Que delícia de mudança
Christina Montenegro Bezerra*
Não pude deixar de sentir certa apreensão por estes profissionais. Fiquei refletindo a respeito de como eles estão passando por tais transformações e, com um frio na barriga, recordei-me de quando vivi uma situação parecida.
Estava recém mudada de função – feliz e realizada no cargo almejado por mais de um ano – quando li nos jornais do fim de semana que a empresa para a qual eu trabalhava havia sido incorporada por um poderoso grupo estrangeiro.
Lembro como se fosse ontem que passei o final de semana tendo crises de choro enquanto lia a mesma notícia em todos os jornais (bem mais comuns naqueles dias do que a internet), tentando acreditar no que lia e imaginar o impacto na minha vida de profissional com pouca bagagem.
Havia rumores de que a empresa passaria por uma transformação, como sempre acontece em casos assim. Mas ler a confirmação dos rumores na manchete do jornal é uma sensação totalmente diferente.
A primeira semana foi bastante confusa. O burburinho dos funcionários assustados com o que lhes poderia acontecer. Já os prazos judiciais, alheios aos movimentos corporativos, aguardavam providências nas mesas dos advogados que pouco a pouco foram trabalhando mais e conversando menos.
Houve em algum momento uma reunião com a nova diretoria, depois uma seleção dos profissionais que tiveram coragem de se apresentar, desenferrujando o inglês, e mais um tempo depois uma profunda reestruturação, com expressões como core business transitando pela primeira vez pelo vocabulário ainda cheio de datas venias.
O Departamento Jurídico ganhou uma feição mais parecida com a que vemos hoje nas empresas, isto há mais de 15 anos. Saiu de um prédio afastado e passou a ocupar a sede da empresa, mais estratégico e mais próximo dos executivos que tomavam as principais decisões do grupo.
E foi uma sucessão de conceitos novos, novas funções e atribuições, choque de cultura, algum ressentimento no ar, advogados menos experientes ganhando espaço ao lado – e às vezes no lugar - dos mais experientes, simplesmente por falarem o mesmo idioma do grupo incorporador.
Gente é sempre um desafio enorme para empresas que se juntam. Seria como um casamento em que os filhos de uniões anteriores não apenas têm que morar juntos como ter o mesmo comportamento e ser grandes amigos (ou, pelo menos, não rolar pelo chão puxando os cabelos e se arranhando...).
O processo de incorporação não foi fácil para os gestores, tampouco para os funcionários da base, mas para mim considero ter sido o ponto decisivo em minha carreira. Foi quando mais aprendi, ousei expandir meus horizontes para fora da cidade e do país, desenvolvi na marra aptidões e competências que sequer suspeitava existirem. Enfim, cresci e amadureci. Transformei-me, sem perceber, numa pessoa e num profissional com mais valor.
Não acho que tenha sido a mudança em si que definiu a carreira que eu viria a ter a partir daquela experiência, e sim a atitude frente à mudança, atitude que me acompanha até hoje.
Eu era resiliente e, para ser sincera, provavelmente nunca tinha ouvido a palavra antes. A capacidade de adaptar-se rápida e eficientemente às mudanças é uma característica em alta conta nas organizações.
Brilham mais os profissionais que mantêm a mente aberta e, dispostos a compartilhar conhecimento, não guardam para si o que acumularam, como quem guarda um bem no cofre, mas ao contrário cedem suas idéias, generosamente, a quem quiser ouvi-las e aproveitá-las, liberando espaço para aprender incessantemente. Para mim esta é uma bela definição de resiliência. Aquele que está disposto a aprender e a ensinar está mais apto a mudar.
Penso que os mais resistentes tendem a encarar as situações de mudança como ameaças e não como oportunidades. Acreditem: não são ameaças. São de fato oportunidades. Oportunidade talvez para finalmente sair daquele emprego que detestava. Oportunidade para ficar e mostrar seu valor. Oportunidade para mudar dentro da empresa, num movimento ascendente, lateral e, por que não, descendente, assumindo outra função totalmente diferente até mesmo da sua formação. Quem sabe a pessoa não leva jeito e passa a ser mais feliz? E a melhorar sua empregabilidade!
A mudança pode e deve ser uma delícia. Basta não lutar contra, não ficar em casa chorando em cima dos jornais (ou do computador), fazer o que tiver que fazer, com disposição e leveza. O medo pesa, às vezes paralisa e, muito pior, pode levar o profissional a caminhos obscuros.
Enquanto penso nas mudanças corporativas, vou pensando na minha iminente mudança de casa. Aliás, de casa e de cidade. Tanta coisa para empacotar e tanto para mudar... Um novo espaço, novos vizinhos, filho em escola nova, outros funcionários em casa, horários diferentes para ir ao trabalho, com certeza mais tempo no trânsito. Se pensar, assusta. Mas alguém duvida que no fim tudo se acerte?
Portanto, se você estiver "empacotando" seus sonhos e planos profissionais para encarar uma mudança, vá em frente, não tenha medo, acredite que o melhor ainda está por vir e aproveite a oportunidade. Pode ser a melhor coisa que já aconteceu para a sua carreira.
________________
*Gerente Jurídico, Regulatório e Relações Governamentais da Edwards Lifesciences - Latin America e integrante do grupo Jurídico de Saias
_______________