O anteprojeto do Novo Código de Processo Civil foi proposto e elaborado por uma comissão de juristas, presidida pelo ministro Luiz Fux, então do Superior Tribunal de Justiça, hoje Ministro do STF, instituída pelo ato 379 do presidente do Senado Federal, ao final de setembro de 2009. Portanto, estamos diante de um projeto que já tramita por mais de cinco anos. Aqui já é bom esclarecer, que a tramitação se iniciou invertida, como mencionado, o processo legislativo teve início no Senado Federal, com o PL 166/2010, passou pela Câmara dos Deputados nela numerado PL 8046/2010 e retornou recentemente ao Senado, devendo salvo novas agruras, ser por esta Casa Legislativa finalizado.
Estudando um pouquinho o tema, por incrível que pareça existem, atualmente, no mínimo, quatro versões do futuro Código de Processo Civil. Duas versões iniciais do Senado: – a redação original e seu substitutivo, oriundo do relatório geral apresentado pelo Senador Valter Pereira; a versão aprovada pela Câmara dos Deputados em Abril e a última versão que ainda se encontra, em andamento para aprovação, no Senado Federal. A importância do esclarecimento das diversas versões consiste no fato de que cada uma delas sofreu grandes alterações, em momentos diversos, e com diferentes disposições legais criadas, alteradas e removidas. Ademais, a Câmara dos Deputados realizou profundas mudanças na versão encaminhada pelo Senado, o que sugere, portanto, ainda futuras grandes modificações quando do retorno à Casa de origem.
No Senado, o projeto foi elaborado pela comissão composta pelos professores: Luis Fux (presidente), Teresa Arruda Alvim Wambier (relatora), Adroaldo Furtado, Humberto Theodoro Júnior, Paulo Cesar Pinheiro Carneiro, José Roberto dos Santos Bedaque, José Miguel Garcia Medina, Bruno Dantas, Jansen Fialho de Almeida, Benedito Cerezzo Pereira Filho, Marcus Vinicius Furtado Coelho e Elpídio Donizetti Nunes. O objetivo do trabalho foi garantir um novo Código de Processo Civil que privilegiasse a simplicidade da linguagem, a ação processual, a celeridade do processo, bem como o estímulo à inovação e à modernização dos procedimentos, garantindo o respeito pleno ao devido processo legal1. Desse modo, inicialmente buscou-se detectar as barreiras para a prestação de uma Justiça rápida, no intuito de legitimar democraticamente soluções.
A tramitação no Senado durou apenas seis meses, quando foram analisados os problemas processuais, particularmente o excesso de formalismo, fomentando, para tanto, pretensas soluções, apesar de muitas delas inspiradas em sistemas judiciais diversos, notadamente nas famílias da civil law e da cammon Law.. Durante a formulação foram ouvidas a sociedade e as comunidades jurídica e científica, em geral, por meio de audiências públicas em todo o país (foram recebidas 260 sugestões e manifestações acadêmicas de todos os segmentos judiciais, desde a Associação Nacional dos Magistrados à Ordem dos Advogados do Brasil, passando ainda pelos institutos científicos e faculdades de direito). Em 2011, o projeto foi para a câmara.
Na câmara, os dois relatores da formulação do novo Código, foram os deputados Sérgio Barradas Carneiro e Paulo Teixeira, o projeto foi finalmente aprovado em abril de 2014, retornando ao Senado Federal. A Tramitação na câmara durou três anos, quando houve outro intenso debate entre a sociedade e a comissão especial, além da participação do plenário, envolvendo todos os partidos.
O Projeto foi dividido em cinco livros: Parte Geral (Livro I); Do processo de Conhecimento (Livro II); Do Processo de Execução (Livro III); Dos Processos nos Tribunais e Meios de Impugnação das Decisões Judiciais (Livro IV); e Das Disposições Finais e Transitórias (Livro V).
Segundo o deputado Paulo Teixeira, o Novo Código foi fundado em oito linhas mestras2. O primeiro grande eixo de inovação envolve a instituição das tentativas de mediação e conciliação, como primeiro passo do cidadão que leva seu conflito à justiça. Para tanto, foi proposta a formação de centros públicos de mediação e conciliação, organizados por comarca e compostos de mediadores e conciliadores com formação especifica e remuneração apropriada. O foco é, antes de tudo, a busca pela solução consensual do conflito. Nesse aspecto, a influência parte do direito estrangeiro, mais precisamente do americano, em que a experiência dos meios consensuais de solução de conflitos se mostra muito bem sucedida. Ademais, também no Brasil as tímidas experiências tanto de mediação como de conciliação, judicial ou extrajudicial, têm se mostrado positivas. O objetivo é tornar a sociedade menos conflituosa.
O novo Código abre, dessa forma, espaço para a reformulação da atual cultura jurídica de litigância permanente e interminável, direcionando a solução dos conflitos à negociação e composição pelas próprias partes, em detrimento da cultura jurídica do litígio e da jurisdição. Não à toa a alta composição institucionalizada do novo CPC ensejará outros enfoques formal e acadêmico, e uma nova postura dos profissionais do direito.
No mesmo sentido, embora não abordada do Projeto do Novo Código de Processo Civil, cabe aqui lembrar e traçar um paralelo com a iniciativa elogiável da Gestão Nalini, que estendeu às Serventias Extrajudiciais a prática de atos conciliatórios. Tratava-se do provimento 17, que autorizava as 1.535 serventias de todas as modalidades, ou seja, Registro Civil, Registro de Imóveis, Registro de Títulos e Documentos e Tabelionato de Notas ou Protestos, a buscar a via alternativa de solução de conflitos. No entanto, a OAB ingressou com pedido de providências junto ao Conselho Nacional de Justiça, solicitando a suspensão do provimento. Embora em um primeiro momento o conselheiro Jorge Hélio Chaves de Oliveira tenha rejeitado a liminar, entendendo não estar presente o requisito periculum in mora, a OAB requereu nova apreciação e a conselheira Gisela Godin Ramos reconsiderou a decisão, sob o argumento de que a matéria seria de competência exclusiva da União Federal, impossibilitando, portanto, aos "Cartórios" Extrajudiciais de São Paulo a prática dos atos conciliatórios.
Segundo o argumento do próprio dr. Renato Nalini, a regulamentação dos atos conciliatórios pelas Serventias Extrajudiciais apenas autorizaria a formalização de acordos, que na prática muitas vezes já são realizados pelas Serventias, principalmente o Registro Civil que goza grande proximidade das pessoas em pequenas cidades, realizando conciliações informais e esclarecendo às partes seus direitos. Contribui, para autorizar notários e registradores a celebrar acordos, o ótimo preparo dos profissionais desta área submetidos a concursos públicos de provas e títulos rigorosíssimos, tanto para provimento quanto para remoção. Sem sombra de dúvida, a auto composição nestes casos gera solução rápida, menos onerosa e, em muitos casos, mais apropriada e satisfatória. O serviço prima pela confidencialidade, informação, competência, neutralidade, celeridade, autonomia, empoderamento (estimulo à cultura de resolução de litígios futuros e à auto composição), validação (estímulo à percepção reciproca como seres humanos) e pelo respeito à ordem pública. Desse modo, com o futuro novo enfoque do direito processual civil brasileiro, por que não a extrajudicialização via serventias extrajudiciais na aplicação dos métodos alternativos de resolução de conflitos?
Assim, retomando a ideia do novo Código, além do enfoque nos meios mais adequados de resolução de conflitos, foi proposto ainda o estabelecimento de mais poderes às partes, que serão estimuladas à auto composição durante o próprio processo, notadamente em relação aos ritos, procedimentos e prazos. Para ilustrar, as partes poderão em conjunto escolher o perito e apresentá-lo ao juiz (art. 472, projeto da câmara). Por meio da composição das partes, facultar-se-á ainda a apresentação de propostas de redução de prazos ao juiz, em vista da celeridade no andamento processual.
O novo Código possui um viés completamente diferente dos anteriores. Trata-se do primeiro Código de Processo Civil aprovado em regime democrático de governo. O código de 1939 foi outorgado pela ditadura Vargas, enquanto o de 1973 foi muito pouco discutido no regime ditatorial militar. Logo, por tratar-se do primeiro código aprovado em um regime democrático, possui o viés de fortalecimento das partes para a solução do conflito.
São paradigmas do novo CPC:
1- A democratização do processo;
2- A menor duração do processo sem a perda das garantias constitucionais;
3- Prestígio ao contraditório em detrimento de decisões liminares inesperadas;
4- Solução de conflitos transindividuais;
5- Isonomia das partes na tramitação do processo;
6- Respeito à cronologia dos julgamentos;
7- Consolidação do processo eletrônico;
Por que não criamos um novo paradigma, aproveitando as quatro versões diferentes do Projeto, tramitando há tantos anos no Congresso Nacional? Podemos propor de nossa parte uma maior desjudicialização de atos, fases e procedimentos, criando novas atribuições para os tabelionatos e ofícios de registro, remanescendo à jurisdição apenas questões complexas a fim de atender, com precisão, os anseios da sociedade pós-moderna. Fica aqui a sugestão; até o próximo Registralhas!
__________
2Palestra proferida em Seminário O Novo Código de Processo Civil no Largo São Francisco em 17/9/14.