Abro a coluna com a verve popular...
Saudando presidentes
Juscelino Kubitschek, presidente da República, foi ao Ceará com Armando Falcão, ministro da Justiça. Sebastião Nery conta que Falcão, cearense, levou JK a um desafio de cantadores. Um cego estava lá, com sua viola, gemendo rimas. Juscelino chegou, cumprimentou-o. O cego respondeu na hora:
– Kubitschek, ai, meu Deus, que nome feio. Dele eu só quero o cheque porque do resto ando cheio.
– Vou louvar o meu patrão que já vem chegando agora. Engoliu a bicicleta e deixou o guidão de fora.
Nunca mais ninguém levou presidente para ouvir cantador no Ceará.
Soltura de Dirceu
A decisão do STF de mandar soltar José Dirceu comandará o discurso político-judicial nas próximas semanas. As prisões temporárias de longa duração fecham um ciclo. Abre-se uma nova jornada de discursos, críticas e apoios, nos conjuntos profissionais organizados: MP, Judiciário, OAB e suas associações. A locução crítica alcança o ápice. Até onde irá?
Que estranho, hein?
O Datafolha registra que a confiança dos brasileiros aumenta, que expectativas sobre a economia melhoram, que há sinais positivos no horizonte. No outro lado da moeda, mostra dados sobre avaliação negativa do governo Temer, que piora. Fica no ar a dúvida: quem está melhorando a economia? Quem é o artífice da melhoria da confiança? Um extraterrestre? Luis Inácio, com a bateria de denúncias nas costas? Ou o governo tão mal avaliado de Michel Temer? Por que tanta falta de nexo entre as posições registradas pelo Instituto da Folha de São Paulo?
O entendimento I
Como os analistas da Folha não se deram ao trabalho de analisar esse estranho fenômeno, tentemos fazê-lo. Primeira hipótese para os bons ventos que animam a confiança nacional: Deus, que é brasileiro, é o responsável pelos rumos esperançosos. Segunda hipótese: as centrais sindicais, que comandaram a quebradeira da sexta-feira, dia 28, conseguiram o milagre de recuperar a economia. Terceira hipótese: o PT e os outros partidos da oposição são os verdadeiros responsáveis pelo aumento da taxa de confiança. Quarta hipótese: nenhuma das hipóteses anteriores é adequada.
O entendimento II
Não vingando nenhuma hipótese anterior, este consultor põe sua colher na sopa de dados incongruentes. A distinta opinião pública – que amalgama as opiniões setoriais e individuais – tende a jogar no colo do governo Temer toda a indignação que expressa sobre a esfera política. Protagonistas – representantes e partidos - são farinha do mesmo saco e estão todos condenados ao fogo do inferno. O governo, no caso, tende a ser associado ao inferno. Corrupção, latrocínio, rapinagem em alta escala, tudo é lançado nas cavernas do governo. Esta é a explicação mais plausível. E por que isso ocorre?
Banalização
Isso ocorre na esteira do fenômeno da banalização que nivela todos os acontecimentos. Os políticos estão todos no buraco da péssima avaliação. E o governo é visto como guarda-chuva que acolhe a todos. Por quê? Por liderar, hoje, as reformas, ainda não palatáveis à maioria da sociedade. Ou seja, o governo está sendo atacado todos os dias por promover reformas que "tiram direitos trabalhistas". A martelada nas mentiras acaba suplantando a tênue comunicação governamental. E aí o governo assume o papel de bode expiatório das ruindades. O povo ainda não internalizou as lições sobre as vantagens das reformas para a garantia de seu futuro.
Inversão de papéis
Dá-se, então, uma inversão de papéis. Os mocinhos são os verdadeiros bandidos, os que pregam contra as reformas, os setores que lutam para preservar seu status, os grupos que temem perder privilégios. E os bandidos passam a ser o governo, que lidera as reformas, e aqueles que as defendem. Esse é o pano de fundo que agasalha pesquisas como a feita pelo Datafolha.
Previdência na Câmara
Hoje, a reforma da Previdência deverá ser aprovada na Comissão Especial da Câmara. Depois, lutará pela urgência da reforma trabalhista no Senado. O líder do governo no Senado, Romero Jucá, está mobilizando as lideranças. Renan Calheiros, líder do PMDB, lutará contra. Renan age como líder da oposição. Diz que reforma não passará pelo Senado da forma como está. Entre os compromissos que assumiu, Renan vai lutar pela permanência da contribuição sindical obrigatória.
O kit mercenário
As centrais sindicais estão contratando mercenários de quatro empresas de Brasília para duelar em nome de seus interesses. Do pacote constam depredações, pressões contra políticos na Câmara e no Senado, corredores poloneses para agredir quem entra no Congresso e outros aparatos conhecidos. Tudo isso faz parte do kit mercenário e as centrais pagam este preço:
- R$ 100 reais por cabeça ao dia;
- 4 a 6 horas de trabalho/dia;
- os "manifestantes" têm direito a ônibus, camiseta e um lanche.
As centrais não levam ninguém de fora para Brasília. Todos os mercenários são arregimentados nas cidades satélites mesmo.
Terceirização
Entidades patronais se debateram pela terceirização no país durante mais de vinte anos. A atividade se expandiu de forma gigantesca por exigência da dinâmica da economia, como ocorre nos países mais avançados do planeta, e hoje acolhe 13 milhões de trabalhadores em suas mais de 700 mil empresas. Mas é muito estranho: em nenhum momento as centrais sindicais ou os partidos de esquerda apresentaram uma só ideia que fosse para amparar os trabalhadores terceirizados. Ou só os da esquerda são brasileiros?
E o trabalhador?
Ao final do dia 28 de abril, na chamada greve geral, os manifestantes queimaram oito ônibus no centro do Rio de Janeiro. Era uma forma de protestar contra as reformas empreendidas pelo governo para tentar melhorar a vida dos cidadãos. No dia de ontem, criminosos queimaram mais oito ônibus. Era o seu jeito de protestar contra uma megaoperação da Polícia Militar para acabar com a guerra entre traficantes na Cidade Alta, comunidade em Cordovil, na Zona Norte. Mas, na verdade, as maiores vítimas de manifestantes e criminosos são os trabalhadores, os que mais dependem de transporte público.
As chamas e a esperança
Enquanto pneus ardiam nas ruas e estradas do país, barricadas eram erguidas e a violência imperava contra os que pretendiam trabalhar na sexta-feira, o Datafolha se preparava para anunciar nova pesquisa, no qual a maioria dos brasileiros está menos pessimista em relação à sua própria situação econômica e a do país. Apesar de entortarem o nariz para a reforma da Previdência, a parcela dos entrevistados que prevê progressos em sua situação pessoal aumentou de 37% para 45%. Os números mostram, ao final, que aumenta cada vez mais a distância entre os manifestantes petistas e os que realmente trabalham no Brasil.
Destampatório de ignorância
Chegou às mãos deste consultor um vídeo feito com uma pergunta aos manifestantes do dia 28, aquele dedicado à fracassada greve geral. Pergunta do entrevistador: que direitos o trabalhador está perdendo com as reformas? O destampatório é de gargalhar. Respostas: o trabalhador perderá direito ao FGTS; perderá benefícios; não terá direito às férias, 13º salário, perderá o tempo já trabalhado e que conta para a aposentadoria. Alguns gaguejam, outros não sabem o que dizer. Mas observa-se a instrumentalização a que algumas pessoas foram submetidas. Uma carrada de ignorância dentro de toneladas de má-fé. O vídeo circula pelas redes.
Comício do Paulinho
Paulinho da Força tem o dom de agradar e, ao mesmo tempo, desagradar seus interlocutores. No palanque de sua festa de 1º de maio, quando levou artistas e sorteou carros, desancou as reformas e o governo Temer. Ao fundo, o logotipo da Caixa Econômica Federal, uma das patrocinadoras do evento. Paulinho deve justificar: a Caixa está do nosso lado e contra o governo. O que diz a CEF sobre o verbo solto e destemperado do sujeito que dirige a Força Sindical?
O enigma Lula
Luis Inácio vai depor dia 10 de maio em Curitiba. Crescem as expectativas. O PT se prepara para lançar sua candidatura à presidência da República logo após seu depoimento ao juiz Sérgio Moro. Já se sabe que Lula vai negar tudo. E aproveitar para se fazer de vítima. Moro, por sua vez, não deve se amedrontar. Há plateias que aplaudem sua conduta. Por isso, 10 de maio poderá ser o início do fim de Lula. Ou abrir o ciclo do eterno retorno: Lula recomeçando sua vida de candidato.
Brasil da inclusão digital
Amanhã, o satélite geoestacionário brasileiro Ariane será lançado a uma distância de 36 mil quilômetros da Terra a partir da base de Kouru, na Guiana Francesa. Com esse lançamento, o país abre os horizontes da transmissão de dados com uso de equipamento próprio. As telecomunicações serão beneficiadas com 70% do tráfego de dados do satélite, a chamada Banda Ka, e os outros 30% serão destinados às comunicações militares e estratégicas, defesa e segurança nacional, Banda X.
Internet nos rincões
A iniciativa é uma parceria entre o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e o Ministério da Defesa, com investimentos estimados em R$ 2,7 bilhões. Os benefícios são muitos, mas a oferta de banda larga em unidades escolares de áreas remotas e também em unidades de saúde pública merece destaque. O satélite foi construído pela Visiona, uma joint venture entre Telebras e Embraer, e seu lançamento é de responsabilidade da empresa aeroespacial francesa Arianespace.
Voto facultativo I
É mentirosa a tese de que a obrigatoriedade do voto fortalece a instituição política. Fosse assim, os EUA ou os países europeus, considerados territórios que cultivam com vigor as sementes da democracia, adotariam o voto compulsório. O fato de se ter, em algumas eleições americanas, participação de menos de 50% do eleitorado não significa que a democracia ali seja mais frágil que a de nações onde a votação alcança dados expressivos. Na Grã-Bretanha, que adota o sufrágio facultativo, a participação eleitoral pode chegar a 70% nos pleitos para a Câmara dos Comuns, enquanto na França a votação para renovação da Assembleia Nacional alcança cerca de 80% dos eleitores. Não é o voto por obrigação que melhora padrões políticos. A elevação moral e espiritual de um povo decorre dos níveis de desenvolvimento econômico do país e seus reflexos na estrutura educacional.
Voto facultativo II
Na lista do voto obrigatório estão os territórios da América do Sul, com exceção do Paraguai, enquanto a lista do voto facultativo é integrada por países do Primeiro Mundo, os de língua inglesa e quase todos os da América Central. O voto facultativo, ao contrário do que se pode imaginar, motivará a comunidade política, engajando os grupos mais participativos e vivificando a democracia nos termos apregoados por John Stuart Mill, numa passagem de Considerações sobre o Governo Representativo, quando divide os cidadãos em ativos e passivos. Diz ele: "Os governantes preferem os segundos - pois é mais fácil dominar súditos dóceis ou indiferentes -, mas a democracia necessita dos primeiros. Se devessem prevalecer os cidadãos passivos, os governantes acabariam por transformar seus súditos num bando de ovelhas dedicadas tão somente a pastar capim uma ao lado da outra."