Porandubas Políticas

Porandubas nº 797

Depois da folia e do descanso carnavalesco, o país começa a funcionar.

1/3/2023

Abro com uma historinha do meu querido RN.

O sabiá do senador

Quando senador pelo Rio Grande do Norte, Agenor Maria (sindicalista rural, falecido em 1997), visitando o município de Grossos, foi interpelado pelo prefeito Raimundo Pereira.

"Estamos precisando de uma escola para a comunidade de Pernambuquinho."

De pronto, Agenor garantiu-lhe apoio à proposição. Semanas depois, um telegrama traz a boa-nova ao prefeito.

"Escola está assegurada. Mande-me o croqui."

Tomado pelo espírito de gratidão, Raimundo visita Agenor para agradecer o empenho, carregando uma gaiola à mão. Diante do senador, que estranha o acessório, Raimundo vai logo se explicando.

"Eu não peguei um concriz como o senhor pediu, mas trouxe esse sabiá. O bichinho canta que é uma beleza!"

(Historinha narrada em Só Rindo 2, por Carlos Santos).

Pós-carnaval

Depois da folia e do descanso carnavalesco, o país começa a funcionar. A desolação da paisagem no litoral norte de São Paulo, a partir de São Sebastião, ainda é a imagem que ocupa as nossas cacholas. E as velhas verdades sobem, mais uma vez, à tona: crônica das mortes anunciadas; irresponsabilidade dos nossos governantes, que não realizaram ações de prevenção; ambição de endinheirados, preocupados em manter sua vivência de conforto; ocupação desenfreada de espaços nas encostas das matas. O Brasil se repete no ciclo das tragédias provocadas pelas chuvas de verão.

Conflitos na economia

Pouco a pouco a realidade cotidiana desenha sua dureza, enquanto as comunidades aguardam o desfecho de medidas que afetarão seu bolso. A gasolina, por exemplo. Voltará a ser onerada, mais que o etanol. Afinal, o cofre do Tesouro Nacional não pode secar. Fernando Haddad, o ministro da Economia, defende a volta da oneração. Ganha a primeira batalha de uma guerra que vai durar. Seus opositores juntam os petistas com mando e força, a partir de Gleisi Hoffmann, a poderosa presidente do PT, que pregam conter aumentos de combustíveis para acarinhar as massas. Defendem, assim, medidas que consigam minorar as aflições dos consumidores. É o que se chama de populismo. Haddad ganhou, por enquanto. Lula lhe dá apoio.

Olhar cismado da política

Os guerreiros da política esperam as ordens de seus comandantes: presidentes das casas congressuais, líderes partidários, líderes governamentais e das oposições, comandantes de ministérios. Estão cismados. Voltam os olhos para os passos de Luiz Inácio. Vai entregar cargos de segundo escalão? Vai cumprir o acordo com as bancadas que lhe garantiram o assento presidencial? O semestre legislativo recomeça sob uma sombra de interrogações e dúvidas. Haverá ainda um bom tempo até se chegar aos 100 dias de governo, prazo tradicionalmente concedido ao mandatário-mor para dar conta do retrato da administração. Teremos mais 30 dias.

Reforma tributária?

Será a reforma mais urgente, com possibilidade de acender os interesses dos grupos parlamentares. Por via das dúvidas, consulto o especialista Luiz Carlos Hauly, ex-deputado e mais arguto consultor sobre matéria de tributos, que me diz: "A Câmara está tentando assumir novamente o protagonismo da Reforma Tributária com a criação de um Grupo de Trabalho - GT, que terá como relator o Agnaldo Ribeiro, relator da PEC 45, que foi arquivada pelo Lira e que foi também relator da Comissão Mista, cujo texto foi acolhido em parte pelo relator da PEC 110, Roberto Rocha. Meu foco está no protagonismo do Senado com a PEC 110 que está pronta para ser votada na CCJ. E é a que conta com maior apoio no congresso e nos setores produtivos".

A visão de Appy

O secretário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, arremata em o Jornal da Globo: "Quando a economia cresce, todo mundo ganha. Ganham os cidadãos, porque aumenta o poder de compra das pessoas, ganham as empresas, porque quando elas crescem mais, elas têm mais rentabilidade, e ganha o próprio governo, porque, quando a economia cresce mais, o governo arrecada mais".

As oposições

Estão dispersas e à procura de um comandante geral. O perfil de Bolsonaro é magro para entrar nesse figurino. Faltam-lhe densidade, qualidade, conteúdo, E mais, as características de liderança abrigam, ainda, os valores do bom senso, do equilíbrio, de grandeza cívica. Jair é sinônimo de desastrado, desembestado, irreverente, mal-educado, destrambelhado. A ele faltaria uma visão de país. Só com meia dúzia de adjetivos e porradas expressivas, ele não conseguiria o respeito e a credibilidade que liderança forte requer.

Figuras nevrálgicas

O governo, por sua vez, exibe em sua galeria figuras que começam a ser alvo de bombardeios midiáticos, dentre os quais, alguns ganham destaque: André Ceciliano, nomeado secretário de Relações Institucionais, acusado no escândalo das rachadinhas, quando era deputado estadual no RJ; o ministro Juscelino Filho (União-MA), das Comunicações, acusado de fazer uso irregular do fundo eleitoral e de usar emendas do Orçamento em benefício próprio em 2022, quando era deputado Federal; e ainda acusado de usar avião da FAB para ver corrida de cavalo de raça em SP. A ministra do Turismo, Daniela Carneiro, gastou mais de R$ 1 milhão com gráficas que não têm serviço de impressão nos endereços cadastrados; e foi acusada de receber apoio da milícia do Rio de Janeiro durante sua campanha eleitoral. Anoto o que a imprensa levanta: "Mais da metade dos ministros de Lula tiveram problemas na Justiça".

Judiciário na encruzilhada

Com o Legislativo cismado, o Executivo em meio a atritos sobre caminhos a seguir, para onde vai o Judiciário? A pergunta ganha sentido ante a montanha de processos que batem na Corte, envolvendo os vândalos da tragédia por eles cometida em 8 de janeiro passado? O Judiciário parece tocar uma nota só, a que se ouviu por ocasião da tentativa de golpe. O STF tem ganho a cara de uma delegacia de polícia, um centro de aglutinação de amotinados e criminosos. Está entre a cruz e a caldeirinha: o que o Supremo deve fazer, qual a rota a seguir? Os ministros respondem: defender a letra constitucional. Ora, mas os seus canais parecem entupidos com tanta demanda na área criminal. Que falem sobre o tema os especialistas.

Tarcísio

Prestem atenção ao governador Tarcísio de Freitas. Sua estrela começa a ser vista nos céus.

PSDB em frangalhos

Pergunta para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso: "qual a melhor saída para juntar os cacos do seu partido? O que os tucanos devem fazer para tentar salvar os poucos que ainda voam na floresta?"

Boulos

Do Instituto Paraná Pesquisas: Derrotado na eleição municipal de São Paulo em 2020, quando perdeu o segundo turno para Bruno Covas (PSDB), o deputado Federal Guilherme Boulos (PSOL-SP) aparece bem colocado para a disputa do Executivo municipal. No primeiro cenário, Boulos aparece com 26,3% da preferência, à frente do apresentador José Luiz Datena (PSC, 24,3%), o ex-governador Rodrigo Garcia (PSDB, 8,5%), o atual prefeito, Ricardo Nunes (MDB, 7,9%), os deputados Federais Ricardo Salles (PL, 4,8%), Tabata Amaral (PSB, 3,9%) e Kim Kataguiri (União Brasil, 3,3) e o ex-deputado Vinicius Poit (Novo, 1,6%).

Onde está seu pai

Fecho a coluna com Ariano Suassuna, um pilar da cultura nordestina.

Freud disse uma coisa muito boa sobre o cômico. Ele disse que o cômico é a revelação do obsceno por baixo do simbólico, sendo o simbólico mostrado por palavras de aparência inocente. Repare como isso é curioso. Vou contar uma pequena história nordestina e brasileira para vocês verem o exemplo típico na teoria de Freud. O pessoal conta que, numa feira do sertão, no Nordeste, estava um profeta que ganhava a vida profetizando as coisas dos outros, a vida dos outros. Aí chegou um sujeito implicante e disse "Isso aí não é verdade não, isso é charlatanismo." Ele ficou indignado, né, era o meio de vida dele. "Não senhor, não é charlatanismo não, isso é verdade. Você quer ver eu provar que é verdade? Você duvida que eu lhe diga onde está o seu pai neste momento?" Aí o camarada disse: "Como é, rapaz, você vai dizer onde é que está o meu pai agora?" "É, vou dizer." Ele falou: "Tá, se você disser, eu acredito. Onde é que tá o meu pai?" Aí o profeta se concentrou assim e proclamou: "Seu pai está num bar em Campina Grande tomando cerveja." Aí o camarada diz: "Rapaz, você quebrou a cara. Eu aceitei de propósito. Meu pai morreu há 12 anos atrás." O profeta arrematou: "Quem morreu foi o marido de sua mãe. Seu pai está lá."

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Colunista

Gaudêncio Torquato jornalista, consultor de marketing institucional e político, consultor de comunicação organizacional, doutor, livre-docente e professor titular da Universidade de São Paulo e diretor-presidente da GT Marketing e Comunicação.