A terra não é supermercado nem shopping center
Jayme Vita Roso*
"Se as abelhas desaparecerem, a espécie humana não terá mais do que quatro anos de vida." (Albert Einstein)
Há um sentimento coletivo em progressão de que o capitalismo e suas variáveis, exageraram no abuso do planeta em que habitamos.
Yann Arthur–Bertrand1, cineasta e fotógrafo, com sua equipe, produziu um excelente e sugestivo filme, cujo título Home (lar), exibindo as mazelas que a nossa casa temporal vem padecendo, porque o sistema econômico insiste em degradá-lo. Do filme, ao livro com o mesmo título.
De más notícias estamos fartos: fome em crescendo, clima desregulado, recursos hídricos poluídos e escassos, 130 guerras ou conflitos violentos em 80 países após a Segunda Grande Conflagração, trânsito caótico, corrupção globalizada, organizações criminosas no comando de vários setores das economias e assim por diante.
Partindo dessas constatações, Yann buscou encontrar nesse mesmo mundo alternativas para revisar ou reverter os sentimentos feridos ou as frustrações ou os desvarios dos que só enxergam na vida uma forma de satisfazer apetites carnais/egoísticos. De Nelson Mandela, tomou o exemplo de que, "quando as coragens individuais partilham uma direção ou uma vontade, elas se agregam a um elan coletivo, tornando-se capazes de mudar o mundo". Foi o exemplo de Mandela o fato propulsor de mudanças verticais em seu país, disseminando-se para as proximidades sem ter ainda atingido outros, como Ruanda. Mas, sacudiu estruturas, pois como disse Yann "homens e mulheres são complementários (recíprocos) e a coletividade se beneficia desta aliança quando a paridade dos sexos existe" (p. 182) ou quando se constata que a taxa de escolarização primária atinge 88% - mundial (p. 180).
O incansável Yann, escapando do pessimismo suicida e auto-destruidor de muitos dos seus concidadãos, vendo exemplos cá e lá, pela Gaia, convida-nos a mudar, refletindo, porque "mudar nos torna felizes, quando se trabalha para um futuro melhor. Eu o constato, cada dia, encontrando esses autores de um mundo novo" (p. 5).
Com o demonstrado apoio, conseguiu de instituições prestigiosas e ONGS (segundo a ONU convivemos com seis mil ONGS internacionais e estão catalogadas cinco milhões no mundo), equipes multidisciplinares equiparam-no com informações e relatórios de relevo. Todos valeram para os que estão interessados em participar das necessárias alterações e conhecer o que se faz.
Será o exemplo delas o motor bastante para destronar os vícios entranhados? Terão coragem e força para enfrentar a Hidra? O próximo decênio será cunhado com os esforços dos humanos conscientizados para o bem e para o amor de todos.
Do índice do livro Home, que enumera os assuntos considerados (são mais de cem), concentro apenas alguns, sem desmerecer outros.
1º) A agricultura moderna ocidental, a partir de 1950, passou a utilizar a mecanização intensiva, obtendo duzentas vezes mais de produção, mas com o uso de pesticidas, de nutrientes vegetais, orgânicos e químicos e seleção de variedades mais produtivas (clique aqui).
Para o século XXI, o desafio será conjugar os métodos mais ecológicos com uma produção elevada para alimentar o Planeta (clique aqui).
Mas, impõe-se o banimento total dos letais pesticidas, porque perturbam o sistema hormonal e favorecem a aparição de cânceres,como este escriba constatou, em Pergamino (Argentina) (clique aqui).
Também, impõe-se o radical estancamento da degradação das terras cultiváveis, hoje com quarenta por cento do nosso Planeta já maculado (clique aqui).
2º) "A humanidade tem que decidir entre o seu desaparecimento ou a sua sobrevivência" (título atribuído por Jared Diamon a um livro de sua autoria, editora Galimard, 2006).
Para sobreviver dever-se-á a qualquer custo proteger as florestas. Como? Enfrentado com vigor a exploração ilegal e legal da madeira, os riscos naturais, a mudança climática, a poluição, dando apoio à consagração das florestas em terras agrícolas, o desenvolvimento urbano, os incêndios, as doenças e os insetos. Há mais outras ainda.
Por que proteger as florestas e plantar árvores?
a) para ousar a diminuição do carbono e criar o ciclo do oxigênio-CO²;
b) lutar contra a desertificação;
c) resguardar e conservar a proteção dos habitats e serviços prestados pelos ecossistemas.
E, mais ainda, ampliar a produção de alimentos, tentar a purificação do ar, criar espaços de lazer, dar proteção das linhas das águas e à conservação do patrimônio genético e a polinização das plantas (portais geo da PNVE e FSC).
3º) Detritos perigosos, nele se colocando os lixos urbanos, até agora, incontrolados e desleixados no Brasil, são outro tema de realce.
A humanidade cegou-se, por auto flagelo, quando, a partir de 1970, sérios estudos mostraram a presença de DDT nas focas, leões marinhos e ursos brancos, além de mercúrio nos bélugas (cujas ovas produzem o mais requintado caviar) (clique aqui).
Os lixos detritos e perigosos precisam, a qualquer preço, ter reduzido seu impacto, com a diminuição ao mínimo deles (consertos de aparelhos domésticos e de escritórios e não esquecendo os nucleares), com incentivo oficial e privado à educação de todos para os destinarem a lugares adequados para os quais os poderes públicos já dirigiam suas políticas, implantá-los e bem geri-los (clique aqui).
4º) À explosão demográfica, filha adulterina da corrupção, emparelha-se a urbanização criminosa, criada por deficiências morais e éticas, com reflexos negativos para seus habitantes (clique aqui).
Aumentam as desigualdades e arruina-se a proteção ao meio ambiente (clique aqui).
Palpável a degradação nos centros urbanos. São limitadores da tarefa ecológica, pois há um aumento artificial do uso dos solos (pela desabusada multiplicação de fantasiosas quão custosas marginais, com o exemplo de São Paulo, que se prestam a expandir as redes elétricas cancerígenas e a diminuição de recursos hídricos).
Os ecossistemas estão desestabilizados, como conseqüência dos delírios urbanóides, a destruição das florestas, dos recursos hídricos, a urbanização – mascarada de qualidade de vida, a corrida nuclear e a concentração da riqueza em grupos inidentificáveis. Quo Vadis?
5º) Sucedem-se as epidemias em virtude do aquecimento global (clique aqui).
6º) A erosão avança à velocidade da luz e, como lembra Yann, "considerando-se somente a degradação dos ecossistemas florestais, a fatura já atinge a 5% do PIB mundial cada ano" (p. 20) (clique aqui).
7º) E, para não dizer que não alertamos, "o aquecimento climático custará 5000 bilhões de dólares, ou seja, o custo das duas guerras mundiais mais a depressão de 1929" (Yann, em côro com o economista inglês Nicholas Stern) (é o que mostra o 4º relatório da síntese Dogiec).
Que fazer?
A tarefa de estancar as desgraças que se espalham cabe a todos, exibindo-se-lhes: "os consumidores", sejam eles delirantes ou não, a tela de que o filme que se repete é sempre o mesma: o sistema atual é injusto; é preciso que as empresas decidam melhorar seus padrões éticos; é impostergável a luta cruenta contra a corrupção generalizada e é indiscutível que os administradores privados e públicos precisam entender que a res publica não se trata da própria, com atitudes coerentes, prudentes, sensatas e honestas. Enfim, pede-se que o homem respeite o seu semelhante e cuide do Planeta que abriga a todos.
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1 Yann Arthur-Bertrand, Home, Editions de la Martinière, Paris, Julho de 2009. A obra foi editada para a ONG Good Planet. Tivemos acesso às fontes citadas entre os dias 8 a 14/10/09.
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*Advogado e fundador do site Auditoria Jurídica
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