Parcerias Público-Privadas - A experiência internacional
Patrizia Antonacci Campos*
Atualmente, na Inglaterra, os projetos de PPP evoluíram e se sofisticaram para projetos de Iniciativa Financeira Privada (Private Finance Initiative – “PFI”). PFIs podem ser descritos como projetos em que há a assunção de responsabilidades, por parte do setor privado, sobre o desenho, construção, financiamento, operação e manutenção dos ativos relevantes, sendo o poder público o cliente responsável pelo pagamento pelos serviços prestados.
Nos termos do PFI, o poder público assina um contrato de longo prazo com uma Sociedade de Propósito Específico (“SPE”), que prestará serviços para o público de acordo com o desenho e construção feitos pela própria SPE. A intenção do PFI, portanto, de envolver o setor privado na prestação de serviços públicos em projetos governamentais, encontrou muito interesse no mercado e passou a incluir projetos em áreas tão diversas como saúde, defesa, educação, penitenciária, policial, transporte e outras.
A experiência internacional demonstrou que alguns fatores podem ser considerados essenciais para o sucesso das PPPs. A começar pelo sistema legal estável, organizado e favorável à criação e ao desenvolvimento das PPPs. Embora haja certos pontos em comum entre as PPPs e as concessões, há numerosas divergências que não permitem a utilização da legislação criada para reger as concessões sem que se crie um ambiente legal específico para as PPPs. O Reino Unido, por ter sido o pioneiro na introdução das PPPs, teve sua estrutura legal como inspiração para vários outros países, que primeiro decidiram ajustar suas legislações para dar o apoio necessário às PPPs.
Tais ajustes asseguram ao poder público a capacidade de cumprir com suas obrigações ultra vires e deram ao setor privado a certeza comercial suficiente para que os projetos se desenvolvam, não permitindo ao setor público romper um negócio sem que uma compensação seja devida ao setor privado. Importante notar que as leis e normas são diferenciadas por setores, entendendo a experiência internacional haver diferenças fundamentais entre os vários setores da economia que não permitem uma legislação única.
Quanto à divisão de riscos extraordinários, em recentes projetos de PPP feitos na França, foi incluída a cláusula de preservação do equilíbrio econômico estabelecendo a obrigação das partes de renegociar os termos do Contrato a fim de restabelecer a situação financeira anterior a qualquer ação tomada unilateralmente por uma das partes que tenha causado forte impacto no equilíbrio econômico do Contrato. No caso de o equilíbrio ter sido rompido por alterações de ordem econômica, financeira, legal, tributária ou social, as partes devem acordar no Contrato que envidarão todos os esforços para devolver o equilíbrio original ao Contrato. As partes, em ambos os casos, concordam que o contrato de PPP não pode estar estruturalmente desequilibrado.
De fato, cláusulas prevendo a divisão dos riscos assumidos pelo particular com o setor público nos casos de força maior e de alterações em legislação local são parte dos contratos padrão em vigor no Reino Unido, incluindo previsões de eventuais prorrogações contratuais, ajustes de tarifas ou subvenções adicionais, e foram adotadas em grande parte nos demais países europeus na elaboração da documentação para projetos de PPP.
Além da especial importância do ambiente legal, é essencial verificar o critério de determinação dos projetos públicos que efetivamente se beneficiam com a utilização das PPPs. Considerando que o objetivo fundamental é obter ganhos na eficiência e efetividade, mediante a alocação de riscos de projetos à parte que tem melhores condições de administrá-los, foi criada no Reino Unido uma série de diretrizes que guiam a formação de um índice de aferição para o setor público; tal índice é baseado no valor presente do projeto, na eficiência que o método atual do setor público tem condições de obter no desenvolvimento do projeto e nos riscos que têm de ser enfrentados na consecução do projeto por parte do poder público.
A criação desse índice tem por objetivo padronizar, o quanto possível, a avaliação de cada projeto, ainda que sem estabelecer regras fixas para a decisão final, permitindo um determinado nível de flexibilidade para o exame de cada projeto em questão, o que demonstra uma forte tendência internacional no sentido de padronizar a documentação envolvida em um projeto de PPP.
França, Espanha e Portugal têm buscado referências na experiência do Reino Unido a fim de tentar centralizar as diretrizes para a elaboração de documentos e, em certos casos, tentar até padronizar contratos, com o objetivo de simplificar a negociação de termos e condições do relacionamento a ser mantido com o privado, parceiro em determinado projeto de PPP.
Embora as primeiras diretrizes tenham sido emitidas no Reino Unido em julho de 1999, foi recentemente criado um Departamento de Comércio Governamental (“OGC”) que reviu e compilou, em novembro de 2002, todo o trabalho anterior nesse sentido, resultando nas “Diretrizes OGC”. Os objetivos básicos dessas normas são os de promover um entendimento comum a respeito dos riscos normalmente encontrados em um projeto típico de PPP, ser consistente em relação à condução da negociação e ao estabelecimento de preços em projetos similares e reduzir o tempo e os custos de negociação em assuntos que podem ser acordados mais facilmente mediante a apresentação de um contrato padrão.
As Diretrizes OGC são normas gerais, uma vez que, embora a experiência prove ser possível padronizar contratos em projetos similares de PPP, é notória a diferença que há entre projetos a serem desenvolvidos em diferentes áreas. Como conseqüência, algumas outras compilações de diretrizes têm surgido relacionadas especificamente às áreas de educação, transporte, hospitalar, dependendo da experiência de cada país.
As necessidades e experiências em projetos de PPPs variam entre os diferentes países: o Reino Unido deu muita ênfase às PPPs nos setores de educação, saúde e construção; a Itália e Portugal concentraram-se inicialmente no setor da saúde; a Holanda, no de infra-estrutura; a Noruega e a Irlanda, no de transportes; e o Canadá, por sua vez, já apresentou um projeto utilizando as PPPs para modernização e ampliação dos tribunais e outros órgãos relacionados ao seu sistema judiciário.
Em conclusão, podemos dizer que a evolução internacional das PPPs envolveu adequações dos sistemas legais dos países que decidiram adotar as parcerias e que há uma forte tendência de padronização de documentação envolvida nos projetos de PPPs. A experiência dos países europeus que primeiro desenvolveram as PPPs vem sendo utilizada pelos demais poderes públicos, que terão, contudo, de buscar nas suas próprias necessidades os projetos que mais beneficiarão o público local e que mais incentivarão o setor privado a participar do desenvolvimento do país.
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* Advogada do escritório Pinheiro Neto Advogados
* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.
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