Nos últimos anos, uma questão aparentemente tormentosa que se apresenta é a possibilidade de cômputo do tempo militar em regime próprio de previdência como período de atividade pública, com tratamento equiparado às atividades em cargo público de provimento efetivo. Como se tem notícia, as instâncias administrativas têm compreensão pela negativa da possibilidade, com mera averbação do período, mas sem a possibilidade da equiparação apontada, o que traz potenciais prejuízos, especialmente para servidores públicos com vinculação aos respectivos regimes em período anterior às últimas reformas previdenciárias.
Esclarecendo o exposto, há diversos servidores públicos em atividade, mas com ingresso nos últimos anos, representando público que perpassou diversas reformas e regras transitórias, com o explícito estímulo à migração para as novas regras de proteção social, como, por exemplo, o Regime de Previdência Complementar – RPC, que, em âmbito federal, foi disciplinado pela lei 12.618/2012.
No aludido sistema – que adotamos no presente artigo para fins de exemplo – o servidor federal ocupante de cargo efetivo detinha a opção de migrar ao novo sistema, o qual conta com uma compensação financeira dos recolhimentos previdenciários pretéritos acima do limite máximo de pagamento do Regime Geral de Previdência Social, conhecido como "benefício especial" e, ainda, a possibilidade de adesão ao RPC, o qual é patrocinado pela União Federal.
Pois bem, na hipótese de servidor federal com tempo de militar prévio, a dúvida principal seria: caberia a contagem do tempo militar como período de atividade na função pública? Se a resposta for afirmativa, o interregno indenizado pelo benefício especial é maior, assim como é facilitada a obtenção dos requisitos de elegibilidade das aposentadorias, as quais, a depender da regra, demandam tempo de serviço público elevado.
Apesar de os militares, na minha percepção, possuírem regime protetivo diverso do previdenciário, entendo que a contagem do interregno nas Forças Armadas seja comparável ao tempo de atividade pública, por expressa autorização constitucional. Do ponto de vista administrativo, o enquadramento do militar, até a EC 18/98, era como espécie do gênero "servidor público". Não por outro motivo, a contagem recíproca entre as atividades não contava com grandes dificuldades.
Mesmo com a mudança apontada, todavia, é importante notar que as aproximações foram mantidas e mesmo reforçadas na CF pelas últimas reformas, como se nota nas restrições a acumulações de benefícios, as quais, também nos últimos anos, têm agregado prestações derivadas de atividade militar. Da mesma forma, a EC nº 103/19, ao prever a aposentadoria especial no âmbito dos Regimes Próprios, expressamente admite o tempo militar como atividade policial. Qual o sentido em admitir-se o tempo militar como tempo especial no RPPS e não para os demais efeitos?
Dentro de uma perspectiva a fortiori, nos parece que a vontade do constituinte derivado foi, no bojo da proteção social dos servidores públicos, computar o tempo militar para todos os fins. Em suma, apesar dos regimes protetivos diversos, o interregno de atividade militar, quando averbado em RPPS, deve ser computado como tempo de atividade pública, conforme expressa autorização da EC 103/19.