Migalhas de Peso

O processo virtual e as limitações dos sistemas implantados pelos tribunais brasileiros. Possibilidade de cerceamento ao direito de petição e defesa

Ocorre que o limite de dados ou folhas para impressão, além de comprometer a liberdade da produção intelectual propriamente dita, na medida em que limita o desenvolvimento de teses jurídicas mais aprofundadas e robustas, estaria também, de certo modo, acarretando cerceamento ao direito de petição.

4/5/2011

O processo virtual e as limitações dos sistemas implantados pelos tribunais brasileiros. Possibilidade de cerceamento ao direito de petição e defesa

Bruno Meyer Montenegro*

A lei que instituiu a informatização do processo judicial (lei 11.419/06 – clique aqui) não trouxe qualquer dispositivo limitativo ou inibitório relativo à quantidade de páginas das petições transmitidas ou o seu equivalente em megabytes.

À despeito de a referida lei delegar aos órgãos do Poder Judiciário, no limite das suas competências, os meios pelos quais regulamentarão os procedimentos atinentes ao processo virtual, a determinação de limitar o envio de documentos pelo sistema eletrônico de cada Tribunal, com arquivos de no máximo 50 (cinquenta) folhas impressas ou 2 MB (dois megabytes), como ocorre em alguns casos, por exemplo, não parece ser razoável.

Por outro lado, tal limitação ainda não chega a causar grandes impactos ou desconforto aos jurisdicionados, vez que, neste primeiro momento, a utilização do Sistema Eletrônico tem caráter eminentemente facultativo, já que o Poder Judiciário ainda deverá conviver, por um certo tempo, com duas realidades de movimentação de feitos: uma pelo meio físico e outra pelo meio virtual. No entanto, a preocupação é pertinente, haja vista que estamos a caminhar para uma era em que somente processos judiciais virtuais existirão.

Ocorre que o limite de dados ou folhas para impressão, além de comprometer a liberdade da produção intelectual propriamente dita, na medida em que limita o desenvolvimento de teses jurídicas mais aprofundadas e robustas, estaria também, de certo modo, acarretando cerceamento ao direito de petição, assegurado constitucionalmente no artigo 5º, inciso XXXIV da Carta Magna (clique aqui).

Dessa forma, no momento em que o sistema passa a impor limites de laudas e/ou megabytes nas petições e seus anexos, sob pena de não processamento virtual do feito, entende-se que tal postura vai de encontro a direitos constitucionalmente previstos.

Indícios de cerceamento ao direito de defesa e de inibição ao exercício do direito de petição tornam-se fortes, se for levado em consideração, por exemplo, que um advogado perdeu o prazo para interpor um recurso, por não conseguir efetuar o protocolo do mesmo em tempo hábil pelo sistema virtual, já que aquela peça processual extrapolava o limite de laudas e/ou o espaço em megabytes estabelecido para o arquivo.

Infelizmente, se o Poder Judiciário não se sensibilizar com essa pequena (porém séria) problemática, o processo virtual estará correndo risco iminente de ser deixado em segundo plano, uma vez que os advogados e demais operadores do Direito não optariam em utilizá-lo, já que veriam sacrificados os conteúdos técnicos de suas manifestações, em virtude da limitação de tamanho de arquivos a serem enviados eletronicamente. Assim, surge o questionamento: como será resguardado o direito de petição e à ampla defesa, quando o processo físico for extinto, e a tramitação de feitos ocorrer somente pelo meio virtual?

Ora, o problema poderá tornar-se ainda mais grave, pois o que estará em jogo, no caso, é o direito legítimo à prestação jurisdicional. A sociedade correrá sério risco, uma vez que não terá acesso pleno ao seu direito, por conta de limitações meramente técnicas acerca do tamanho ou número de laudas dos arquivos a serem enviados pelo meio eletrônico.

Assim, a sistematização e a padronização de procedimentos em torno das questões que envolvem o processo virtual devem-se somar às experiências até então desenvolvidas <_st13a_personname w:st="on" productid="em vários Tribunais">em vários Tribunais do país, de forma que sejam adotados mecanismos e sistemas semelhantes voltados a operacionalizar e padronizar o funcionamento do processo através do meio virtual.

Respeitando-se as formalidades de cada um dos setores envolvidos, a virtualização do processo e a inclusão digital de magistrados, procuradores, advogados e demais operadores do Direito, será efetivada de forma muito mais simples e efetiva, com soluções práticas e objetivas, findando em resultados positivos e benéficos para toda a sociedade.

______________

*Sócio do escritório Figueiredo, Montenegro & Silveira Advogados, em Fortaleza/CE

"O presente trabalho não representa necessariamente a opinião do Escritório, servindo apenas de base para debate entre os estudiosos da matéria. Todos os direitos reservados."





______________

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

Regulação do uso de IA no Judiciário: O que vem pela frente?

10/12/2024

Devido processo legal na execução trabalhista: Possíveis desdobramentos do Tema 1232 da repercussão geral do STF

9/12/2024

O que os advogados podem ganhar ao antecipar o valor de condenação do cliente?

10/12/2024

Cláusula break-up fee: Definição, natureza jurídica e sua aplicação nas operações societárias

9/12/2024

Insegurança jurídica pela relativização da coisa julgada

10/12/2024