Um povo entrelaçado de verde e amarelo
Diego Bomfim*
O surgimento e o desenvolvimento destes instrumentos de comunicação em massa permitiram a amplificação de atitudes que, antes, ficavam trancafiadas em sua própria torpeza. Manifestações vindas de alguém sem qualquer representatividade política ou social não ganhavam qualquer projeção e, por isso, não geravam debate e diálogo.
Os tempos são outros. Qualquer cidadão, muitos mais hoje do que outrora, dispõe de instrumentos mais eficazes de manifestação de seus pensamentos e posições, fortalecendo-se a democracia. Se por um lado isto gera efeitos positivos na sociedade, divulgando conhecimento e fomentando o debate de ideias, essa nova realidade, por outro, traz consigo um evidente efeito colateral: a difusão em grande escala de pensamentos tacanhos.
O fluminense Aníbal Machado, que me foi apresentado em um livro do gaúcho Alfredo Augusto Becker, oferece uma lição que considero absolutamente pertinente neste momento. Segundo ele, "há burrices que, de tão humildes, chegam a ser pureza e têm algo de franciscano. Outras há, porém, tão vigorosas e entusiásticas, que conseguem imobilizar por completo o espírito para contemplação do espetáculo". Ler sobre o preconceito de alguns contra nordestinos em pleno século XXI me faz crer que estou diante de uma dessas burrices ululantes que, se no início, geram um impacto de descrédito, depois, impõem uma resposta.
O Brasil é um país multifacetado, formado por diferentes raças e, por isso, tão especial e diferenciado no mundo. Aqui, com ainda mais veemência, não há que se falar em conceitos predeterminados para fins de discriminação. Quase todos que acusam e ofendem tem, invariavelmente, entranhados em seu sangue a mesma ascendência de todos os outros brasileiros. Somos o mesmo povo dentro de um caldeirão incindível de cultura, sotaques, cores e costumes. Tudo isso junto e entrelaçado de verde e amarelo.
Nada disso precisa ser dito a boa parte da população brasileira, nascidos em qualquer Estado, seja em São Paulo, no Rio de Janeiro, no Acre ou no Rio Grande do Sul. Estes sabem da riqueza que é desfrutar das diferenças regionais e respeitá-las democraticamente. Entre os esclarecidos, independentemente da condição financeira, não reina a burrice, mas o diálogo, o convívio fraterno e a troca de experiências.
Estes lamentáveis comentários preconceituosos, vindos de pessoas sem qualquer representatividade, não podem, de forma alguma, fomentar contra-ataques ou incremento de uma rivalidade interna que não existe e nunca existiu.
Estas pessoas não falam pelos Estados onde moram e não possuem qualquer mandato para tanto. Suas frases e opiniões deveriam ficar restritas aos ambientes em que enunciadas e, quando for o caso, às delegacias de polícia. À sociedade, mais do que contemplar o espetáculo, cabe reprimi-lo com a melhor arma nestes casos: o esquecimento!
É sempre bom fazer referência a um livrinho, provavelmente desconhecido por quem enuncia preconceitos infundados: a Constituição da República. Ela, como se sabe, não aconselha, indica ou sugere, a Constituição manda, prescreve, determina que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza". Assim, oxalá, os direitos sejam preservados, o Brasil continue plural e mantenha suas idiossincrasias regionais e, quem sabe, no futuro não sejam amplificadas vozes que nada dizem a não ser entusiásticas burrices.
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*Advogado do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados
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