Porandubas Políticas

Porandubas nº 487

O Brasil vive uma das semanas mais decisivas de sua contemporaneidade.

13/4/2016

Abro a coluna com duas historinhas, uma da Bahia, outra do Maranhão.

O vice-versa

Dr. Dantinhas, deputado da Bahia, elo de todo um clã político do Estado (neto do barão de Geremoabo), foi convidado para padrinho de casamento da filha de um coronel do sertão. No dia de viajar, recebeu telegrama :

– Compadre, não precisa vir. Deu-se o vice-versa. Menina morreu.

Puxa quem pode

Tempos eleitorais. Tempos de fidelidade e infidelidade. Guararé era cabo eleitoral do governador Sebastião Archer, do Maranhão. Convenção do PSD, alguém acusou Guararé de puxa-saco. Guararé argumentou :

– Cada um puxa quem pode. Eu puxo o senhor, governador Archer. O senhor já puxa o senador Vitorino Freire. E o senador puxa o general Dutra. É a lei da fidelidade partidária.

Semana decisiva

O Brasil vive uma das semanas mais decisivas de sua contemporaneidade. Segunda, a Comissão de Impeachment aceitou, por 38 a 27, o relatório produzido pelo deputado Jovair Arantes (PTB/GO) que recomendou o impeachment da presidente Dilma por crime de responsabilidade. O clima foi todo tempo acirrado naquela Comissão. O resultado era previsível, mas o governo esperava chegar a 30 votos. Não colou a tentativa dos governistas de relacionar impeachment a golpe. Pelo menos, até o momento.

Domingo, o dia D

Domingo será a votação em plenário. O governo diz ter 40 votos a mais do que necessita – 172 – para impedir o pedido de impeachment pela Câmara. As oposições garantem já ter alcançado os 342 votos necessários para aprovação. O corpo a corpo é intenso. Um estudo feito por estatísticos da USP, levando em consideração indecisos, partidos a que pertencem e Estados de origem, chega a este número : impeachment poderá ter entre 357 e 375 votos. Se não houver uma avalanche em contrário nessa semana, o afastamento da presidente passará pela Câmara.

Voto a voto

Luiz Inácio ocupa há duas semanas a suíte de um hotel estrelado de Brasília para receber deputados. Dizem que faz a pergunta clássica : o que você quer ? O governo estaria negociando com verbas de 38 bilhões de Ministérios. Ou seja, parte para a guerra com farto arsenal sob o lema : é tudo ou nada. Deputados nunca foram tão assediados. Mas Lula pode não assumir a Casa Civil, o que gera certa desconfiança. Há muitas dúvidas sobre a continuidade do governo Dilma.

Liberação de bancadas

Alguns partidos – PP, PR e PSB – estavam em dúvidas. PP e PR foram fortemente pressionados pelo governo a se manter na base governista. Mas a maioria dos deputados desses partidos, sob o clamor das ruas, já tomaram posição a favor do impeachment. Daí a mudança de rumos : o PSB decidiu pelo impeachment. Os outros liberaram as bancadas. O que favorece o voto das oposições, ou seja, a favor do impeachment.

O PMDB

O PMDB deverá ser o fator decisivo no domingo. O líder Leonardo Picciani, sob conselho do pai, Jorge Picciani, liberou a bancada. Ou seja, mais de 80% dos peemedebistas devem acompanhar os votos a favor do impeachment. Do Rio, com exceção dele e de mais um ou outro, os deputados do PMDB deverão votar pelo afastamento. A se confirmar essa tendência, não se descarta a possibilidade de indecisos de algumas siglas aderirem em massa à tese do impeachment.

O vazamento da mensagem

O vazamento do áudio com uma mensagem do vice-presidente Michel Temer sobre o Day after – no caso de aprovação do impeachment pela Câmara – as coisas são mais simples do que as histórias contadas, inventadas, espetacularizadas. Não houve conspiração nem há intenções golpistas com a mensagem vinda a público. O vice-presidente simplesmente foi instado a gravar algo ante a observação de um interlocutor : o que você dirá se, por acaso, houver uma decisão da Câmara pedindo o impeachment da presidente ? De supetão, gravou um áudio de 13 minutos com ideias sobre o país. Uma fala de bom senso. Sob o respeito de qualquer decisão a ser tomada pelo Senado caso o pedido chegue até lá.

A tecla

Era apenas um exercício de resposta eventual pergunta que poderá surgir, no caso – é bom lembrar – de aprovação do pedido de impeachment pela Câmara. Cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém. A mensagem deveria ser encaminhada a um amigo. Uma tecla acionada no WhatsApp destinou a mensagem para um grupo. Foi o que aconteceu. Sem conspiração, sem tramóia, sem intenções malévolas. Sem premeditação.

Golpe ? Piada

No dia seguinte, uma enxurrada de críticas da militância petista : golpe. O PT não olha para o próprio umbigo : quem assaltou os cofres do Estado ? Quem negocia em um hotel de Brasília espaços na Esplanada dos Ministérios ? Quem cometeu os maiores golpes contra a decência, a moral, a ética e os bons costumes ? Todas as respostas indicam que os canos do mensalão se encontraram com os dutos do petrolão. Sob a era PT.

Comparação

Qual o presidente afastado por escândalos de corrupção ? Não foi Getúlio. Não foi Jango. O caso de afastamento mais parecido com a situação da presidente Dilma é a de Collor. Lembram-se de PC Farias ? Ora, há quem diga que, ante os corruptos de hoje, mais parecia um coroinha. A avalanche de escândalos torna inviável a continuidade de um governo petista. As condenações de seus próceres que o diga.

Day after

Segunda-feira, dia 18. Como estará o Brasil ? Em clima de grande decepção se impeachment não passar pela Câmara. Em clima de euforia, caso o processo vá ao Senado. Este, por sua vez, terá condições de brecar a aprovação de um instrumento aprovado pela casa que representa o povo brasileiro ? 41 senadores teriam condições de desaprovar um recurso aprovado por 2/3 dos deputados ? Difícil imaginar essa possibilidade. O Brasil continuará agitado, tenso. A agenda do Senado estará nas mãos de Renan Calheiros, que tende a rezar pela cartilha de Dilma/Lula. Mas terá ele condições de suportar o peso das ruas ? Este consultor acha que ele se dobrará às circunstâncias.

Roberto Jefferson

Este consultor teve a oportunidade de entrevistar o ex-deputado Roberto Jefferson no programa Roda Viva desta segunda-feira. Trata-se de um político que domina a arte da oratória. Educado, mas firme, decidido, modesto. Sabe reconhecer erros. Volta com a cabeça erguida, como diz. Aponta Lula como o comandante do mensalão e do petrolão. Ele achava que Luiz Inácio ignorava as peripécias de José Dirceu. Acabou reconhecendo que o projeto de poder do PT foi sempre comandado por Lula. Acha, ainda, que o ex-presidente acabará atrás das grades. E que Eduardo Cunha, logo após o pedido de impeachment pela Câmara, será interditado pelo Supremo.

Agenda do impeachment

Sexta, as 8h50, começa a sessão da Câmara para debater o impeachment. Todos os 25 partidos com representação na Casa poderão usar seu tempo por até 1 hora. Cada partido designará até 5 deputados para usar a palavra. Os tempos de um partido não poderão ser cedidos a outro. Não há tempo para terminar. No sábado, a sessão terá início às 9h. Cada deputado, entre os 513, poderá usar a palavra por 3 minutos. Líderes se revezarão na tribuna. No domingo, a sessão terá início às 14h. O resultado da votação está previsto para as 21/22h.

Nomes

Ao final perguntei ao Jefferson sobre Lula, Alckmin, Aécio e Marina. Lula : vai ter de prestar contas à Justiça ; Alckmin, fortíssimo candidato à presidência da República em 2018 ; Aécio, tende a se enfraquecer com envolvimento na Lava Jato ; e Marina, é uma pessoa com pensamento igual ao do PT.

Governo cansado

Zaratustra, o pródigo e sábio filósofo de Nietzsche, oferece um banho de oxigênio aos governantes sem motivação, sem competência e sob o apupo das ruas : "Novos caminhos sigo, uma nova fala me empolga ; como todos os criadores, cansei-me das velhas línguas. Não quer mais, o meu espírito, caminhar com solas gastas". O recado é oportuno, principalmente para este governo cansado, incompetente, rodeado de corrupção.

Aragão fora, por enquanto

O novo Ministro da Justiça, Eugênio Aragão, por enquanto é apenas mais um ex em Brasília. A juíza Luciana Raques Tolentino de Moura, da 7ª vara do Distrito Federal, suspendeu sua posse. Aragão entrou para o Ministério procurando fama : prometeu demitir qualquer equipe da Polícia Federal se farejasse cheiro de vazamento. Claro, provocou um tremendo mal-estar no país. Antes, o STF afastara o primeiro substituto de José Eduardo Martins Cardozo, Wellington César Lima e Silva, pois a Constituição Federal de 1988 impede integrantes do Ministério Público de exercer outras atividades fora da instituição. O governo entendeu que, como Aragão foi admitido no Ministério Público antes de 1988, não estaria impedido de integrar o Executivo. Para a magistrada de Brasília, no entanto, a regra da Constituição vale para todos.

A rotinite

Há uma doença que aflige os governantes. Chama-se rotinite. As consequências são drásticas para os corpos administrativos : acomodação, ausência de criatividade, expansão da malha de interesses grupais, favorecimentos, saturação de ideias, obsolescência de estruturas. E tudo resulta em administrações que patinam, ou seja, movimentam-se para ficar no mesmo lugar. Um governo cansado é uma usina improdutiva. Os comandos dirigentes das áreas e setores são sonolentos e catatônicos. Parecem dândis andando no deserto infértil. Cuidado, prefeitos, governadores e presidente da República.

Epílogo do PT ?

O escândalo da Petrobras é o porto final do projeto do PT ? Tudo indica que sim. Pois o mensalão se conecta ao petrolão no formidável empreendimento em torno do projeto do PT. O partido construiu uma base para sua decolagem. Depois de navegar por 14 anos, a turbulência desestabiliza a aeronave petista. Que ainda está no ar, mas ameaça desabar. Lê-se que uma boa parcela de petistas tende a migrar para uma nova sigla a ser criada. Não será fácil. O PT encerrará um ciclo. Pode ter alguma sobrevida. Não muito extensa.

Brasil potência ?

Maurice Duverger, o famoso sociólogo, afirmou que "o Brasil só será uma grande potência no dia em que for uma grande democracia. E só será uma grande democracia no dia em que tiver partidos e um sistema partidário forte e estruturado". A receita demonstra que estamos muito longe do ideal do pensador francês. O nosso sistema é instável. Para se consolidar, carece que o país adote a modalidade eleitor-partido, para a qual será necessária, no sistema proporcional, a lista fechada para escolha de representantes, como na Espanha, Suécia, Holanda e Áustria, ou mesmo um sistema misto, que permita ao eleitor visualizar as duas alternativas, permanecendo o sistema majoritário em dois turnos. Estamos longe disso.

Correr ou morrer ?

"Toda manhã, na África, uma gazela desperta. Sabe que deverá correr mais depressa do que o leão ou será morta. Toda manhã, na África, um leão desperta. Sabe que deverá correr mais do que a gazela ou morrerá de fome. Quando o sol surge, não importa se você é um leão ou uma gazela : é melhor que comece a correr."

Os apologistas dessa historinha são os maiores defensores de uma sociedade esquizofrênica, voltada para a agressividade competitiva.

(Domenico de Masi)

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Colunista

Gaudêncio Torquato jornalista, consultor de marketing institucional e político, consultor de comunicação organizacional, doutor, livre-docente e professor titular da Universidade de São Paulo e diretor-presidente da GT Marketing e Comunicação.