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Software vs. contribuintes: a batalha das sociedades profissionais pela alíquota fixa do ISSQN

Em crítica mordaz, o autor sublinha: é como se um novo princípio jurídico pairasse sobre a Constituição, subjugando-a, o Princípio da Supremacia do Software.

6/10/2011

Renato Lúcio de Toledo Lima

Software vs. contribuintes: a batalha das sociedades profissionais pela alíquota fixa do ISSQN

Antigamente, para que o debatedor desistisse de argumentar, evocava-se uma expressão de cunho religioso que, embora com algumas variações, mantinha sempre o mesmo sentido: Deus quis assim. Com isso, o interlocutor conformava-se e baixava armas. Dava-se por vencido, ante o intransponível oponente.

O artifício para vencer contendas de argumentos ainda existe, mas sob outra evocação, quiçá mais poderosa se considerados os valores morais vigentes, cristalizada na expressão "o sistema não aceita". Tal negativa apanha o postulante em sua mais profunda fragilidade. Não causa indignação; desola. Isso significa que seu pedido não será atendido simplesmente porque o programador responsável pelo software não previu essa circunstância ao criá-lo.

Religião, conquanto não deva, pode ser discutida. Não há, porém, argumentação contra o sistema. Ele é o limite.

Muitas prefeituras, acompanhando as inovações tecnológicas e aproveitando as vantagens de adotar meios de controle de arrecadação mais céleres e eficazes, implantaram em suas secretarias de finanças softwares desenvolvidos especialmente para atender seus anseios. O contribuinte insere online as declarações que prestaria ao Fisco a título de obrigação acessória e, a partir delas, gera a guia de recolhimento do tributo, já calculada pelo sistema a partir das informações fornecidas pelo próprio contribuinte. Louvável!

O que não se pode consentir é que o sistema de informática suprima direitos dos contribuintes. É fato que muitos municípios – e não se descarta a hipótese de que o fizeram de propósito – não incluíram nos softwares a previsão do cálculo e geração de guia de recolhimento do imposto sobre serviço na modalidade de alíquota fixa, para sociedades profissionais.

As empresas constituídas exclusivamente por profissionais de mesma formação, com a atividade regrada por lei (profissão regulamentada) e prestadoras de serviços exclusivamente em suas respectivas áreas – são, como reconhecido de forma unânime e pacificada pelo STJ, tributadas na modalidade de alíquota fixa de ISS, ou seja, devem recolher uma quantia estabelecida de antemão segundo o número de profissionais que congrega. São exemplos: médicos, contadores, advogados, engenheiros, dentistas, psicólogos, entre outros.

O software menospreza a modalidade fixa mediante a aplicação de uma alíquota, que varia de 2 a 5%, sobre preço de serviço ou valor da nota fiscal.

O direito da sociedade prestadora de serviço, na qualidade de contribuinte, é recolher o valor fixo anualmente, comumente muito menor. Acontece que o sistema, como única via de emissão da guia de recolhimento do imposto, tem interditado o direito dessas pessoas jurídicas, nas quais a contraprestação paga pelo tomador configura verdadeiro rendimento do trabalho pessoal, com responsabilidade direta em relação ao serviço por eles executados, decorrente da própria lei que regulamenta a profissão.

O sistema não aceita.

É como se um novo princípio jurídico pairasse sobre a Constituição, subjugando-a, o Princípio da Supremacia do Software. De que adianta o legislador ou mesmo o constituinte editar a regra se o programador não a levou em conta ao desenvolver o programa?

Diante disso resta ao contribuinte conformar-se e pagar mais ISS do que deve, ou, mediante análise prévia de viabilidade e consideradas as particularidades de cada sociedade prestadora de serviço, litigar contra o Município. Nenhuma das opções, obviamente, é agradável, mas, ao menos por enquanto, os softwares do Poder Judiciário aceitam a propositura dessas ações. Não se sabe até quando.

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*Renato Lúcio de Toledo Lima é sócio do escritório Fernando Corrêa da Silva Sociedade de Advogados

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