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Teto remuneratório na acumulação de aposentadoria com pensão por morte – O Tema 359

Teto remuneratório na acumulação de aposentadoria com pensão por morte – O Tema 359.

24/5/2021

Conforme conhecido tema de repercussão geral no Supremo Tribunal Federal, de número 359, a Corte, ao analisar tese jurídica relativa à servidora pública aposentada com a pretensão de acumular seu benefício com pensão por morte decorrente do óbito de cônjuge, também servidor público, entendeu pela aplicabilidade do art. 37, XI da Constituição de 1988, o qual, desde o advento da EC 19/1998, explicitamente prevê "pensões" no cômputo do limite remuneratório, ainda que cumulativamente. A mesmo ratio teria sido mantida pela EC 41/03.

Com isso, formou-se na Corte Constitucional a seguinte tese: "Ocorrida a morte do instituidor da pensão em momento posterior ao da Emenda Constitucional 19/1998, o teto constitucional previsto no inciso 11, do Artigo 37, da Constituição Federal, incide sobre o somatório de remuneração ou o somatório de provento e pensão recebida por servidor".

Interessante notar que o mesmo STF, no tema de repercussão geral 377, de forma diametralmente oposta, deliberou pela possibilidade de acumulação, como se nota: "Nos casos autorizados constitucionalmente de acumulação de cargos, empregos e funções, a incidência do artigo 37, inciso XI, da Constituição Federal, pressupõe a consideração de cada um dos vínculos formalizados, afastada a observância do teto remuneratório quanto ao somatório dos ganhos do agente público". O referido tema ampliou o que já havia sido deliberado no tema 384, o qual debatida o limite em período anterior à EC 41/03.

A potencial contradição não passou despercebida, pois foi explicitamente apresentada na discussão judicial em epígrafe, mas com a aparente distinção pelo singelo fato de, no tema 377, o precedente ser relativo a acumulações de remunerações pelo mesmo servidor, enquanto o tema 379 seria relativo a acumulações de benefício de aposentadoria e pensão por morte.

Todavia, não vejo acerto na decisão. Pela literalidade desejada pela Corte, o tema 377 teria de ser revisto, pois o art. 40, § 11 da CF/88 também prevê o limite remuneratório para acumulação de benefícios, inclusive para situações de acumulação lícita de cargos públicos. Ainda que se admita que o tema 377 é restrito a servidores ativos, somente, a incongruência só aumenta, pois se permitiria acumulação de vencimentos no serviço ativo, com as respectivas contribuições previdenciárias para, ao final, obter somente uma prestação...

Ou seja, pela linha de raciocínio da Corte, não é constitucional que o servidor seja coagido a trabalhar "de graça" e, por isso, os limites são individualizados. Mas, uma vez na aposentadoria (a depender de como a Corte venha a se posicionar) e, pior, na hipótese de óbito do servidor, a acumulação será inconstitucional, mediante interpretação literal do art. 37, XI da CF/88, sem qualquer modulação entre servidores submetidos a regimes jurídicos dos mais variados.

É inegável que o Brasil é um país desigual. Também é razoável admitir a existência de limites remuneratórios, especialmente no serviço público. Os limites também encontram lugar nos regimes públicos de previdência social, até pelo objetivo dos modelos protetivos estatais de preservar patamar adequado de vida digna, sem necessária manutenção plena de bem-estar de segurados e dependentes, os quais podem e devem buscar cobertura adicional mediante as diversas opções no mercado.

No entanto, tais premissas devem ser cotejadas com a realidade de diversas pessoas que foram submetidas a regimes protetivos variados ao longo do Século passado. De início, o modelo protetivo de servidores era exclusivamente administrativo, desprovido de natureza previdenciária (a malsinada cassação de aposentadoria é exemplo clássico). Depois, com as reformas previdenciárias de 1998 até 2019, migra-se para modelo previdenciário o qual tem como objetivo elementar o equilíbrio financeiro e atuarial. Hoje, temos de lidar com pessoas que foram atingidas por importante mudança de regime jurídico-protetivo.

A referida premissa é fundamental para a correta compreensão do problema proposto. Para novos servidores, a questão é simples. Já se sabe, de antemão, das restrições às acumulações de prestações previdenciárias – particularmente agravadas pela EC 103/19 – e, com isso, constrói-se a cultura de uma necessária cobertura adicional, seja de índole pessoal, familiar ou privada, mas, ao fim e ao cabo, jovens servidores têm consciência da possível insuficiência estatal na cobertura própria e de seus dependentes. A aplicação obrigatória do teto remuneratório RGPS aos novos servidores já traz essa perspectiva.

Ou seja, os limites remuneratórios constitucionais, quando conjugados com as regras vigentes de aposentadorias e pensões atualmente válidas, nos transmitem modelo compatível com os ideais de justiça e equilíbrio dos modelos protetivos. No entanto, como se disse, as pessoas no regime de transição representam uma "geração abandonada" na cobertura previdenciária, sofrendo restrições cada vez mais severas e absoluta incerteza em período dramático de suas vidas.

Melhor do que construirmos tentativas hermenêuticas de escapar à vedação constitucional mediante combinações e arranjos não expressamente previstos, como fora o caso da pensão sem previsão no art. 37, XI da CF/88 até a EC 19/98, melhor será superar a restrição para pessoas amparadas pelo regime jurídico anterior, as quais carecem de alguma transição razoável, o que, hoje, seguramente não existe.

Idealmente, poder-se-ia admitir a acumulação de benefícios a essas pessoas, mediante aplicação conjunta da revogada redação do art. 40, § 7º da CF/88 da redação dada pela EC 41/03. O redutor de 30% sobre os valores que ultrapassavam o teto do RGPS, aliada à contribuição previdenciária sobre a mesma base, já representavam transição adequada para essas pessoas. Agora, pretende-se que nada recebam, além de seus benefícios de titularidade própria.

Em minha opinião, a solução ideal, de forma a compatibilizar os precedentes da própria Corte com o ideal de uma transição justa entre os regimes jurídicos, demandaria a seguinte segregação:

1) Aposentadorias e pensões com eventos determinantes após a EC 41/03 devem se submeter aos gravames constitucionais quanto aos limites de acumulação de benefício, nos termos do art. 37, XI e 40, § 11, ambos da CF/88;

2) Aposentadorias e pensões com eventos determinantes até a EC 41/03 podem ser objeto de acumulação, sendo, no caso da pensão por morte, aplicada a pretérita regra do art. 40, § 7º da CF/88, na redação dada pela EC 41/03, a qual seria dotada de ultratividade para o referido grupo, por representar regra de transição adequada.

O importante, em suma, é escapar do discurso fácil e abstrato da redução de desigualdades e remoção de privilégios. É óbvio que todos desejamos estes objetivos, mas não será vilipendiando expectativas legítimas de idosos já aposentados e pensionistas que alcançaremos os ideais da Constituição de 1988.

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Colunista

Fábio Zambitte Ibrahim é advogado, doutor em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, mestre em Direito pela PUC/SP. Membro fundador da Academia Brasileira de Direito da Seguridade Social. Professor Associado de Direito Tributário e Financeiro da UERJ, árbitro do Comitê Brasileiro de Arbitragem - CBAr. Foi auditor fiscal da Secretaria de Receita Federal do Brasil e Presidente da 10ª Junta de Recursos do Ministério da Previdência Social.