Abro a coluna com um "causo" que me foi enviado do Paraná. Com minhas escusas se alguma leitora ou algum leitor achar a historinha politicamente incorreta. Como estamos em ano eleitoral, cai bem.
Promessas de campanha
Candidatos de duas famílias disputavam a prefeitura de pequena cidade. Final de campanha. Combinou-se que os dois candidatos e seus familiares teriam de ir ao mesmo palanque. Discursou, primeiro, o candidato com 70% de preferência dos votos:
- Povo da minha amada terra, povo ordeiro, trabalhador, religioso e cumpridor de suas obrigações. Eleito, irei resolver o problema de falta de água e de coleta de esgoto. Farei das nossas escolas as melhores da região, educação em tempo integral. Vou construir uma escola técnica do município...
E arrematou:
- E tem mais, meus amigos, ordeiros, religiosos e cumpridores de seus deveres morais, vocês não devem votar no meu adversário. Ele não respeita nossa gente, nossas famílias, nossos costumes! Ele desrespeita nossa igreja. Ele nem se dá ao respeito. Vocês não devem votar nele. Porque ele tem duas mulheres.
O adversário, com 20% de intenção de voto, quase enfartou quando viu a mulher, ao seu lado, cair no palanque. Ela não aguentara ouvir a denúncia do adversário de que o marido tinha uma amante. A desordem ganhou o palanque. A multidão aplaudia o candidato favorito e vaiava o adversário. Cabos eleitorais começaram a se engalfinhar. Passado o susto, com muita dificuldade, o estonteado candidato acusado de ter duas mulheres começa seu discurso, depois de constatar que a esposa estava melhor:
- Meu amado povo, de bons costumes e moral ilibada, religioso e cumpridor de seus deveres morais, éticos e religiosos. Quero dizer aos senhores e senhoras aqui presentes, que, se agraciado com seus votos me tornar o prefeito desta cidade, farei uma mudança de verdade. Não só resolverei o problema da falta de água, como farei também o tratamento de todo o esgoto do município, construirei uma escola técnica e um novo hospital!
A massa caçoava do coitado e de sua mulher. Foi em frente:
- Vou melhorar o salário dos professores, a merenda das crianças e ainda vou instituir o Bolsa Cidadão. Agora, prestem bem atenção. Se os amigos acharem que não podem votar em mim porque tenho duas mulheres, votem no meu adversário. Mas saibam que a mulher dele tem dois maridos.
A galera veio abaixo. O pau comeu. Brigalhada geral. Urnas abertas. O candidato chamado de corno perdeu feio para o adúltero.
Tomando o pulso
Cada semana, esta coluna tenta tomar o pulso do país: os índices do clima político, a temperatura social, os graus da governabilidade, coisas que dependem, frequentemente, dos humores do mandatário-mor. Pois bem. A esfera política se apresenta cercada de dúvidas. Particularmente no que se refere à construção e consolidação da base governista, a escalada que começa em direção à nova presidência da Câmara, as probabilidades que cercam a reforma tributária, ainda este ano, os números que recuam e avançam mostrando que a pandemia não está domada. Portanto, estamos ainda sem rumo e prumo. Para complicar, o ponto morto que o presidente Bolsonaro colocou em sua engrenagem expressiva voltou à marcha de corrida. E o destempero voltou com força com a declaração de que gostaria de "encher de porrada" a boca de um repórter de O Globo que lhe fizera uma pergunta sobre recursos destinados à sua mulher.
A pandemia ainda dá o tom
Apesar de certo alívio registrado nas áreas produtivas do país, em início de reabertura de negócios, o clima geral ainda é fruto da barreira imposta pela pandemia. Teme-se que os ainda não contaminados, de maneira gradual e sucessiva, sejam apanhados pela Covid-19, que já começa a dar sinais de poder reinfectar uma pessoa já infectada e curada. Portanto, muito cuidado com o andor. O alívio que se espraia por Estados e municípios pode dar lugar à angústia. Cuidado.
Esfera política
Começo com aplausos ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que surpreende com o bom senso externado. Virou guia eficiente nesse momento de tantos desvarios. Decidiu bloquear qualquer projeto voltado para aumento dos planos de saúde, que almejavam aumentos de mais de 20%. Seria mais um peso no bolso da já empobrecida classe média. Rodrigo merece também reconhecimento pela maneira como segura os passos de candidatos à presidência da Casa, a partir de fevereiro do próximo ano. Arthur Lira anda rápido, mas pode queimar suas chances. Seria o nome ideal para comandar uma Câmara tão dividida?
Estados quebrados
Os Estados estão de pires na mão. Por isso, o dilema é o de esperar por uma reforma tributária que lhes dê alívio, minorando a calamidade financeira. SP, MG, RS e PR projetam rombo de cerca de 40 bilhões, um dado ainda muito preliminar. Suspensão de reajustes a servidores, eliminação de empresas, redução de incentivos fiscais e elevação de impostos estão na pauta de 2021. A economia ainda estará em compasso de espera, sendo um imenso desafio equilibrar receitas e despesas.
Índice Hauly
Na torcida pelo desfecho da reforma tributária, vejo o meu amigo Luís Carlos Hauly, em torno do qual giram os seguintes índices: 316 palestras; mais de 700 reuniões técnicas; 77.700 páginas no Google "Hauly Tributária" e no Hauly 245 mil páginas. Um craque.
Reeleição nas duas Casas?
Davi Alcolumbre sonha de olhos acordados com decisão do STF que permita concorrer à reeleição no Senado. Já não é caso de Rodrigo Maia, que já manifestou não pleitear mudança regimental. Ocorre que Luiz Fux, que toma posse como presidente do Supremo em 10 de setembro, não gostaria que esse abacaxi caísse em suas mãos. Gostaria que o tema seja decidido pelo STF ainda no mandato de Dias Toffoli, que se encerra daqui a pouco mais de duas semanas. Há quem defenda ser essa uma questão "interna corporis", a ser resolvida, portanto, pelos próprios corpos parlamentares do Senado e Câmara. E há quem defenda que a reeleição poderia valer para o Senado, não para a Câmara, eis que o mandato de senador é de oito anos.
Bolha, bolha, bolha
O alerta vem de grandes investidores. Calma lá com essa euforia nas Bolsas. Warren Buffett, um dos maiores, está se voltando para o ouro. O presidente do Bank of America no Brasil, Eduardo Alcalay, teme que os investidores mais afoitos sejam "machucados".
A campanha eleitoral I
A essa altura, tem muito candidato a prefeito querendo descobrir como fazer sua campanha. Que discurso, o que querem ouvir os eleitores, que meios usar, qual o timing para avançar etc. Pequenos conselhos: 1. Não prometer coisas que não possa fazer; 2. Escolher muito bem os eixos da identidade que precisa ser reconhecida pelo eleitor; 3. Considerar que o discurso será feito em ambiente e audiências ainda tocadas e sob o medo da pandemia; 4. Conhecer muito bem as demandas de setores, categorias profissionais e classes.
A campanha eleitoral II
5. Quando houver condições visitar bairros e regiões, sempre acompanhados de pessoas e candidatos a vereador que conheçam o bairro como a palma de sua mão; 6. Ter muito cuidado com abraços, beijos e movimentos que possam gerar contaminação; 7. Sempre que possível, fazer-se acompanhar por profissionais de saúde; 8. Deixar com o eleitor um programa de trabalho objetivo, claro, com ideias centrais fortes, e não em grande número; 9. Aproveitar bem o dia, acordar cedo, ver a agenda, reunir-se com a equipe, distribuir tarefas, conversar com candidatos a vereador, mapear lideranças e entidades com força nas regiões e gastar muita sola se sapato; 10. Usar de maneira interativa as redes sociais, evitando autoelogios.
Bolsonaro vai e vem
Pergunta recorrente: a melhoria na avaliação da imagem de Bolsonaro veio para ficar? A que se deve? Vamos à análise. O gráfico que aponta a avaliação de um perfil obedece a estes fluxos: 1. Lançamento do nome – índice alto, eis que passa a ganhar visibilidade logo após a eleição; 2. Crescimento – com a elevação gradual da visibilidade – meta que ocorre durante cerca de seis meses; 3. Consolidação, meta a ser alcançada entre segundo e terceiro anos de governo; 4. Clímax – quando o governo alcança seus melhores índices de avaliação – quando o governo vai chegando ao fim e tem um vasto e denso programa de obras e ações a mostrar e 5. Declínio – ocorre para muitos após o mandato, mas, para outros, em momentos tensos do governo. Na minha percepção, a avaliação de Bolsonaro obedece à ciclotimia. Vai e vem.
Auxílio emergencial
O auxílio emergencial é o fator mais forte para elevação da taxa positiva de Bolsonaro, principalmente na região Nordeste, onde recebeu menor número de votos na campanha de 2018. Lula, a essa altura, perde grandes contingentes eleitorais na região, pois o auxílio emergencial, futuro Renda Brasil, mesmo se baixar hoje para R$ 300,00, canibalizará o Bolsa Família. Ou seja, o programa de Bolsonaro comerá o de Lula.
Estilo popular
Por outro lado, Bolsonaro, a cada dia, veste mais a roupa do brasileiro comum. Cai nos braços do povo, põe chapéu de couro, monta em cavalo, abraça crianças, beija bebês e as toma no colo, come o que lhe dão. Ora, torna-se uma pessoa como Joaquim, Pedro, João, Mané. E sob o grito de mito, mito, mito, vai puxando a multidão para perto, mexendo com o psiquismo das massas, ativando reflexos condicionados, avolumando os contatos grupais e interpessoais. O estilo é o homem, como ensina a teoria da mistificação das massas. Abriga, ainda, uma linguagem estrambótica, agressiva, que cai bem no sistema cognitivo do eleitorado, que se identifica com ele no verbo do carão, da agressão, da porrada. Particularmente as margens. Já setores do meio da pirâmide tendem a criticá-lo.
A economia
A respeito da continuidade das avaliações positivas, costumo lembrar sempre sobre o Produto Nacional Bruto da Felicidade, o PNBF, que resulta de um ar mais tranquilo nas margens e no centro da sociedade, menos violência nas grandes e médias cidades e o bolso contendo grana suficiente para abastecer a geladeira e "encher o bucho". Tudo isso dependerá da economia, a locomotiva do Trem Brasil. As perguntas que se fazem a Bolsonaro sobre recursos que teriam sido fornecidos à primeira-dama Michele continuarão a promover querelas entre alas. E troca de disparos nas redes sociais. Mas os danos poderão ser minorados pelos efeitos eventualmente positivos da economia. A conferir.
E a pandemia?
Se a evolução da pandemia entrar em curva descendente e, mais adiante, se a vacina contra a Covid 19 chegar no fim do ano ou no início de 2021, com vacinação em massa da população, a gestão da crise, considerada desastrosa, acabará sendo canibalizada pelo fato mais recente, a vacinação. Uso muito o termo canibalização para significar um processo de amortecimento/enfraquecimento de uma situação anterior (negativa) pelo fato mais recente (positivo). O aplauso de hoje acaba fazendo esquecer a vaia de ontem. Só os setores mais racionais – classes médias – é que sabem distinguir o certo do errado, o bem do mal, a ruindade da bondade.