Porandubas Políticas

Porandubas nº 542

Um passeio pela organização da sociedade.

16/8/2017

Abro a coluna com o padre Aneiko.

Quer ver?

Padre Aneiko, deputado estadual pelo PDC, vinha do Paraguai. Na fronteira de Foz do Iguaçu, encontrou-se com duas amigas, que lhe pediram para passar com uns perfumes de contrabando. Arrumou no cinturão, embaixo da batina. Na Alfândega, o fiscal pergunta:

- Alguma mercadoria, padre?

-Não.

- E aí embaixo da batina?

- O que tem aqui embaixo é dessas duas moças. Quer ver?

O fiscal não quis.

Chutômetro I

Tem sido comum, nesses tempos esfumaçados, a sinalização sobre o amanhã. Com farta distribuição de chutes. A Consultoria Eurasia se apresenta como campeã de projeções furadas, fato que o Drive Premium, de Fernando Rodrigues, muito bem registrou na edição noturna de segunda-feira. Em maio, projetou em 70% as chances de Michel Temer ser derrubado. Em 13 de agosto, a probabilidade de permanecer passou para os 70%.

Chutômetro II

Nessa linha de adivinhação, aponta João Doria com mais chances de vir a ser o candidato tucano na eleição presidencial de 2018. Ora, João até pode ser o candidato, mas o governador Alckmin tem a maior força no PSDB. P.S. Pelo que se sabe, a Eurasia não possui estrutura em Brasília. Mas frequenta com assiduidade os espaços midiáticos.

Os motores sociais

Nosso roteiro, hoje, é de um passeio pela organização da sociedade.

O clamor das ruas

A última década incrementou a organicidade social. A miríade de entidades – associações de todos os tipos, sindicatos, federações, confederações, clubes e movimentos – passou a agir como tuba de ressonância social, expressando demandas, expectativas, anseios, enfim, o pensamento de classes, grupos, setores, categorias profissionais. Uma alta dose de autonomia orienta ações e movimentações do conglomerado organizativo. Vale lembrar que o Brasil contabiliza, hoje, mais de 500 mil Organizações Não Governamentais.

Sindicalismo

O sindicalismo se expandiu na esteira da defesa de interesses de trabalhadores e empregadores de novos nichos produtivos. São 16.491 sindicatos, dos quais 11.257 de trabalhadores e cerca de 5 mil sindicatos de empregadores. O Ministério do Trabalho e Emprego facilitou a explosão do sindicalismo, havendo, inclusive, suspeição sobre a emissão de cartas sindicais pela Secretaria de Relações do Trabalho daquele Ministério. O corporativismo, como se pode aduzir, ganhou volume. Federações e Confederações também se expandiram dando vazão ao sistema confederativo. Por trás de tudo, interesses financeiros. Centrais sindicais como exemplo.

Bancários e metalúrgicos

Continuam a compor a linha de frente das movimentações de trabalhadores, mas seu poder arrefece na esteira da organicidade social, onde outros grupamentos tomam pé. CUT e Força Sindical estão na frente das movimentações, a primeira exibindo o clássico discurso que faz liga com o PT e a segunda central, sob o comando de Paulinho, puxando o cordão da manutenção de benesses históricas.

Comerciários

O universo do comércio tem sua representação trabalhadora por meio da UGT, comandada por Ricardo Patah, que tem avolumado a Central a ponto de ela se posicionar na linha de frente de fortes representações. Patah exerce bom diálogo com entidades patronais do comércio.

Associativismo

Outra vertente da organicidade social se fez ver por meio da multiplicação de associações, estas com finalidade política e institucional, eis que não integram o sistema confederativo. As associações desenvolvem intensa articulação política junto aos Poderes constituídos, eis que suas pautas abrigam temas gerais. Muitos setores criam associações voltadas exclusivamente para a articulação política.

Direitos e cidadania

Desde a Constituição Cidadã de 1988, toma corpo a vertente de defesa dos Direitos Humanos, com foco principalmente na proteção e defesa das minorias (étnicas, raciais, de gênero, transgêneros, etc.). Parcela ponderável dessa agenda bateu nos tribunais, chegando à Suprema Corte, que tem decidido sobre matérias polêmicas, como as questões da união homoafetiva, cotas raciais, células-tronco, mensalão, proibição de financiamento privado de campanhas, prisão depois do julgamento em segunda instância.

OAB na vanguarda

A Ordem dos Advogados do Brasil tem exercido papel preponderante na defesa dos Direitos Humanos e da elevação da Cidadania. Sempre na vanguarda. No passado, sua ação era mais intensa, principalmente nos idos da redemocratização. Mas continua forte, a partir das campanhas que desfralda, como os recentes movimentos Combate à Corrupção e em prol da Reforma Política, sob a égide da seccional paulista da OAB.

Jornalistas

O meio jornalístico confere repercussão aos fatos sócio-políticos. Analistas, colunistas/comentaristas têm se engajado com fervor na cobertura do lamaçal que inunda o terreno da política, desde os tempos do mensalão. Ocorre que muitas análises abrigam forte viés ideológico, com jornalistas desempenhando o papel de guerreiros e militantes. Tem faltado bom senso na análise política e sobrado engajamento.

Igrejas

O forte eixo das igrejas/credos passou a abrigar protagonistas da política, a ponto de patrocinar a candidatura de participantes a comandos importantes, como a prefeitura do Rio de Janeiro, hoje dirigida por um membro da Igreja Universal. A bancada religiosa se expande. A religião entra forte no terreno da política. A competição entre credos sai dos grandes centros e chega aos fundões do território. A CNBB arrefeceu seu discurso político.

Militares

Os militares, mesmo recolhidos aos quartéis, acompanham com atenção a dinâmica da política. Vez ou outra, ouve-se uma voz militar em defesa da instituição democrática. Grande preocupação da caserna é com a carência de recursos que ameaça inviabilizar ações e programas das Forças Armadas. Em seus circuitos internos, os chefes militares sempre compartilham impressões sobre os rumos da política e do país.

Mulheres

As mulheres têm ganho suas batalhas por direitos iguais aos homens, constituindo assim gigantesco vetor de força. O gênero feminino tem alargado a fronteira dos direitos, sem dúvida. Por sua força, merecem um destaque no leque organizacional. As mulheres fazem crescer a participação em praticamente todas as áreas dos empreendimentos. No Congresso, infelizmente, sua presença ainda é muito pequena.

Profissionais liberais

Os profissionais liberais ocupam uma das mais fortes trincheiras nos espaços da pirâmide social, o do meio, onde estão as classes médias. Possuem voz e vez, assumindo o papel de contundentes porta-vozes da tuba de ressonância. Médicos, engenheiros, profissionais do universo da comunicação, comerciantes, integrantes dos círculos de negócios, enfim, quadros de praticamente toda a malha social do meio da sociedade se fazem representar por meio de suas entidades. Exercem papel privilegiado de observadores e críticos da paisagem político-social. Atentos à cena, desfraldam a bandeira dos avanços. E são contrários aos radicalismos.

Estudantes

Como é sabido, há um bom tempo que a estudantada deixou de participar massivamente da movimentação social. Sua representação tem diminuído em função da carga ideológica que dá o tom de entidades estudantis, como UNE, onde toma assento um grupo radical. Os estudantes participaram de modo intenso das grandes manifestações de 2013, motivados pelo aumento das tarifas de transporte público. O setor estudantil é dividido. E não tem exercido com força o papel que deveria ter na teia organizativa.

Indústria

Atua pela via de suas representações, sindicatos, federações, confederações. Carece de grandes lideranças. Tem papel mais destacado na luta contra impostos. CNI, FIESP e entidades congêneres perderam parcela da força protagonista do passado. E seus líderes têm sido contaminados pelo vírus da política partidária. O motor de arranque da representação industrial é o Sistema S. Hoje, sujeito a bombardeios.

Ruralistas

Eis um grupamento com voz e vez, principalmente o setor do agronegócio. Firma-se bem no terreno institucional, a ponto de contar, hoje, com uma das maiores bancadas no Congresso Nacional. O agronegócio ganha fama e força graças à fabulosa contribuição dada ao PIB. Consegue ter imenso poder junto ao Executivo, sendo agraciado com o atendimento de suas demandas.

Serviços

A novidade na moldura das organizações é a participação de setores de serviços. Que ganham força nesse ciclo, a partir de sua liderança na composição do PIB nacional, que lidera com sua participação de mais de 60%. Grandes setores, como bancos e turismo, agora contam com nichos de considerável poder de pressão, como os setores da terceirização e do trabalho temporário, que acompanham com atenção as grandes mudanças no mercado de trabalho.

Os grandes centros

A movimentação social tem nos grandes centros o seu motor de arranque. Se o discurso de qualquer setor do leque organizativo emergir de um grande centro, certamente terá assegurada sua capilaridade, ou seja, a capacidade de se espraiar pelo território. Os grandes centros funcionam como a pedra jogada no meio da lagoa. Forma ondas que, de maneira concêntrica, rolam até as margens.

Cidades médias

As cidades médias funcionam como extensões dos braços das grandes cidades. Repetem o que vem de cima e passam para as localidades menores. Cria-se, assim, gigantesca teia de barulhos. A imagem é a de um terremoto, cujas camadas de terra sofrem maior impacto no epicentro, sendo mais arrefecidas nas lonjuras. Mas os tremores aparecem a quilômetros de distância do maior impacto.

O balão da opinião pública

A formação do pensamento nacional deriva de um processo que agrega formadores de opinião, passa pelas lideranças de entidades, atravessa o campo de difusores aberto nos grandes espaços das classes médias, entra na tuba de ressonância dos meios de comunicação, que difundem as mensagens das áreas centrais para as áreas periféricas.

A repetição

A repetição das mensagens pelas mídias é fator de impulso da recepção e internalização das mensagens. Ou seja, nem sempre os fatos que se ouvem, se veem e se percebem são internalizados. Por internalização, entende-se o processo de cognição/compreensão das mensagens. Como é sabido, parcela considerável das mensagens midiáticas se perde por não entrar e descer pela cuca das pessoas.

Pílulas

- Luiz Inácio começará dia 17 seu périplo pelo Nordeste. Maneira inteligente de iniciar pré-candidatura.

- Aécio Neves ainda tem forças no PSDB. Não morreu.

- Raquel Dodge não vai arrefecer a ação da PGR. Mas vai ter diálogo mais estreito com o poder político.

- Rodrigo Maia é um nome em ascensão. Trata-se de exímio articulador. E cumpre palavra.

- Governo Temer poderá fazer ligeira mexida no Ministério.

- ACM Neto pode figurar como vice na chapa de 2018 à presidência, caso o DEM não tenha um nome na cabeça de chapa.

- Gleisi Hoffmann está saindo muito radical no figurino de presidente do PT. Sua imagem é ruim.

- Dilma pode sair candidata a senadora pelo RS. Falou-se até em vir a ser candidata por um Estado do Nordeste. Seria algo incongruente. E de alto risco.

- Joesley Batista poderá receber alguma punição. A partir de uma mudança de postura do STF sobre o acordo com ele feito. De 0 a 10, a chance é 7.

- Alckmin terá contra ele o fato de não possuir grandes ligações com outras regiões do país. Concentrou-se no Sudeste.

- Ciro Gomes começa a perder por excessos verbais. Marina Silva não terá o desempenho da última eleição. Bolsonaro pode ficar com 7% a 10% de intenção de voto. Se for candidato.

Fecho a coluna com Carlos Lacerda

Rima

Lacerda, governador da Guanabara, candidato à presidência da República, foi a Montes Claros, no norte de Minas. A cidade amanheceu com os muros pichados: "Lacerda rima com m...". No comício, à noite, Lacerda acabou o discurso assim:

- Aos meus amigos, deixo um grande abraço. Aos meus adversários, a rima.

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Colunista

Gaudêncio Torquato jornalista, consultor de marketing institucional e político, consultor de comunicação organizacional, doutor, livre-docente e professor titular da Universidade de São Paulo e diretor-presidente da GT Marketing e Comunicação.