Certo causídico famoso chegou ao cúmulo de atribuir a um dos ministros do Supremo a ideia de que o reflexo da opinião pública no direito é próprio do nazismo e do fascismo. E assim se vai enganando o espectador à espera de uma palavra justa e orientadora acerca das magnas questões discutidas neste julgamento que vem monopolizando todas as atenções.
O que alguns advogados omitem, por má-fé ou ignorância, é que todo poder, todo mando político jamais descansa sobre a força bruta, e sim sobre a opinião pública. Talleyrand, ministro de Napoleão, aconselhando prudência ao imperador dos franceses, salientava: “Com as baionetas, sire, pode-se fazer tudo, menos sentar sobre elas". Antes de ser teoria proclamada na Revolução Francesa, ou por Santo Tomás de Aquino, no século XIII, a soberania da opinião pública foi sempre uma realidade de fato, constitutiva do mando político sob qualquer forma.
A opinião pública, queridos causídicos, não é o rumor do que se pensa e do que se fala. A queixa do doente não aponta para sua enfermidade. Quem sofre do coração pode queixar-se de todo seu corpo, menos do coração. A opinião pública não consiste em simples rumor passageiro. A opinião pública consiste no consenso social sobre quem deve mandar: O Rei, com seu poder absoluto? O Rei com base na Constituição? O povo, mediante o voto, e representado no parlamento? Ou, por acaso, o líder carismático?
Em outras palavras, o poder público consiste na emanação direta da opinião pública. Nas palavras enérgicas de um pensador famoso, “o poder público não é, senão, a emanação ativa, energética, da opinião pública”. É o que diz nossa Constituição: “Todo poder emana do povo e em seu nome será exercido”. Não é possível mandar de verdade contra a opinião pública. Napoleão conquistou com seu exército poderoso a Espanha. Mas não mandou nem um só dia sobre aquele país. Outros exemplos se multiplicam nos dias de hoje, como o Afeganistão ou o Iraque, e outros tantos. A opinião pública, quando é realmente “pública”, e não de grupos isolados, é o cerne e a substância do poder legítimo.
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* Gilberto de Mello Kujawski é procurador de Justiça aposentado, escritor e jornalista
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