A exclusão dos danos morais da cobertura de danos corporais
Fabricio Faggiani Dib*
Anteriormente à edição da Súmula 402 do Superior Tribunal de Justiça, as companhias seguradoras, amparadas pelas Condições Gerais das Apólices, se orientavam no sentido de que a cobertura de Danos Corporais não abarcaria os Danos Morais reclamados por terceiros, sob a fundamentação de aquela cobertura previa apenas o pagamento de indenização em caso de ocorrência de danos ocasionados à integridade física do terceiro.
Nessa esteira, o cálculo do prêmio relativo à cobertura de Danos Corporais não contemplava o pagamento de eventual indenização por Danos Morais que o segurado viesse a ser condenado por sentença judicial transitada em julgado, de modo que, à luz do disposto no artigo 7571 do Código Civil (clique aqui), as seguradoras não estariam obrigadas ao pagamento de condenação imposta a este título, eis que inexistente previsão contratual para tanto.
No entanto, não obstante o fato de as Apólices de Seguro de Automóvel não possuírem cobertura para o pagamento de indenização a título de Danos Morais, os Tribunais pátrios entendiam2 que o Dano Corporal "é aquele que atinge um direito da personalidade, seja ele de ordem física, somática ou psíquica, de natureza patrimonial ou extrapatrimonial", de modo que "o seguro por dano pessoal há de compreender a indenização por ofensa à integridade corporal da pessoa e, ainda, o conjunto de outros atributos pessoais da vítima, entre eles o direito de não sofrer a dor, a humilhação e a amargura resultante do ato ilícito (dano moral em sentido estrito)".
A doutrina e a jurisprudência entendiam, ainda, que à ocasião do preenchimento da Proposta de Seguro, não era oportunizado ao pretenso segurado o conhecimento exato acerca das cláusulas contratuais constantes das Condições Gerais da Apólice e, via de consequência, das exclusões constantes em cada uma das coberturas contratadas ferindo, assim, o dever informação imposto pelo artigo 463 do Código de Defesa do Consumidor (clique aqui), inquinando o contrato de nulidade.
Em razão de serem compelidas frequentemente ao pagamento de indenizações sem que houvessem recebido a respectiva contraprestação (prêmio), as companhias seguradoras adequaram a Proposta de Seguro a fim de que fosse especificado o âmbito de cada uma das coberturas, bem como para que constasse expressamente a existência da cobertura de Danos Corporais e de Danos Morais, bem como a exclusão desta cobertura daquela, de modo a dar conhecimento prévio ao segurado e, consequentemente, afastando assim qualquer dúvida acerca dos limites contratuais estabelecidos.
Paralelamente, as Condições Gerais da Apólice passaram a ser redigidas de modo que o segurado pudesse ter pleno conhecimento sobre a existência da cobertura específica para Danos Morais e para Danos Corporais, com a necessidade de pagamento de prêmio específico para cada uma delas, bem como das exclusões constante em cada uma delas, as quais passaram a ser redigidas com maior destaque no corpo do clausulado afastando, desse modo, qualquer hipótese de interpretação extensiva das coberturas.
Diante de tais adequações, os tribunais passaram a reconhecer a possibilidade de individualização de cada uma das coberturas, de modo que "se o contrato de seguro consignou, em cláusulas distintas e autônomas, os danos material, corpóreo e moral, e o segurado optou por não contratar a cobertura para este último, não pode exigir o seu pagamento pela seguradora"4.
De acordo com o método atualmente utilizado pelas companhias seguradoras no momento do preenchimento da Proposta de Seguro, onde é apresentada ao segurado a extensão das coberturas contratadas, corroborada pela clareza das cláusulas e exclusões constantes das Condições Gerais da Apólice, não há como se ventilar a ampliação das coberturas disponibilizadas ao segurado, de modo que o contrato deverá ser interpretado exclusivamente de maneira restritiva, onde as companhias seguradoras somente poderão ser compelidas ao pagamento da indenização por Danos Morais caso tenham recebido o respectivo prêmio.
__________________
1 "Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados."
2 REsp 153837 – SP. Recurso Especial: 1997/0078993-4. Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar. Órgão Julgador: T4 - Quarta Turma. Data do Julgamento: 10 de dezembro de 1997.
3 "Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance."
4 REsp 929991 – RJ. Recurso Especial: 2006/0067230-2. Relator: Ministro Castro Filho. Órgão Julgador: T3 - Terceira Turma. Data do Julgamento: 07 de maio de 2007.
__________________
*Advogado do escritório Azevedo Sette Advogados
__________________