Previdencialhas

Isenções e não-incidências: A correta compreensão do art. 28, § 9º da lei 8.212/91

Na percepção do fisco federal, qualquer aporte pecuniário, direto ou indireto, recebido por empregados, será qualificado como salário-de-contribuição, salvo se expressamente excluído pelo referido dispositivo legal. A premissa, todavia, é somente parcialmente correta.

27/3/2023

Não é de hoje que as discussões sobre o alcance da base tributável previdenciária permeiam as instâncias administrativas e judiciais. No bojo dos debates sobre a (in)tributabilidade dos fringe benefits, há as “dispensas” previstas no art. 28, § 9º da lei 8.212/91, ao dispor sobre diversas rubricas que "não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente".

Na percepção do fisco federal, qualquer aporte pecuniário, direto ou indireto, recebido por empregados, será qualificado como salário-de-contribuição, salvo se expressamente excluído pelo referido dispositivo legal. A premissa, todavia, é somente parcialmente correta.

Como já expus no passado, a discussão da tributação previdenciária sofre com as confusões entre o plano de custeio do RGPS e a legislação do imposto sobre a renda. Neste tributo, quaisquer rendimentos, de capital ou trabalho, são tributados. Já naquele, somente rendimentos do trabalho, de índole contraprestacional, como determina o art. 195, I, "a" da CF/88.

Sendo assim, no art. 28, § 9º da lei 8.212/91, há diversas hipóteses de isenções tributárias, como, por exemplo, o aporte patronal em planos de previdência complementar. Típico salário indireto, que deveria ser agregado ao salário-de-contribuição, mas deixa de ser por escolha legislativa. Nesse sentido, a necessidade de previsão legal para a dispensa é correta.

Todavia, no mesmo preceito há aportes sem natureza salarial, como, por exemplo, a ajuda de custo decorrente de mudança de local de trabalho. O aporte tem claro objetivo de ressarcir o empregado das despesas de transferência e, salvo fraude, não teria, de qualquer forma, incidência previdenciária, mesmo sem suporte legal expresso. É uma não-incidência pura e simples, pois não retrata retribuição pelo trabalho.

Ou seja, no mesmo preceito legal há previsões concretas de isenções tributárias, que produzem efeitos importantes, conjugadas com regras de índole estritamente didática, pois, mesmo que lá não estivessem, não deveriam gerar efeitos diversos na realidade do plano de custeio previdenciário.

A distinção é relevante por diversos motivos. Pontuo dois: primeiro, outras rubricas de folha de pagamento, mesmo que não previstas no art. 28, § 9º da lei 8.212/91, não devem sofrer incidência previdenciária, pois não traduzem retribuição para o trabalho, como, por exemplo, bônus de contratação a novos empregados. Segundo, a aplicação das hipóteses de não-incidência expressamente previstas em lei não se submetem a interpretações restritivas, como em geral defende o fisco federal para isenções tributárias, na forma do art. 111 do CTN.

Essa percepção, da coexistência de isenções tributárias com não-incidências ordinárias no mesmo preceito legislativo, nos parece fundamental para a solução de boa parte das controvérsias do custeio previdenciário. Além disso, naturalmente, devemos evitar confusões com a base abrangente do imposto sobre a renda. Adotada tais medidas, muitas soluções se apresentarão para casos aparentemente complexos. 

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Colunista

Fábio Zambitte Ibrahim é advogado, doutor em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, mestre em Direito pela PUC/SP. Membro fundador da Academia Brasileira de Direito da Seguridade Social. Professor Associado de Direito Tributário e Financeiro da UERJ, árbitro do Comitê Brasileiro de Arbitragem - CBAr. Foi auditor fiscal da Secretaria de Receita Federal do Brasil e Presidente da 10ª Junta de Recursos do Ministério da Previdência Social.