Recente decisão judicial, amplamente noticiada nos canais jurídicos, reacende a antiga discussão sobre a validade e alcance do adicional de SAT/RAT para custeio das aposentadorias especiais. O custeio dos benefícios acidentários no Regime Geral de Previdência Social sempre trouxe dificuldades, o que só aumentou com a adição da aposentadoria especial. Desde discussões sobre a terminologia da contribuição (SAT, RAT, GIILDRAT etc.) até aspectos relacionados à legalidade tributária, a imposição fiscal mostra-se presente nos Tribunais com frequência elevada.
Uma dimensão particular do problema reside no adicional de contribuição para empregadores que tenham segurados expostos a agentes nocivos, de forma a viabilizar a contagem de tempo especial e eventual aposentadoria precoce. O referido adicional foi criado pela lei 9.732/98, mediante alteração do art. 57 da lei 8.213/91. Aprovada no bojo das reformas previdenciárias de 1998, a inovação legislativa ainda gera dificuldades. Lembro-me, vivamente, que a alteração gerou perplexidade desde o primeiro dia, pois, afinal, inseriu-se no Plano de Benefícios do RGPS uma previsão de contribuição adicional que caberia ao Plano de Custeio, previsto na lei 8.212/91.
Tempos depois, com a transferência da fiscalização previdenciária para o Ministério da Fazenda (hoje, Ministério da Economia), apontava eu aos alunos da época uma dificuldade que viria: a avaliação do meio-ambiente do trabalho para fins de incidência do referido adicional, pois, como se vê hoje, temos duas instâncias administrativas avaliando, paralelamente, o eventual direito do trabalhador ao cômputo de tempo especial.
O Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, para fins de concessão do benefício ou contagem de tempo especial, possui a prerrogativa de validar documentos laborais para eventual reconhecimento do período. Em paralelo, a Receita Federal do Brasil – RFB, no aspecto contributivo, exerce a capacidade tributária ativa da União Federal para fins de identificação do fato gerador e quantificação do crédito tributário.
Aliada à indesejada divisão de competências, há, ainda, uma razoável subjetividade na avaliação das atividades especiais, como, por exemplo, a existência de agentes nocivos dotados de avaliação meramente qualitativa, agentes perigosos e eficácia de equipamentos de proteção, para ficarmos somente em três aspectos controvertidos. Uma terceira dimensão do problema é, ainda, a tibieza estatal em regular objetivamente a matéria, não raramente se limitando a seguir a jurisprudência dos Tribunais Superiores, trazendo insegurança não somente aos empregadores, mas também aos diversos servidores envolvidos na atividade, tanto no INSS como na RFB.
Com o presente contexto de insegurança normativa, o que se nota na atividade administrativa é a peculiar situação na qual o INSS, diante da ambiguidade normativa, nega o enquadramento do tempo especial e a RFB, em situação análoga, constitui o crédito tributário mediante confecção do auto-de-infração respectivo. Os servidores de ambas as instituições são colocados em situação difícil, pois conduta diversa poderia implicar responsabilizações funcionais.
Com isso, perdem todos: servidores, segurados do RGPS e empregadores. Estes se veem constantemente sujeitos a autuações fiscais e reclamações de empregados desejosos do tempo especial de atividade. Entendo que duas soluções seriam possíveis: uma necessária ação conjunta do INSS e RFB para fins de avaliação do meio-ambiente do trabalho. A simultânea análise deveria ser requisito fundamental para os lançamentos fiscais, os quais, também, deveriam implicar imediato reconhecimento do tempo especial pelo INSS. Idealmente, a fiscalização do trabalho também deveria ser incluía, em uma espécie de gestão tripartite do tema.
Outra opção seria simplesmente extinguir o referido adicional. Poderia o legislador ordinário, por exemplo, ampliar o leque de alíquotas básicas do SAT/RAT de acordo com o CNAE, aplicando alíquotas mais elevadas para atividades econômicas que, presumidamente, tenham atividades especiais. O zelo particular de cada empresa com o respectivo meio-ambiente do trabalho poderia ser bonificado pelo ajuste do fator acidentário de prevenção – FAP, o qual, aliás, também carece de ajustes e, com isso, poderia viabilizar a mudança.
O fato é que o adicional do RAT, após 22 anos de existência, dentro da moldura de competências previdenciárias compartilhadas e indefinição regulatória, não parece viabilizar, adequadamente, o custeio da prestação previdenciária. A recente inovação normativa com a inclusão de idades mínimas para a aposentadoria especial, em conjunto com as vedações à conversão de tempo futuro, também não ajuda a amparar a exação fiscal. É tempo de repensar a contribuição.