Previdencialhas

A Desoneração da Folha e a ADI 7633 – A necessária observância do art. 195, § 6º da CF/88

Prorrogação da desoneração da folha de salários, aprovada pelo Congresso, viola a Constituição. EC 103/19 sepultou essa técnica, exigindo aplicação da nova regra geral.

6/5/2024

Que a prorrogação da desoneração da folha de salários, na forma aprovada pelo Congresso Nacional, desrespeita a Constituição de 1988, não há muitas dúvidas. A técnica, sempre envolva em controvérsias, foi definitivamente sepultada pela EC 103/19, a qual deu nova redação ao art. 195, § 9º da CF, além de revogar o art. 195, § 13. A mesma Emenda trouxe previsão transitória, admitindo a validade das normas ainda vigentes na época, conforme art. 30 da EC 103/19. 

Sendo a desoneração norma "provisória", a extinção da autorização constitucional demanda, por natural, a aplicação da nova regra geral da CF/88 a todas as atividades econômicas. Nova prorrogação após a EC 103/19 é inconstitucional, por ausência de amparo normativo para tanto. Curiosamente, por questões variadas, o mesmo Congresso que aprovou a EC 103/19, decide renovar a desoneração da folha, por meio da lei 14.784/23.

Questões sobre as vicissitudes políticas e econômicas que motivaram a medida são interessantes, mas escapam ao propósito do presente texto. O ponto, estritamente jurídica, é: Uma vez afastada a prorrogação, por vício de inconstitucionalidade, a cobrança das contribuições previdenciárias deve ser imediata, como entende a Receita Federal do Brasil, em recente manifestação? 

Entendo que não. A exigência constitucional de 90 dias para a imposição de contribuições sociais majoradas (art. 195, § 6º), embora literalmente direcionada a imposição por inovação legal – caminho ordinário para alterações impositivas no plano de custeio previdenciário – não afasta a eficácia do mesmo regramento quando derivado do controle de constitucionalidade, o qual, na dinâmica do direito positivo, produz normatividade comparável à atividade legiferante – especialmente na atualidade. 

Não é demais lembrar a obviedade do preceito, voltado ao valor da segurança jurídica, que norteia a aplicação das normas tributárias, mesmo que oriundas de decisões do poder Judiciário. O entendimento administrativo somente propiciará demandas judiciais variadas para obter o óbvio: as garantias constitucionais dos contribuintes não são limitadas às atividades legislativas, mas também delimitam as prerrogativas dos poderes Executivo e Judiciário. 

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Colunista

Fábio Zambitte Ibrahim é advogado, doutor em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, mestre em Direito pela PUC/SP. Membro fundador da Academia Brasileira de Direito da Seguridade Social. Professor Associado de Direito Tributário e Financeiro da UERJ, árbitro do Comitê Brasileiro de Arbitragem - CBAr. Foi auditor fiscal da Secretaria de Receita Federal do Brasil e Presidente da 10ª Junta de Recursos do Ministério da Previdência Social.