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A regulamentação da locação modelo Built to Suit

O advogado analisa quais as consequências da rescisão antecipada dos contratos de "built to suit" para o locador e para o locatário.

8/9/2011

Marcelo José Lomba Valença

A regulamentação da locação modelo Built to Suit

A locação no modelo built to suit é uma variante de investimento imobiliário em que a oferta antecede a procura. O consumidor do espaço imobiliário, o locatário, encomenda ao investidor imobiliário, o locador, uma unidade de negócio no local e de acordo com o projeto que ele, consumidor de espaço imobiliário, elaborou.

De acordo com a lei de locações, ou lei 8.245/91 (clique aqui), fica garantido ao locatário o imóvel pelo prazo do contrato de locação, sem que o locador possa reavê-lo, desde que sejam cumpridas as regras durante o prazo estabelecido. Em caso de alienação ou oneração voluntária do imóvel, prevalece a locação contra terceiros, desde que o contrato de locação esteja registrado na matrícula do imóvel.

É importante explicar o que distingue uma locação ordinária de uma locação na modalidade built to suit. A locação ordinária é aquela em que o proprietário cede a posse do bem para um terceiro, sem a intenção de transferência da propriedade para que este terceiro use a posse para o fim estabelecido na cessão e, em contrapartida, o terceiro paga uma remuneração ao proprietário do bem locado pelo uso do imóvel. Podemos apelidar esta locação de "usou pagou".

Para entendermos a modalidade built to suit de locação, vamos considerar uma empresa proprietária de velha fábrica industrial, que precise de um galpão sob medida para qualificar-se em uma licitação pública e melhorar seus índices de liquidez. A empresa deverá selecionar empreendedores imobiliários que possam comprar o terreno do galpão e construí-lo de acordo com as especificações da empresa. Em contrapartida, a empresa concorda em pagar um aluguel não exclusivamente pelo uso do imóvel, mas também como retorno do empreendedor imobiliário pelo investimento necessário na compra do terreno e na construção do galpão, aluguel este baseado em um racional com base no investimento.

O retorno do investimento que o empreendedor imobiliário fizer para atender as necessidades da indústria somente será realizado com o integral pagamento, pela empresa, dos aluguéis durante o termo contratual ajustado. Esse princípio está expresso no Código Civil Brasileiro, em seu artigo 473, que determina a rescisão do contrato somente após o usuário pagar ao investidor as contraprestações emergentes do contrato pelo prazo necessário ao retorno do investimento do investidor.

Do ponto de vista legal, a diferença primordial entre a locação "usou pagou" e a locação na modalidade built to suit é que no caso de rescisão antecipada pelo locatário, a locação "usou pagou" está sujeita ao disposto no artigo 4º da lei de locações e a locação built to suit está sujeita ao artigo 473. O artigo 4º da lei de locações determina que o locatário pode rescindir o contrato mediante pagamento da multa proporcional ao período de cumprimento do contrato pelo locatário. O artigo 473 determina que o locatário não pode rescindir o contrato até que ele pague o número de aluguéis determinados que sejam equivalentes ao investimento do locador.

No entanto, existem certos problemas. O Código Civil, em seu artigo 2036, determina que a locação de prédio urbano continua a ser regida pela lei de locações e, de acordo com o PL 356/11 (clique aqui) em trâmite no Congresso Nacional, "em caso de denúncia antecipada do vínculo locativo pelo locatário (nas locações na modalidade built to suit), compromete-se este a cumprir a multa que restar pactuada, que não poderá exceder à somatória dos aluguéis a receber até o termo final para a locação".

Seguindo essa linha, tomemos como exemplo um aluguel de um contrato na modalidade built to suit com prazo de 10 anos, de R$ 1 milhão por mês. Isso significa que o locatário deveria pagar ao locador uma multa de R$ 60 milhões em uma única parcela, ao rescindir o contrato na metade do prazo. Lembrando que indenização e multa são conceitos distintos. A cobrança de uma indenização de R$ 60 milhões é sustentável. Já a cobrança de uma multa de R$ 60 milhões, à vista, com o recebimento do imóvel no ato do pagamento da multa poderá ser considerada excessiva pelos tribunais, principalmente na hipótese do locador alugar o imóvel para um terceiro por período que coincida com o prazo remanescente de 5 anos da locação originalmente rescindida.

Por fim, além do grave problema referente à cumulação da devolução do principal e dos rendimentos pelo prazo integral do contrato, sem o desconto dos rendimentos proporcionais ao termo da devolução antecipada ou no fluxo original combinado, o PL 356/11 determina que para efeitos de cessão dos valores relativos aos aluguéis a receber, o respectivo contrato precisa ser registrado no Serviço de Registro de Títulos e Documentos. Para efeitos de vigência da locação em caso de venda do imóvel a terceiros, o contrato de locação deve ser registrado na matrícula do imóvel. Não seria o caso de um único registro suprir os dois efeitos?

Além disso, no Centro-Oeste do Brasil e ao longo das rotas de escoamento de safra existe uma forte tendência favorável ao mercado de locações na modalidade built to suit para instalação de centros de estocagem de grãos e transbordo de cargas agrícolas. Se limitarmos o built to suit aos imóveis urbanos, estaremos alijando deste mercado o agribusiness.

As tentativas de criar situações de exceção na lei para viabilizar a instituição de novos conceitos geralmente resultam em ações de inconstitucionalidade, que demoram vários anos para serem julgadas de forma que não caiba mais recurso e, durante este tempo, paira sobre o novo conceito dúvida sobre sua legalidade.

Para evitar que o devedor de uma multa de rescisão antecipada de locação na modalidade built to suit venha a contestar a cobrança integral dos aluguéis vincendos cumulada com a devolução antecipada do imóvel, o ideal seria apenas reconhecer a aplicabilidade do artigo 473 à rescisão antecipada do contrato pelo locatário e revogar o artigo 2036, ambos do Código Civil.

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*Marcelo José Lomba Valença é sócio do escritório Almeida Bugelli e Valença Advogados Associados

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