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Um novo estímulo para se evitar reclamações nos Procons

Passados mais de 20 anos de vigência do Código de Proteção e Defesa do Consumidor – CDC parece ter chegado a hora de descortinarmos regras e princípios existentes na lei e que aguardavam um natural período de maturidade para serem melhor percebidos.

11/2/2011

Um novo estímulo para se evitar reclamações nos Procons

Vitor Morais de Andrade*

Passados mais de 20 anos de vigência do Código de Proteção e Defesa do Consumidor – CDC (clique aqui) parece ter chegado a hora de descortinarmos regras e princípios existentes na lei e que aguardavam um natural período de maturidade para serem melhor percebidos.

Sem sermos exaustivos, podemos destacar dois destes mandamentos, ambos constantes do artigo 4º do CDC: o da harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e o incentivo à criação, pelos fornecedores, de mecanismos alternativos de solução de conflitos de consumo.

O fato é que mudamos muito nestes últimos 20 anos e esta maturidade é decorrência natural destas mudanças econômicas e sociais. Quando o CDC entrou em vigor, tínhamos quase 40 milhões a menos de pessoas, pouco mais de 20% da população integrada ao sistema bancário, pouquíssimos brasileiros possuíam telefones em suas casas e os telefones celulares estavam chegando ao Brasil a preços proibitivos que superavam a cifra de US$ 20 mil. Tínhamos, ainda, milhares de brasileiros sem energia elétrica ou acesso a redes de saneamento.

Os recentes dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio - PNAD, além de demonstrar o quanto precisamos avançar acerca do consumo de bens e serviços de necessidades básicas aos cidadãos, nos mostra como a sociedade brasileira se modificou nestes últimos 20 anos.

Contudo, esta evolução nos permite contar com ferramentas e técnicas de gestão de conflitos, que nos possibilita ajustar o foco das lentes que analisam o tema das relações de consumo, tanto nas empresas quanto no governo, o que também atua de forma colaborativa para a maturidade na aplicação das normas de proteção e defesa do consumidor.

Tanto é verdade que a implementação das mencionadas regras e princípios tem sido, ou ao menos deveria ser, um dos desafios daqueles executivos e servidores públicos que têm como um de seus deveres funcionais, tratar o tema das relações de consumo. Para isso, existem incentivos, razões e justificativas de toda a sorte, que vão desde questões econômicas, organizacionais e políticas até questões de princípios e ética.

Pinçando alguns dos inúmeros exemplos que podem servir para justificar a importância atual e futura do tema da defesa do consumidor para governo, sociedade e grupos empresariais, podemos mencionar os seguintes:

ü A criação de índices de ações, como referencial para investimentos socialmente responsáveis, que utilizam como um dos critérios de classificação a existência de sistema de monitoramento e forma de tratamento de ações judiciais ou administrativas decorrentes de relacionamento com consumidores. É o caso do Índice de Sustentabilidade Empresarial – ISE, criado pela Bovespa.

ü O potencial de aumento de demandas judiciais e administrativas. Recente análise do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - Ipea aponta que 63% de brasileiros que consideram terem sofrido alguma lesão de seus direitos, ainda não recorreram ao Judiciário.

ü O fato de 93% da população conhecer o Procon, conforme registra o Índice de Confiança na Justiça – ICJ mensurado pela Fundação Getúlio Vargas - FGV.

ü A criação de um indicador de defesa do consumidor, viabilizado pelo Sindec, que interliga Procons de todo o país e disponibiliza na internet, dados sobre todas as demandas registradas, inclusive com o nome das empresas reclamadas.

ü A assinatura de Termos de Cooperação com o Conselho Nacional de Justiça – CNJ, com o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor – DPDC/MJ e com os Procons, feito por empresas que integram os setores mais reclamados na área de relações de consumo, por meio dos quais documentaram a intenção de reduzir a litigiosidade de demandas judiciais e administrativas.

Além dos exemplos citados, temos visto que os Procons de todo o país também têm se utilizado de medidas fiscalizatórias, tanto para punir como para incentivar empresas a evitarem reiteradas infrações ao CDC.

Prova disso tem sido o registro de elevado número de autuações pelos Procons do país, bem como a recente e gradativa substituição da modalidade de sanções administrativas aplicadas. Muito embora a multa continue sendo a sanção predominante imposta pelos Procons, penas como suspensão temporária da atividade e inutilização de produtos têm se tornado cada vez mais frequentes e impondo às empresas não só um impacto econômico às suas atividades, mas também um comprometimento maior de sua imagem.

Contudo, começamos 2011 com mais um incentivo para que as empresas evitem as multas do Procon, pois passou a vigorar no início deste ano, a Portaria 38 (clique aqui) do Procon São Paulo, segundo a qual os limites mínimo e máximo das multas aplicadas e dosadas, nos termos do artigo 57 do CDC, deverão ser atualizados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E em substituição à extinta Unidade de Referência Fiscal - Ufir. O que quer dizer que o valor máximo das multas, que até 2010 era de R$ 3.191.300,00, passa a ser de R$ 6.087.883,70, representando um aumento superior a 90% do valor até então praticado.

Esperamos que as formas de controle e fiscalização, assim como esta nova regra, que possivelmente será utilizada por outros Procons do país, sejam vistas, analisadas e discutidas com a sociedade, com a maturidade que alcançamos nestes 20 anos.

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*Vice-Presidente Jurídico da Associação Brasileira de Relacionamento Consumidor Cliente – ABRAREC. Sócio do escritório Franco Montoro e Peixoto Advogados Associados e professor de Direito do Consumidor da PUC/SP


 

 

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