvolvimento do cumprimento de metas de redução de emissão e lhes permitiu a criação de Mecanismos de Desenvolvimento Limpo (MDL) - que podem agregar valor à agenda ambiental, bem como valores às economias nacionais.


Contudo, vale lembrar que, apesar do seu desenvolvimento, o Direito Internacional do Meio Ambiente é heterogêneo e não encerra em si um quadro de normas cogentes facilmente delineado. Ao contrário, pode-se afirmar que predominam as soft norms, que vêm ganhando força em razão dos mecanismos de controle estabelecidos pela comunidade internacional, bem como pela população civil, que cada vez mais organizada e por meio de Organizações Não Governamentais (ONG’s), exige e fiscaliza o cumprimento das intenções declaradas em documentos internacionais.

Voltando à questão jurídica propriamente dita, deve-se registrar que há algumas obrigações reconhecidas pela comunidade internacional, como a proibição à poluição transfronteiriça. Esta deve ser entendida como imposição aos Estados de não permitir atividades, ainda que dentro de suas fronteiras, que possam denegrir o patrimônio ambiental de outro Estado. Afinal, a expansão dos efeitos da poluição para além das fronteiras de cada país atinge direitos básicos de dignidade, sobrevivência e comércio de outras comunidades.


A obrigação acima mencionada vem sendo implementada mediante a celebração de acordos multilaterais e construção de novos conceitos no cenário internacional como um todo.Nas Nações Unidas, desenvolveu-se jurídica e politicamente o conceito do direito de ingerência, que pode ser visto como uma exceção à regra geral da soberania e não-intervenção.Tal exceção só deve ser permitida mediante relevantes razões, como a promoção da paz, legítima defesa, assistência humanitária e a luta contra o terrorismo.


Não obstante a temática em tela seja relevante, ainda não houve nenhuma intervenção fundamentada exclusivamente na preservação ambiental. Todavia, pode-se afirmar que está sendo ampliado o rol de temas que autorizariam o direito de ingerência.


Assim, de um lado, cada vez mais, a comunidade internacional aceita, valoriza e normatiza a preservação do meio ambiente, com a participação dos países em desenvolvimento. De outro, são ampliadas as possibilidades de intervenção pelos países econômica e militarmente mais fortes. Por isso, é plausível imaginar que talvez um dia a proteção de um bem ambiental específico, considerado relevante para a comunidade internacional, como a Floresta Amazônica, por exemplo, possa servir de fundamento à intervenção internacional em um determinado Estado.


Isso poderia nos levar à conclusão de que os países em desenvolvimento devem promover medidas de proteção de seu patrimônio ambiental, não só por tal conduta ser mundialmente desejada e legitimada, mas também em razão da possibilidade, aparentemente ainda remota, de ingerência econômica, política e talvez até militar. É de se reconhecer que países já desenvolvidos podem ser causadores de danos ambientais ainda maiores. Mas uma intervenção nesse sentido, convenhamos, seria politicamente mais difícil.


É de se ressaltar, contudo que os deveres de cooperação e de abstenção do uso da força para a resolução de controvérsias em questões sobre o meio ambiente também são obrigações internacionalmente reconhecidas e devem ser valorizadas. Assim, a possibilidade extrema de intervenção fundada em questão ambiental pode ser considerada apenas como mais um vetor de força que atuará no cenário internacional, quem sabe até em favor do desenvolvimento sustentável. Isso porque, em uma situação ideal, o confronto de tais forças poderá impulsionar a reafirmação dos princípios clássicos de soberania e cooperação, aliados a medidas positivas de proteção por parte dos países em desenvolvimento. Que assim seja.
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*Advogada do escritório Trigueiro Fontes Advogados









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