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Suprema Corte dos Estado Unidos decide sobre cumprimento de leis tributárias estrangeiras no país

Em 26 de abril de 2005, numa decisão de quatro votos a três, a Suprema Corte dos Estados Unidos em Pasquantino et al. v. United States, 544 U. S. ____ (2005) decidiu que, em certas circunstâncias, leis tributárias estrangeiras são passíveis de aplicação e execução (enforcement) naquele país.

9/5/2005


Suprema Corte dos Estado Unidos decide sobre cumprimento de leis tributárias estrangeiras no país

Fabiano Deffenti *

Em 26 de abril de 2005, numa decisão de quatro votos a três, a Suprema Corte dos Estados Unidos em Pasquantino et al. v. United States, 544 U. S. ____ (2005) decidiu que, em certas circunstâncias, leis tributárias estrangeiras são passíveis de aplicação e execução (enforcement) naquele país.

O acórdão é um exemplo da evolução das cortes americanas no sentido de cada vez mais homologar sentenças provindas de outros países.

1. FATOS

Carl Pasquantino, David Pasquantino e Arthur Hilts foram condenados em primeira e segunda instâncias por executarem um esquema para levar ilegalmente para o Canadá grandes quantidades de bebidas alcoólicas provindas dos Estados Unidos.

Carl e David, em Nova Iorque, haviam feito pedidos por telefone a uma loja em Maryland. Arthur, junto com outros, foi encarregado de levar as bebidas para o Canadá, escondendo-as em caminhões, com a intenção de evitar o pagamento tributos correspondentes na entrada das mercadorias no Canadá. Se pagos, os tributos duplicariam o preço venal das bebidas.

O Ministério Público Federal dos Estados Unidos indiciou Carl, David e Arthur por formação de esquemas para defraudar o sistema tributário.

2. AS NORMAS APLICÁVEIS

A revenue rule é norma oriunda da common law que rege que as cortes não homologarão sentenças de países estrangeiros quando essas se tratarem de dívidas tributárias. A norma provém de um princípio mais amplo: que as cortes de países regidos pelo sistema common law não executarão leis penais de um país estrangeiro noutro e de outra norma, ainda mais abrangente, que determina que, no âmbito do direito penal, as pessoas devem ser indiciadas no país onde o crime foi cometido.

A Corte, porém, foi chamada a decidir se os termos do artigo 1343 do título 18 do Código dos Estados Unidos (o wire fraud statute), que proíbe a formação de esquemas para defraudar o sistema tributário de outros países, era passível de execução nos Estados Unidos.

3. CONCLUSÕES DA CORTE

3.1. O voto da maioria

A maioria dos Ministros da Corte (composta pelo Presidente Rehnquist e Ministros Stevens, O’Connor e Kennedy) concluiu que os fatos do caso em tela não se enquadravam nos “exemplos clássicos de ações tradicionalmente barradas pela revenue rule”, afirmando que este caso não era de uma ação para recuperar dívidas tributárias, mas simplesmente uma ação penal ajuizada pelo governo norte-americano para punir uma conduta criminosa dos acusados.

A maioria também analisou vários julgados ingleses e americanos, reconhecendo que o escopo da revenue rule não era claro. Por conseguinte, prolatou que a norma não deveria ser entendida de forma a proibir a execução de sentenças a ponto de reduzir o efeito do wire fraud statute, principalmente porque não feria a principal razão pela qual a proibição de execução imposta pela revenue rule existe – isto é, que os tribunais, ao considerar ou não a execução de julgados estrangeiros, teriam de avaliar as políticas públicas por trás das leis de outros entes soberanos.

3.2. Os votos vencidos

Os Ministros Ginsburg e Breyer consideraram que os acusados não deveriam ser condenados, pois: I) o wire fraud statute não tinha o intuito de ser aplicado fora do território estado-unidense; II) por razão da presunção de que leis não devem ser interpretadas como tendo o intuito de serem aplicadas fora do país, a revenue rule impede a aplicação do wire fraud statute à situação dos acusados (isso porque o artigo 1343 dependia de interpretação da lei tributária canadense para que o crime pudesse ser tipificado); e III) o princípio da leniência exige que, em casos de ambigüidade na interpretação de leis penais, os tribunais devem aplicar a interpretação mais favorável ao acusado, “salvo se o Congresso expressou-se em linguagem clara e definitiva”.

O Ministro Scalia concordou somente com os argumentos contidos nas partes II e III.

4. COMENTÁRIO

A decisão em Pasquantino demonstra que a Suprema Corte está ciente da importância dada pelo legislativo norte-americano na questão de esquemas ilícitos de evasão de tributos, mesmo que esses envolvam outros países. A minoria, porém, resolveu optar por uma visão mais conservadora, apegando-se a normas e princípios tradicionais para evitar a expansão de norma contra a execução de sentenças relacionadas a tributos estrangeiros.

Mesmo podendo dar uma interpretação ampla à revenue rule, pode-se concluir que o voto da maioria preferiu reduzi-la somente a casos onde o efeito principal do julgado é executar dívidas oriundas de normas tributárias estrangeiras.

Cabe lembrar que sempre foi possível a execução de sentenças estrangeiras nos Estados Unidos – salvo em situações bastante restritas, como em caso de fraude, não cumprimento do devido processo legal ou por ferir a ordem pública norte-americana. Junto com a Lei Modelo de Execução de Sentenças Estrangeiras (já promulgada em vários estados americanos, como Nova York), Pasquantino representa mais um passo no sentido da internacionalização do direito nos Estados Unidos.

É importante que advogados fiquem cientes da possibilidade da execução de sentenças prolatadas por tribunais brasileiros em outros países. A recuperação de ativos não só é plausível, mas também pode ser extremamente rápida – principalmente nos países regidos pelo common law, onde o processo de homologação e a execução da sentença estrangeira pode ocorrer em semanas ou poucos meses.
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*Advogado do escritório Carvalho, Machado, Timm & Deffenti Advogados






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