Abro a coluna de hoje com um conto milenar japonês, enviado pelo amigo Eduardo Nascimento, ele mesmo um bom colecionador de causos.
O nascimento do peru
"Em uma planície, viviam um urubu e um pavão. Um dia, o pavão começou expressar certa angústia :
- Sou a ave mais bonita do mundo animal, tenho uma plumagem colorida e exuberante, porém nem voar eu posso, de modo a mostrar a minha incomparável beleza. Feliz é o urubu que é livre para voar para onde o vento o levar.
O urubu, por sua vez, também refletia no alto de uma árvore :
- Que infeliz ave sou eu, a mais feia de todo o reino animal ; e ainda tenho que voar e ser visto por todos. Quem me dera ser belo e vistoso tal qual aquele pavão.
E aí as duas aves, pensando sobre suas conveniências e inconveniências, tiveram uma brilhante ideia : deveriam se juntar para realizar um cruzamento. O fruto que desse cruzamento surgiria seria uma ave esplendorosa, magnífica, um descendente que iria combinar o voo tão aerodinâmico do urubu com a graciosidade e elegância do pavão. Cruzaram-se. E daí nasceu o peru ! Que é feio pra cacete e não voa !
Moral da história, senhoras e senhores : se a coisa está ruim, não invente! Gambiarra só dá m....!
Mais uma vez, o PMDB
O plano de arrefecer o PMDB não deu certo. Era intenção do núcleo duro do Palácio do Planalto. Os "estrategistas" no entorno da presidente quebraram a cara. Viram que as derrotas dos planos governamentais viriam em série, caso o PMDB não estivesse no centro das articulações. As derrotas começaram a acontecer. Lula entrou correndo para alertar : não deixem o PMDB de lado ; corram para trazê-lo ao seio do governo. Mercadante se apressou para conversar com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha. O mais importante articulador do partido, o próprio vice-presidente Michel Temer, foi acionado. Recebeu a visita do líder do governo na Câmara, José Guimarães. Promoveu um jantar para que Joaquim Levy explicasse as medidas do ajuste fiscal ao comando do partido. E assim, mais uma vez, o PMDB aparece na hora H para diminuir o rombo nos costados do governo.
PT com duas caras
O PT está entre a cruz e a caldeirinha. De um lado, tem de aprovar as medidas de ajuste na economia. E pede aos partidos da base para engrossar a barreira de defesa das medidas. Mas, na frente da opinião pública, o PT diz que os trabalhadores não podem suportar perdas. Sua intenção é a de aparecer como o grande braço de apoio dos trabalhadores. Dois discursos. Duas caras. Quer assoviar e chupar cana ao mesmo tempo. Impossível. Mas o PT é mestre na arte da engabelação. Querem ver mais uma ?
Defesa da Petrobras
Os petistas, liderados por seu braço sindical - a CUT - fazem um movimento no RJ em defesa da Petrobras. O discurso é cheio de slogans : o petróleo é nosso ; querem destruir a Petrobras ; vamos proteger a Petrobras contra as forças do atraso. E por aí vai. Mas há uma pergunta que continua no ar : e quem construiu o propinoduto que rouba os recursos da petroleira ? O PT parece dizer que não tem nada a ver com isso. Estratagema clássico do PT. P.S. Leio que Lula estará presente ao ato.
O momento
As crises que estamos vivenciando - econômica, política, social (manifestações de protesto), hídrica, energética, petrolão e de descrença geral - apontam para a saturação de uma era caracterizada por : invasão da coisa pública pelo negócio privado ; arrefecimento das ideologias ; pasteurização partidária ; declínio do Parlamento ; desmotivação dos eleitores ; improbidade administrativa ; impunidade ou falta de rigor nas punições ; quebra geral da ordem, do respeito às instituições e da moral ; fragmentação dos núcleos familiares ; despreparo de quadros ; descrença na Justiça.
As razões
E o que está por trás dessas crises ? A fluidez do Estado ; a imbricação de fronteiras entre os Poderes constitucionais ; a transformação da política em profissão altamente rentável ; a fragilidade dos mecanismos de punição ; a morosidade da Justiça ; a rotação de dirigentes e a cultura regada com a semente do fisiologismo, herdada dos nossos colonizadores. Mas há uma esperança : da crise, brota a oportunidade. No pântano, pode vicejar uma bela flor.
Quem vai pagar o pato
Não há sacrifício sem dor. O país começa a perambular em um calvário. Durará até quando ? Vai entrar pelo ano de 2016. Sem dúvida. E as dores do sacrifício serão sentidas, mais uma vez, pelos corpos mais frágeis. No caso, os contingentes que já sofrem as agruras de tributos e impostos em cascata.
Rui está defasado ?
Simulemos um debate sobre ética na política entre parlamentares e o senador Rui Barbosa. O mestre lhes diria : "Não há nem pode haver aliança entre a política e os meus interesses privados. A política é e será sempre a inimiga da minha prosperidade profissional". O parlamentar poderia retrucar : "Ética é fidelidade aos amigos". Outro arremataria : "Aos amigos, pão, aos inimigos, pau". O velho Rui, no troco, lembraria trecho do discurso de 26/12/1901, que bem poderia servir de conselho a muitos dos nossos representantes : "Vespasiano dizia que, para um imperador, decência é morrer de pé, decência é cumprir bem o seu papel".
O impacto sobre o Congresso
A lista do procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, chegará ao STF nos próximos dias. Ele pedirá abertura do sigilo. Há políticos incriminados com provas ; outros, sem provas, mas com indícios de crimes ; e mais um grupo apontado, sem indícios e provas. Esta turma será inocentada. A menor parte. O que poderá ocorrer ? Encaminhamento às Comissões de Ética. Os casos entrarão numa demorada liturgia. A mídia fará acompanhamento estreito. Mas a tendência do corpo parlamentar é a de inocentar suas partes. A condenação de um deflagrará a queda das pedras do dominó. Será a condenação de todos. A conferir.
O rubicão
Se Dilma, até o final do ano, atravessar o Rubicão, mesmo com tropeços, entrará em 2016 mais forte do que hoje. O inferno astral do PT e da presidente deverá ir até o mês de dezembro.
Menos apoio
A lógica é essa : quanto mais vulnerável a presidente, menos apoio terá no Congresso. A recíproca é verdadeira.
Polarização PT x PSDB
A polarização entre tucanos e petistas também já rendeu o que deveria render. Está saturada. A sociedade quer enxergar novas disputas entre novos atores. Quem viver um pouco mais, verá.
Reforma política
Aprovação do distritão (deputado Federal) e distritinho (vereadores em cidades acima de 200 mil eleitores) ; financiamento privado (pessoa física) e financiamento público de campanhas ; mudanças nas campanhas eleitorais - estes são pontos que podem abrir com sucesso a reforma política.
Crise energética
O país corre sérios riscos de enfrentar apagões pelos meados do segundo semestre. E a crise hídrica não arrefeceu com as boas chuvas de fevereiro. O segundo volume morto do Cantareira acaba de ser coberto e para a cobertura do primeiro volume serão necessários mais aumento de cerca de 20% na capacidade. Mas, para chegar ao nível ótimo, será necessária uma expansão bem maior da estatística.
Terceirização
O PL 4.330, que trata da terceirização de serviços, deverá entrar na pauta da Câmara, pinçado com outros projetos em tramitação. O que querem as centrais sindicais ? Apenas grana pesada. Elas criticam o projeto, falando em precarização do trabalho. Lorota. Os terceirizados são garantidos por convenções coletivas promovidas por seus sindicatos. Têm todos os direitos garantidos. E as empresas que faltam aos compromissos legais são objeto de fiscalização e condenação. O que querem, então, as centrais ? Que as contribuições dos terceirizados sejam feitas junto ao Sindicato das Empresas Tomadoras de Serviços. Significa, por exemplo, que a mulher que serve o cafezinho numa metalúrgica será transformada de copeira em metalúrgica. O salário será ajustado pelo patamar dos siderúrgicos. A base de arrecadação das centrais será expandida aos céus. E isso acaba com o conceito de terceirização.
Uma nova ordem
Maquiavel predizia : "Nada é mais difícil de executar, mais duvidoso de ter êxito ou mais perigoso de manejar do que dar início a uma nova ordem de coisas". Implantar uma nova ordem na cultura política brasileira é tarefa para duas a três gerações.
MP do Trabalho
O MP do Trabalho também olha a terceirização com olhos de dinossauro. Não enxerga os benefícios de um setor que, a cada dia, ganha foros de especialização.
A bomba do petrolão
Ricardo Pessoa, o comandante da UTC, poderá ser a bomba do petrolão. Se fizer o acordo de delação premiada e abrir o bico, será um deus nos acuda.
Empresas quebradas
Se as grandes empresas arroladas no affaire do petrolão entrarem em colapso e deixarem de fazer obras para o Estado, o país expandirá o clima de caos. Milhares de brasileiros serão desempregados. Não haverá outras empresas em condições de tocar as obras. Urge olhar para essa questão. A par das necessárias investigações e condenações a serem feitas.
Quem muito quer...
Quem muito quer, tudo perde. O PMDB do RJ começa a olhar para o futuro, colocando o prefeito Eduardo Paes na estrada governativa de 2018. Mas consolida-se a impressão de que o rapaz não tem estofo. Poderá cair do cavalo.
CPI da Petrobras
A crença mais forte é que a CPI da Petrobras seja mais um fórum de debates e querelas entre situação e oposição. O relator deverá ser um deputado do PT.
A engenharia do encantamento
A engenharia de encantamento das massas ampara-se no campo do simbolismo. Daí deriva o marketing. Que trabalha com a liturgia do poder, que se faz presente na História da humanidade como sistema para lapidar a imagem de governantes, imperadores, reis, príncipes, presidentes, políticos e celebridades. Quinto Túlio já o experimentava em 64 A.C. quando aconselhava o irmão Marco Cícero, famoso tribuno romano, candidato ao consulado, a se apresentar como um "homem novo bem preparado para conseguir a adesão entusiasmada do povo". César calculava os gestos públicos. Maquiavel ensinava o príncipe a divertir o povo com festas e jogos. Luís XIV desfilava nos espetáculos que promovia. Napoleão era um pavão vestido de púrpura quando se coroou para receber a benção do papa em Notre-Dame. Hitler foi treinado em aulas de declamação para agitar as massas, usou a cruz gamada para propagar o nazismo, podendo-se dizer que o marketing político ganha status profissional sob o comando de Joseph Goebbels, seu "marqueteiro".
Dilma e os empresários
A presidente Dilma começa uma nova fase de articulação com o universo empresarial. Chama empresários graúdos para ouvir seus sentimentos sobre seus setores. Ideia saudável. Mas as reivindicações setoriais não combinam com o programa de ajuste fiscal.
A base do governo
As próximas votações na Câmara serão decisivas para o governo medir suas forças e tomar pulso do mando sobre as bancadas partidárias. Afinal, dos 360 deputados que formam a bancada governista, nem a metade vota hoje com o governo.
Leva de gaguinhos ?
A legislatura que se inicia abrirá oportunidade para constatação da qualidade da expressão parlamentar. Será que vamos ter uma leva de grandes oradores ou de gaguinhos ? Vamos à historinha. Em 1976, o candidato da Arena a prefeito de Palmares/PE, renunciou. O governador de PE, Moura Cavalcanti, correu lá e pesquisou : "Quem é mais popular na cidade"? Resposta : "O gaguinho. Não fala nada". O gaguinho subiu no palanque, endeusado pela oração do governador : "Prefeito não precisa falar. Precisa agir". A multidão, comovida, aplaudia o gaguinho, que apenas gesticulava com o V da vitória. Sem um dizer um A, ganhou. Pois é. Que diferença faz eleger uma pessoa séria ou um malandro, um gaguinho ou um falastrão ? Milhões de brasileiros infelizmente assim pensam. É o preço de uma democracia claudicante.