Porandubas Políticas

Porandubas nº 381

Serra desistiu de ser candidato à presidente da República e deixou o caminho livre para Aécio.

18/12/2013

De jeito nenhum

Vez ou outra, valho-me do agudo observador da cena brasileira e esforçado amigo Sebastião Nery para abrir a coluna. Como é o caso desta. A historinha se dá nos tempos turvos da promulgação do AI-5, em dezembro de 68, quando foram fechados os Legislativos e os parlamentares eram obrigados a fazer uma declaração de bens de 10 anos anteriores. João Batista Botelho, conhecido na Assembleia Paulista como "João Cuiabano", preparou seu dossiê e, quando ia enviá-lo a quem de direito, foi advertido por um assessor :

- Nobre deputado, Vossa Excelência tem de enviar a eles também o seu currículo.

João, homem de poucas letras, do alto de sua bravura, virou uma fera :

- Isto eu não vou dar de jeito nenhum. Só conseguirão se passarem sobre meu cadáver.

Dito e feito !

Serra, ufa, desiste

José Serra, ufa, desistiu de ser candidato à presidente da República. E assim, deixa Aécio Neves livre para botar a candidatura nas ruas. Serra fez a confissão pública da desistência, via twitter/facebook. Pediu, até, que os tucanos formalizassem a candidatura. Negócio seguinte : quanto mais Serra demorasse, mais incertezas jogaria na arena eleitoral. Exibe, hoje, uma intenção de voto maior que a de Aécio, mas, ao correr de uma campanha, a tendência aponta para um crescimento do candidato mineiro nas pesquisas. O agora liberado Aécio adensa sua movimentação e apresenta esta semana as 12 diretrizes que servirão de base ao programa do PSDB.

"Os poderosos podem destruir uma, duas ou três flores, mas nunca deterão a primavera". Che Guevara

Chances do mineiro

As chances de Aécio dependerão do estado geral da economia em 2014, ou, mais precisamente, nas margens de outubro de 2014. Com a economia descontrolada, as oposições veriam ampliadas suas condições. A recíproca é verdadeira. No caso específico de Aécio, há uma barreira a saltar: encarnar o perfil do novo, do inovador. O neto de Tancredo Neves expressa os fortes valores da política mineira. Se sair com quatro milhões de votos de maioria, em MG, conta com boas condições de entrar no segundo turno. SP, o maior colégio eleitoral, pode vir a se encantar com a lábia mineira. Vai depender do canto mavioso de Geraldo Alckmin. E também da polarização entre tucanos e petistas. Se vingar, seria vantajosa para Aécio.

"O amor é a força mais abstrata, e também mais potente, que há no mundo". Mahatma Gandhi

Alckmin sob tiroteio

Outro fator a ser considerado será o tiroteio sobre o governador Geraldo Alckmin. O affaire dos trens – denúncias de cartel – será muito usado pelo PT, até para tentar anular os efeitos do mensalão. Alckmin tem imagem positiva, é cordial, começa a adensar a visibilidade – com campanhas institucionais do governo – e possui forte penetração no interior do Estado. Se o eleitorado entrar no jogo da polarização com o PT, será ele o maior beneficiado. SP é um bastião feroz contra o petismo. A rejeição ao PT soma entre 30% a 35%. Em eventual segundo turno, Alckmin levaria a melhor.

"Um espírito mesquinho é como um microscópio : aumenta as pequenas coisas, mas impede de ver as grandes". Philip Chesterfield

Efeito maldhad

O prefeito Haddad não está bem nas planilhas de avaliação. Os índices exagerados de aumento do IPTU geraram protestos. Ainda bem que recursos da FIESP e do PSDB barraram o aumento. Mesmo assim, sobram críticas. Grupos de sem terra e sem teto acampam na frente da prefeitura, no viaduto do Chá. A cidade está um caos. Os corredores exclusivos de ônibus apertam os espaços dos carros. Os congestionamentos se multiplicam. Esse efeito – chamado jocosamente de maldhad – terá consequências eleitorais. A conferir.

"Deixe-me dizer, com o risco de parecer ridículo, que o verdadeiro revolucionário é feito de grandes sentimentos de amor". Che Guevara

Padilhando

O ministro Alexandre Padilha, da Saúde, é a grande esperança de Lula para tomar o principal bastião de resistência ao petismo, o Estado de SP. O maior cabo eleitoral do país espera repetir com Padilha o que fez com Haddad. Tirou um nome asséptico do bolso do colete e conseguiu elegê-lo prefeito. Mas a campanha municipal não foi afetada pelo episódio do mensalão. Nos últimos tempos, o episódio ganhou ampla visibilidade. Lula sabe que não será fácil alavancar seu candidato. O PT pode, até, resgatar seus históricos 25% a 30% dos votos. Mas e a rejeição ao petismo ?

"Quem perde a fortuna perde muito; mas, quem perde o caráter, perde tudo". Emerson

Financiamento de campanha

Acabar com o financiamento privado de campanha, a partir da proibição de doações de recursos por empresas, é uma medida saneadora ? Em princípio, sim. Evitaria que o poder econômico agisse como o principal motor eleitoral. Sejamos, porém, realistas. O poder econômico vai continuar a dar apoio a candidatos. Como ? Por debaixo do pano. O caixa dois será bem usado. Desta feita, se houver proibição, com mais intensidade. Política e interesses privados caminham juntos. Poderá haver um refluxo nos custos gerais das campanhas, mas a grana privada continuará a entrar nos cofres eleitorais.

Quem ganha mais

Se houver proibição de doações privadas de empresas, quem ganhará mais com a medida ? O PT. Pelas seguintes razões : 1. é o partido mais orgânico, mais vertical, mais capaz de engajar os quadros na luta eleitoral; 2. é um dos partidos que mais recursos recebem do fundo partidário (tem o maior número de deputados Federais); 3. é o partido no comando do poder, ou, noutra leitura, é o partido que detém o poder da caneta. É comum se dizer que o poder da caneta lidera os outros Poderes; 4. é o partido com o maior número de quadros e comandos da máquina Federal em todos os Estados da Federação. Logo, interessa ao PT fechar os dutos financeiros dos partidos, pois os seus cofres estarão bem abastecidos.

"O caráter não é esculpido em mármore, não é algo sólido e inalterável. É algo vivo e mutável, e pode tornar-se doente, como se torna doente o nosso corpo". George Eliot

STF e a proibição

Parece esdrúxula essa decisão do STF de julgar a questão da doação de recursos de empresas para campanhas. Trata-se de matéria típica do Congresso Nacional. O que tem a ver a Suprema Corte com um tema de exclusiva competência da representação política ? Simples. O STF foi acionado pela OAB. E se há um recurso que chega ao seu foro, não pode deixá-lo de lado. Ou seja, por falta de legislação específica, os juízes darão sua interpretação, à luz da Constituição, e julgam. E se o Supremo proibir as doações privadas, o Congresso poderá criar uma lei permitindo tais recursos ? Sim. Estamos, portanto, diante do seguinte fato : o STF pode desaprovar e o Congresso aprovar. No momento em que a lei permitir a doação de recursos por parte de empresas, a interpretação dos ministros cairá por terra. É o que se divisa no horizonte. A conferir.

Posse do Marcelo

Faço uma homenagem ao dr. Marcelo Cascudo, que toma posse, amanhã, quinta-feira, no Palácio dos Bandeirantes, como presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Cardiovascular. A entidade foi criada pelo inesquecível cirurgião dr. Euríclides de Jesus Zerbini, e já foi presidida pelo dr. Adib Jatene. Marcelo é um paraibano de Uiraúna, vizinha da minha querida Luis Gomes/RN, e um dos mais prestigiados cirurgiões cardíacos do país. Mas é um potiguar honorário, título recebido no Dia do Médico. Marcelo é um líder. E um médico que inscreve seu nome na galeria da excelência.

Rebelião na Papuda ?

Juízes substitutos da vara de Execuções Penais, responsáveis pela prisão de condenados do processo do mensalão, querem ser removidos. A causa ? Receio de rebelião na penitenciária da Papuda. Poderia haver fuga em massa nas vésperas de Natal. Criou-se, ali, a partir da prisão dos mensaleiros, um tratamento desigual. Os chamados presos comuns não se conformam com as regalias aos condenados da AP 470.

Fenaserhtt elege diretoria

Entidade representativa oficial do setor de prestação de serviços especializados e de trabalho temporário no Brasil, a Fenaserhtt (Federação Nacional dos Sindicatos de Empresas de Recursos Humanos, Trabalho Temporário e Terceirizado) tem nova diretoria para o quadriênio 2014/2017. Vander Morales, presidente do Sindeprestem (Sindicato Patronal Paulista do Setor), foi eleito para comandar os rumos da Fenaserhtt. "A federação representa a concretização de um antigo sonho do empresariado. É uma organização maior, com mais poder de representatividade e participação nos debates na esfera governamental e fóruns tripartites", diz Morales.

O roubo de duas melancias

O juiz Rafael Gonçalves de Paula, da 3ª vara criminal de Palmas/TO, deu o seguinte despacho sobre o auto de prisão em flagrante de Saul Rodrigues Rocha e Hagamenon Rodrigues Rocha, detidos em virtude de suposto furto de suas melancias.

- "Para conceder a liberdade aos indiciados, eu poderia invocar inúmeros fundamentos : os ensinamentos de Jesus Cristo, Buda e Ghandi, o Direito Natural, o princípio da insignificância ou bagatela, o princípio da intervenção mínima, os princípios do chamado Direito alternativo, o furto famélico, a injustiça da prisão de um lavrador e de um auxiliar de serviços gerais em contraposição à liberdade dos engravatados que sonegam milhões dos cofres públicos, o risco de se colocar os indiciados na universidade do crime (o sistema penitenciário nacional). O juiz continuou :

- Poderia sustentar que duas melancias não enriquecem nem empobrecem ninguém. Poderia aproveitar para fazer um discurso contra a situação econômica brasileira, que mantém 95% da população sobrevivendo com o mínimo necessário. Poderia brandir minha ira contra os neoliberais, o consenso de Washington, a cartilha demagógica da esquerda, a utopia do socialismo, a colonização européia ! Poderia dizer que George Bush joga bilhões de dólares em bombas na cabeça dos iraquianos, enquanto bilhões de seres humanos passam fome pela Terra – e aí, cadê a Justiça nesse mundo ?

- Poderia mesmo admitir minha mediocridade por não saber argumentar diante de tamanha obviedade. Tantas são as possibilidades que ousarei agir em total desprezo às normas técnicas : não vou apontar nenhum desses fundamentos como razão de decidir.

- Simplesmente mandarei soltar os indiciados. Quem quiser que escolha o motivo. Expeçam-se os alvarás. Intimem-se".

Conselho aos cartolas

Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes, membros dos Poderes e líderes nacionais. Na última coluna, o espaço foi destinado aos membros do PT. Hoje, volta sua atenção aos cartolas :

1. Urge exigir do STJD regras mais claras para julgamento de clubes e jogadores. Um time é apenado com rebaixamento por ter escalado jogador suspenso. A Lusa desce e o Fluminense sobe.

2. Mas, em 2010, ao que se divulga, o Fluminense sagrou-se campeão nacional, cometendo a mesma penalidade da Portuguesa. Escalou o jogador Tartá, suspenso.

3. Ao que parece, há uma tentativa de deixar os grandes times em situação melhor. Os clubes médios, sem grande poder, são mais punidos. Essa é a Justiça esportiva que temos ? Por que não temos regras mais claras ? Ou será que, por nossas plagas, continua vingando o ditado : "os pobres nunca deviam fazer guerra" ?

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Colunista

Gaudêncio Torquato jornalista, consultor de marketing institucional e político, consultor de comunicação organizacional, doutor, livre-docente e professor titular da Universidade de São Paulo e diretor-presidente da GT Marketing e Comunicação.