Abro a coluna com Tebet.
O besourão
Abro a coluna com uma historinha que me foi contada pelo ex-senador Ramez Tebet, saudoso amigo.
Por ocasião da criação do Estado do MS, em 1979, a população de Campo Grande ficava assombrada com a caravana dos 17 grandes carrões pretos dos deputados estaduais que paravam diante da Assembleia Legislativa. Os carros ganharam logo o nome de "besourão" e, ao passarem pelas ruas, as pessoas logo faziam o sinal da cruz, na tentativa de afastar o medo daqueles carros que mais pareciam transporte de defunto. Ninguém se atrevia a andar num carro daqueles. Até que um dia, ao comparecer ao velório de um correligionário, numa cidade do interior, dirigindo um desses carros, o então deputado Ramez Tebet teve que atender ao pedido da família do defunto. Queriam que o defunto fosse levado naquele carro. Nessa hora, não dá para negar. E lá se vai o deputado carregando o caixão de defunto em seu "besourão". A história se espalhou por todo o Estado. Assim a fama negativa do carrão preto foi dissipada. O "besourão" passou a ser visto com outros olhos. A boa fama só veio depois de ter conduzido um defunto.
Crises se imbricam
Uma crise entrando na outra. É assim que se desenha a paisagem dos últimos dias. Convivemos com a maior crise sanitária dos últimos 100 anos; sofremos com a crise na economia, que não dá sinais de grande alento; padecemos de uma crise crônica na política, que continua a operar os velhos métodos, e reabre o que já se chama de "tratoraço", nos moldes dos tempos dos "anões do orçamento"; e, o que não é novidade, a crise hídrica, com a carência de chuva em algumas regiões e que, segundo palavras do próprio presidente da República, vai dar "de cabeça" na população. Sob essa teia emaranhada espraia-se a crise social, com o empobrecimento de milhões de habitantes do meio-baixo da pirâmide, a classe média C.
O "tratoraço"
Esse "orçamento secreto" está assim carimbado porque a enxurrada de emendas para aquisição de tratores, a pedido de parlamentares, foi feita de modo escondido, como se houvesse a intenção de não dar muito na vista. Mas um repórter do Estadão teve acesso à papelada. O caso está sendo considerado "muito grave". Sob essa ênfase, já corre uma lista de pedidos de uma CPI. O que se mostra nesse "adjutório" é o dedo do superfaturamento, chegando a 259% por cento no caso da compra de um trator, duas vezes e meia, segundo se mostra. O caldeirão ameaça ferver com a água em ebulição jorrada da CPI da Covid-19.
O Centrão aliviando
Mas o Centrão tem o condão de aliviar as tensões. Afinal ele entrou de sola na Codevasf – Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco -, jogando seus quadros na estrutura da companhia e, desse modo, formando uma barreira sólida para aguentar o tranco que virá da base oposicionista do governo. Será a hora para Arthur Lira, presidente da Câmara, usar sua "lábia de convencimento" com a ajuda da caneta governamental, e aliviar as tensões. Vai ser difícil puxar o tapete do governo. Mas a barulheira que esse assunto vai provocar deve compor a argamassa eleitoral de 2022, que já começa a se formar. O cordão das crises, puxado do rolo, pode gerar um efeito dominó. Uma pedra batendo na outra e produzindo uma fileira de quedas. Essa hipótese entra no cenário, mas, como já se acentuou, poderá dar em nada por obra e graça do Centrão.
E a CPI da Covid?
O trio que comanda a CPI – Omar Aziz, presidente, Randolfe Rodrigues, vice, e Renan Calheiros, relator, estão afinados e dispostos a gerar resultados. Dizem isso quase todos os dias. Assim, é pouco crível apostar numa pizza com muitos sabores. Se as chamadas "provas cabais" de responsabilidade pela má gestão da pandemia foram evidentes, claras e de contundência inquestionável, os resultados se dariam no campo da punição. Quem e como? Mais uma vez, acentuo, a margem para um pedido de impeachment do presidente é muito estreita. A elevação do clima ambiental dará um nó cego na arena institucional. O Imponderável estará de olhos abertos.
Lula faz campanha
Este analista não teme ser repetitivo: na régua de 100 centímetros, a possibilidade de Luiz Inácio ser candidato está entre 10% e 15%. Lula está fazendo articulações, abraçando todos os ombros do arco ideológico, porque entende que uma frente ampla de oposição será vital para tirar o assento presidencial de Bolsonaro. Nesse sentido, defende a polarização. Mas uma aguerrida luta entre a direita radical contra pedaços do centro, da esquerda e até um pedacito do centro-direita. E por que Lula não seria candidato? Porque seria levado novamente ao banco dos réus por causa dos grandes lances que ditaram os eventos de corrupção no Brasil nos últimos anos. Lula ainda não se livrou da balança da Justiça. E, por volta da campanha, seu caso será novamente elevado à mídia massiva. O calvário será remontado. Os 10 a 15% de possibilidade de Lula vir a ser candidato apostam na hipótese: ou tudo ou nada. Se ganhar, voltará aos braços do povo; se perder, se enfia no baú das velhas lembranças. Sob as alegrias da vida privada.
Mulher
Este analista também se inclina a favor de outra hipótese: as chapas para a presidência deverão intensificar seus esforços na busca de uma mulher como candidata à vice-presidência.
Rodrigo Pacheco
Olhem para este nome. Presidente do Senado, jovem, moderado, boa fluência, de Minas Gerais, 2º maior colégio eleitoral do país, encarnaria muito bem o papel de candidato do lema: in media, virtus. A virtude está no meio. Entrave: o DEM, que perde quadros. Mas ele poderia não resistir ao imã de outro partido competitivo.
Imunidade de rebanho
Atentem para este conceito: estará no centro da polêmica nos próximos tempos. Defender a imunidade de rebanho é querer que o vírus contamine rapidamente a população. Nesse caso, conviria ir contra a ciência.
Mirabolância
O PDT, Carlos Lupi e Ciro Gomes entraram na "carruagem do espetáculo" do marqueteiro João Santana, o chamado "mago da mirabolância". Vídeos espetaculares, imagens de comoção, adoçamento de perfis, fantasias, hosanas. O Brasil deixou para trás esses enredos miraculosos. A conferir.
Rejeição
João Doria vai ter de reaprender lições de simplicidade, modéstia, harmonia, humildade, falas com menor grau de autoelogio. É uma tarefa que consumiu a vida de alguns protagonistas. O problema é o tempo até a campanha de 2022.
Passando no exame
Ouço que o governador do Maranhão, Flávio Dino, PC do B, passou na primeira fase do teste "gestão da pandemia". Ganha cacife para entrar como vice numa chapa presidencial. Talvez vindo para o PSB.
Fábio Faria
Fala-se que é candidato a senador no RN. O ministro das Comunicações está no PSD de Kassab. Mas também se fala na candidatura de Robinson Faria, seu pai, a deputado Federal. Aí fica difícil. Um senador e um deputado? Um dos dois terá de fazer um sacrifício. Tudo vai depender do chapão bolsonarista a se formar para a campanha de 2022.
Fátima
A governadora do RN, Fátima Bezerra, irá para a reeleição. Diz-se que não vai bem na avaliação popular. Muito mal. Mas, e se a economia despencar de vez, o governo Federal (Bolsonaro) seja execrado, será que ela, com a caneta (mesmo sem tinta), não teria chance? Mais, se Lula for candidato? O Imponderável estará de olhos abertos.
Castro
A política é uma Caixa de Pandora. Esconde surpresas. Esse Claudio Castro, vice que assumiu o cargo de governador com o impeachment de Wilson Witzel, vai se candidatar ao governo do Rio de Janeiro. Desconhecido e desprestigiado. Pois não é que a tragédia de Jacarezinho alavancou seu nome? No Rio, o tiro da polícia dá votos a favor. E assim caminha a Humanidade.
Leite
Será difícil sustentar no PSDB o governador do Rio Grande do Sul, o jovem Eduardo Leite. Tem convites de outros partidos. E é um perfil em ascensão.
Alckmin
O ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, quadro histórico do PSDB, poderá sair do partido. Tem boas chances para o Senado e, ainda, para o próprio governo. Geraldo é algodão entre vidros.
Zema
Faz um bom governo em MG. Candidato à reeleição. Mas pode ter um forte candidato contra ele: Alexandre Kalil, prefeito de BH. Muito bem avaliado. Atenção: Kalil pode ser uma opção para a presidência em 2022.
Fecho com Jesus de Nazaré.
I.N.R.I. - Iesus Nazarenus Rex Iudaeorum
Conta Leonardo Mota que o mestre Henrique era reputado marceneiro nos sertões de Sergipe. Sua especialidade estava nas camas francesas à Luís Quinze. Quando o freguês achava que o leito era baixo, recebia a explicação de que a cama era francesa, mas era à Luís Quatorze; se queixava da excessiva altura, ficava sabendo que aquilo era cama francesa à Luís Dezesseis... O mestre Henrique pôs toda a sua ciência no Cruzeiro do patamar da igreja de Aquidabã. No topo do sagrado madeiro, o vigário da freguesia fizera o mestre Henrique colocar uma tabuinha com as letras I.N.R.I., iniciais de Jesus Nazareno Rei dos Judeus, a irônica inscrição latina de que a ruindade de Pilatos se lembrara na ignominiosa sentença de morte do filho de Deus. Decorrido algum tempo, um sertanejo sergipano, intrigado com a significação daquelas quatro letras, perguntou a um seu conhecido:
- Que é que quererá dizer aquele negócio de INRI, que tem escrito em riba do Cruzeiro?
- Você não sabe, não? Ali falta é o Q-U-E. Esse QUE não cabeu na tabuinha: aquilo é a assinatura de quem fez, que foi o mestre INRIque...