Entre nós, a questão sempre foi a regulação dos serviços públicos concedidos: a definição da sua política, a lisura na outorga a empresas, a fiscalização dos serviços, a indicação dos reguladores. Na década de 30, uma tentativa de se criarem agências independentes foi fulminada pela ditadura Vargas, e a prestação privada de serviços de infraestrutura acabou inteiramente estatizada na ditadura militar, o que levou ao seu esboroamento, em meio à malversação de recursos e à inépcia administrativa.
A reprivatização dos anos 90 buscou afirmar um modelo de regulação técnica e independente, logo acoimado de "terceirização do Estado". O resultado dessa crítica equívoca está agora à vista dos usuários desses serviços. E o governo federal quer reagir a essa situação, outorgando concessões. Nesse sentido, uma boa sugestão é a leitura da Constituição. Ela estabelece o regime de livre iniciativa para atrair investimentos privados à prestação dos serviços públicos, mas os submete à regulação do Estado para neles impedir o abuso do poder econômico. Ou seja, há um modelo de negócio estabelecido; bem aplicado, provê segurança jurídica aos usuários, aos empresários e ao governo. E há recursos, tecnologia e demanda a reclamar as concessões.
Porém, a certos setores do governo, executar a Constituição equivale a uma rendição ideológica inaceitável.
Daí decorrem a atual paralisia do governo e a perplexidade da sociedade, carente de serviços. O desafio está posto à presidente da República. Ela pode vencê-lo, se mostrar a setores de seu governo, como vem de fazer com a lei de Direito de Acesso à Informação, que cumprir a lei é essencial para a democracia - e traz prestígio político.
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* Pedro Dutra é advogado do escritório Pedro Dutra Advogados
Matéria originalmente publicada no jornal O Globo do dia 9/8/2012
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