Porandubas Políticas

Porandubas nº 625

O comportamento mercurial do presidente Bolsonaro, segundo Gaudêncio Torquato, sugere tensões permanentes, ainda mais depois da demissão de Joaquim Levy.

19/6/2019

Abro a Coluna com um "causo" de Macaíba/RN.

5 minutos de silêncio

O pedido do minuto de silêncio faz parte da liturgia do poder. Surfam nessa onda políticos de todos os espectros. Até vereador faz uso do momento. Este caso ocorreu na Vila São José, bairro de Macaíba/RN. O ex-vereador e candidato Moacir Gomes inicia a oração rogando aos assistentes do comício um minuto de silêncio pelo falecimento de um morador. Seu assessor e cabo eleitoral, ao lado, pensando no tamanho da família do falecido, sopra no ouvido de Moacir:

- Um minuto é pouco. Peça cinco. Tem muito voto lá!

(Historinha de Valério Mesquita)

A demissão de Levy

Joaquim Levy foi surpreendido com a observação de Bolsonaro: "já estou com ele por aqui. Falei para ele: Demita esse cara na segunda-feira ou demito você sem passar pelo Paulo Guedes". Com esta mal educada declaração, o presidente acabou dispensando a colaboração de um grande técnico. Levy estava num casamento na região serrana do RJ, de difícil comunicação. Voltou ao Rio e, no domingo, escreveu a carta de demissão combinada com Paulo Guedes. Ex-ministro de Dilma, tinha dificuldade em abrir "a caixa preta" do BNDES, mais exatamente, os recursos do banco destinados a governos amigos do PT, em Cuba, na Venezuela e na África.

De crise em crise

Na verdade, o Joaquim Levy, sabedor das promessas de campanha de Bolsonaro, dentre elas a abertura da "caixa preta do BNDES", não deveria ter aceitado o convite para presidir o banco. Só aceitou por insistência de Guedes. O fato é que foi humilhado publicamente pelo presidente, que não mede palavras e gestos. Guedes, por sua vez, fez coro a Bolsonaro, endossando críticas. O que pode acontecer? Mais dificuldades em acessar nomes respeitáveis do mercado e convidá-los para integrar o governo. O fato é que as crises na administração bolsonariana estão se sucedendo. E pelo andar da carruagem, veremos mais algumas. O comportamento mercurial do presidente sugere tensões permanentes.

General Ramos

O general Luiz Eduardo Ramos Baptista Pereira, um dos maiores amigos de Bolsonaro nas Forças Armadas, foi direto: "soldado não escolhe missão; ele cumpre". E assim deixa o maior comando militar do país, o do Sudeste, para integrar o governo. Um general quatro estrelas da ativa. Poderoso. Ministro da Secretaria de Governo, que, entre outras coisas, será responsável pela articulação política. Vai dividir tarefas com Onyx Lorenzoni. Há muita curiosidade em saber como o general desempenhará seu papel. Criará ciúmes? Terá palavra mais forte do que a do general Heleno? P. S. A demissão do general Santos Cruz deixou o Congresso de boca aberta. Mas ante a força do perfil do substituto, qualquer reação negativa - se houve - foi logo abafada.

Moro sob controle

O ministro Sérgio Moro está sob total controle do presidente Jair. Mais concretamente: se tinha alguma pretensão em entrar na liça presidencial de 2022, arrefeceu o ânimo. O affaire do vazamento de suas conversas com o procurador Deltan Dallagnol o torna prisioneiro das circunstâncias. Bolsonaro vai segurá-lo, sendo bem provável sua nomeação para o STF no lugar de Celso de Mello em novembro do próximo ano. (Mas o Senado o aprovaria? Hoje, ao que se comenta, não).

Ícone das massas

A única condição para deixá-lo com o manto de presidenciável seria uma saída do governo, situação que pode se agravar com a divulgação de conversas comprometedoras. Moro, porém, ainda é o ícone das massas. Por essa razão, nada se descarta da planilha de hipóteses sobre seus caminhos e curvas. Pode, sim, vir a ser candidato a presidente, até enfrentando Bolsonaro.

Fakes e versões

Lorotas? Hacker russo, bilionário russo, pagamento em bitcoins; Gleen Greenwald, articulador das manobras hackeado; disseminação de hashtags, compra do mandato de Jean Wyllys para renunciar e dar lugar ao deputado David Miranda (PSOL) e daí por diante - quanta massa disforme. O russo da história seria Pavel Durov, 35 anos, criador do Telegram, que só se veste de preto e muda de casa com frequência com temor do manda-chuvas do Kremlin. Mais inputs: ao lado do irmão Nikolai, ele desenvolveu a plataforma para poderem conversar sem risco de serem espionados pelo governo de seu país. A ideia surgiu quando ainda eram donos da maior rede social da Rússia, a Vkontakte (VK), criada em 2006. P. S. Um alerta sobre estas informações.

Juro dizer a verdade I

"Juro dizer a verdade, nada mais que a verdade. O Brasil é a terra da ética, do respeito aos valores morais que dignificam o homem e do cumprimento exemplar das leis. O caráter de seu povo é reto e imaculado, fruto de uma herança cultural profundamente alicerçada no civismo, na solidariedade, no culto às tradições, na religiosidade, no respeito aos mais velhos, no carinho e proteção às crianças e na repartição justa dos bens produzidos. Neste país, atingir a honra de um cidadão equivale a ferir a alma da pátria. Aqui, preserva-se e cumpre-se o abençoado lema "todos por um e um por todos"."

Juro dizer a verdade II

"Os nossos políticos são exemplo de civilidade, magnanimidade, correção e desinteresse pessoal. Graças a eles, o sistema federativo vive em harmonia e equilíbrio. Os recursos se distribuem igualitariamente, provendo as necessidades fundamentais da população, dentro de um rigoroso plano de prioridades. Os potenciais das regiões se somam e a racionalidade administrativa gera bolsões de riquezas, que se repartem pelas populações. O excedente é exportado e acarreta bilhões de divisas que, da mesma forma, são distribuídos pelas regiões exportadoras."

Cuidado

Cuidado, muito cuidado, com fraudes, versões e invencionices. Sob as asas de um tal pavão misterioso. Tempos de pós-mentiras.

Diálogos?

Afinal, os diálogos vazados entre Moro e Dallagnol foram editados, pinçados fora do contexto, ou são verdadeiros?

O papel do Congresso

Ante a escalada de "falas estabanadas" do presidente, demissões em série de ministros e desencontros na frente da articulação política, emerge o papel da Câmara e do Senado na construção de uma agenda própria, sem interferência do Executivo. Por isso, a Bolsa e o dólar estão praticamente no patamar da estabilidade. O mercado passou a acreditar na aprovação da reforma da Previdência, mesmo com os gols contra que o Executivo comete.

Estrela ascendente

Estrela ascendente no governo é o secretário Rogério Marinho, que toca a reforma da Previdência e o setor do Trabalho. Tem ótima articulação com os congressistas. Foi um deputado muito admirado pelos pares. Relator da reforma trabalhista, conhece bem o espírito parlamentar.

Economia devagar

A recuperação da economia caminha a passos de tartaruga. Até o momento o governo tateia na escuridão. Tem como foco a aprovação da reforma da Previdência. As medidas de estímulo ao consumo praticamente inexistem. Os programas sociais, como o Bolsa Família, ainda sustentam o humor das margens. A baixa inflação garante certa harmonia. Mas dinheiro no bolso continua escasso. Mais um tempinho sem folga de recursos e a paciência começa a esgotar.

Odebrecht

Quem diria, hein? O ex-portentoso conglomerado empresarial Odebrecht abre o maior processo de recuperação judicial da história brasileira. Na lista de credores, mais de 188 escritórios de advocacia. As dívidas somam cerca de R$ 83 bilhões. P.S. A recuperação da Oi, em 2016, exibia o débito de R$ 64 bilhões.

Gasparetto

Renato Gasparetto, experimentado executivo de comunicação e relações institucionais, com passagem por grandes grupos, deixa a Gerdau para assumir a vice-presidência de Relações Institucionais da Vivo/Telefônica. Gasparetto tem um histórico de peso na história da comunicação organizacional no país.

Montezano

Gustavo Montezano, engenheiro com mestrado em finanças, 38 anos, é o novo presidente do BNDES. Era o número dois da Secretaria Especial de Desestatização e Desinvestimento comandada pelo empresário Salim Mattar. E assim o processo de privatização será acelerado. O pai de Gustavo já trabalhou com Guedes. O mercado ganha mais um perfil qualificado na estrutura governamental.

PT vai à china

O governador do Piauí, o petista Wellington Dias, age como pragmático. Deixa de lado os xingamentos que acendem o discurso petista e decide ir à China por ocasião do evento em que o presidente Bolsonaro tentará atrair investidores, entre 5 e 9/8. Faz bem Wellington Dias ao não dar ouvidos à verborragia irada do petismo.

Armar o povo

No Rio Grande do Sul, Bolsonaro voltou a explicar a razão porque deseja ver a população armada: "para que tentações não passem na cabeça de governantes para assumir o poder de forma absoluta". Ou seja, sugestão para o povo armado combater os golpes. Como essa indicação entra no cenário do golpe de 1964? Ou não teria havido golpe? Os governantes da época não assumiram o poder de forma absoluta?

A arte da política

- Maomé levou o povo a acreditar que poderia atrair uma montanha. E que, do cume, faria preces a favor dos observantes da sua lei. O povo reuniu-se; Maomé chamou pela montanha, várias vezes; e como a montanha ficasse quieta, não se deu por vencido, e disse: "Se a montanha não quer vir ter com Maomé, Maomé irá ter com a montanha". Assim esses homens que prometeram grandes prodígios e falharam sem vergonha (porque nisso está a perfeição da audácia), passam por cima de tudo, dão meia-volta, e realizam o seu feito. (Ensaios - Fancis Bacon)

Teoria do herói

- Mais ou menos em toda parte, o herói reina e prospera. Como para confirmar as teses dos pensadores políticos, que lhe abrem alas desde a Antiguidade. Xenofonte já fazia a apologia do chefe e o elogio do herói. Daquele que impõe o respeito. Por sua ascendência. Por sua superioridade, perceptível até para o comum dos mortais. Em A Política, Aristóteles reconhece a situação excepcional do gênio. Para certo indivíduo supereminente que se impõe sem contestações como senhor absoluto. Como um "deus entre os homens".

O ditador

- Em seus Discursos sobre Tito Lívio, Maquiavel também admite o homem excepcional levado por circunstâncias excepcionais. É o "Legislador" - ou "Fundador" - o homem só, que estabelece um regime. Como Licurgo ou Solon. É o "ditador", investido, como em Roma, de uma magistratura legal e temporária. Quando o Estado deve "defender-se contra acontecimentos extraordinários".

Rousseau acompanha bem de perto Maquiavel. Também ele tolera o "homem extraordinário" em dois casos excepcionais: o "Legislador" para fundar o Estado e lhe fornecer suas leis, o "Ditador" para garantir sua sobrevivência. (O Estado-Espetáculo - Roger-Gérard Scwartzenberg)

 

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Colunista

Gaudêncio Torquato jornalista, consultor de marketing institucional e político, consultor de comunicação organizacional, doutor, livre-docente e professor titular da Universidade de São Paulo e diretor-presidente da GT Marketing e Comunicação.