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A obrigatoriedade de utilização do denominado Contrato Núcleo para a constituição de sociedades limitadas

O advogado questiona se tal obrigatoriedade, imposta pela Junta Comercial do Estado de Minas Gerais, não fere disposições legais e princípios já resguardados pelo ordenamento jurídico.

22/9/2011

Igor Alves Dias de Souza

A obrigatoriedade de utilização do denominado Contrato Núcleo para a constituição de sociedades limitadas

Com base na lei 7.292/84 (clique aqui), na Instrução Normativa 37/91 (clique aqui) do Departamento Nacional do Registro do Comércio – DNRC, no art. 3º da lei 11.598/07 (clique aqui) e na Resolução 16/2010 (clique aqui), a Junta Comercial de Minas Gerais – JUCEMG tem obrigado o empresariado à utilização de um contrato pré-determinado, denominado Contrato Núcleo, para a constituição de sociedades empresárias de responsabilidade limitada.

Contudo, há de se questionar se tal exigência é realmente cabível ou se contraria dispositivos legais e princípios presentes no ordenamento jurídico, ou mesmo se tal medida cumpre sua real finalidade (facilitação na regularização das sociedades empresárias), haja vista que após a constituição o contrato social pode ser alterado conforme a real vontade dos sócios.

O art. 1º da lei 7.292/84 autorizou o DNRC a estabelecer modelos e cláusulas padronizadas para o fim de constituição de sociedade, podendo as partes contratantes livremente adotá-los.

Com base nesta legislação, foi aprovado, sete anos mais tarde, através da IN 37/91, o modelo para constituição de empresas de sociedade limitada, sendo este comercializado em bancas de jornal e papelarias até pouco tempo atrás.

Ainda no intuito de facilitar a regularização da atividade empresária existente no Brasil, o poder público Federal, através da lei 11.598/07 criou a Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios – REDESIM que passou a prever a unificação de procedimentos para a constituição e alteração das sociedades empresárias.

Com base nas legislações supracitadas a Junta Comercial do Estado de Minas Gerais - JUCEMG, em convênio com os demais órgãos públicos criou o sistema de Cadastro Nacional, para fazer cumprir a facilidade almejada pelo sistema REDESIM.

Dentre várias inovações trazidas por este sistema, que, sem quaisquer dúvidas trouxeram simplificações aos procedimentos de constituição da sociedade empresária limitada para os municípios mineiros conveniados, a JUCEMG, desde a data de 3 de janeiro do ano corrente, passou a obrigar a utilização de um contrato modelo, denominado Contrato Núcleo.

Trata-se de um documento padrão, no qual, através do denominado Módulo Integrador, são inseridos apenas os dados dos sócios e da sociedade a ser constituída que foram previamente informados quando da utilização do sistema de Cadastro Sincronizado.

Contudo, sem embargo das facilidades trazidas para este órgão de registro e do intuito de facilitar a constituição de sociedades empresárias limitadas, é necessário verificarmos se a exigência de utilização de um contrato padrão não contraria normas e princípios já presentes no ordenamento jurídico.

Reza a melhor doutrina, a interpretação dos princípios jurídicos, do texto constitucional e do código civil, que o ajuste de vontade entre as pessoas e a liberdade de contratar são elementos essenciais para a formalização deste acordo de vontades na constituição de uma sociedade.

A contratação de obrigações recíprocas deve ser livre para a disposição dos contratantes, sob pena de, eivado de vício de vontade, ser nula de pleno direito.

Apesar de a legislação determinar que a constituição de uma sociedade é negócio jurídico solene e que seus atos constitutivos devem observar a forma prescrita em lei e conter as cláusulas obrigatórias que atendam aos dispositivos legais (arts. 46 e 997 do CC/02 – clique aqui), deve-se garantir que tal acordo de vontades, reduzido a termo através do Contrato Social, esteja livre de quaisquer vícios de consentimento.

Ademais, não se pode extrair da legislação pertinente nenhuma revogação tácita ou expressa para o disposto no art. 1º da lei 7.292, sendo, portanto, as partes, livres para adotar os modelos estabelecidos pelo DNRC.

Cumpre ainda ressaltar que os atos constitutivos de uma sociedade devem ser visados por advogado (Art. 1º, § 2º, lei 8.906/94 – Estatuto da OAB – clique aqui) e, sendo este profissional livre para o exercício de seu labor, não pode ser compelido a assinar qualquer documento que não tenha criado, sob pena se incorrer em vício de consentimento.

Sendo assim, devemos verificar se a obrigação imposta pela Junta Comercial do Estado de Minas Gerais – JUCEMG, de utilização de um contrato modelo, denominado Contrato Núcleo, não fere disposições legais e princípios já resguardados pelo ordenamento jurídico como assim dito.

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*Igor Alves Dias de Souza é advogado do escritório Albino Advogados Associados, integrante das áreas de Direito Societário e Imobiliário

 

 

 

 

 

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