Porandubas Políticas

Porandubas nº 308

Conselho à presidente Dilma : a postura técnica, elogiável e recomendada, precisa ter uma contrapartida política. Não se governa sem apoio da base política.

7/3/2012

Os quatro semáforos

Certo prefeito de Santa Rita do Sapucaí, nas Minas Gerais, ao ver nomeado um amigo para comandar o DETRAN, correu a Belo Horizonte, e não se fez de rogado. Foi logo pedindo :

- Amigo, me arranje umas sinaleiras para minha cidade. Vai ser o maior sucesso. Vai ajudar muito a minha popularidade.

O diretor, tomado de surpresa, ante tão inusitado pedido, procurou administrar a euforia do prefeito, mas não tinha como escapar à pressão :

- Compadre, está difícil arrumar esses aparelhos. Tenho de fazer uma grande reforma aqui na capital. Mas vou me esforçar para lhe arrumar quatro semáforos. Mas, por favor, não espalhe. Insisto : não espalhe.

E assim foi. Ao chegar a Santa Rita, um mês depois da entrega, ficou embasbacado. Viu os quatro semáforos colocados no mesmo lugar : o centro da cidade. Perguntou ao alcaide : "por que você mandou colocar todos eles naquele lugar" ? Sorriso no canto da boca, o prefeito respondeu :

- Ora, compadre, você esqueceu ? Me lembro bem : você bem que me pediu para não espalhar os faróis.

Manifesto do PMDB

O manifesto do PMDB, assinado pela maioria da bancada, é a gota d'água tirada do pote da insatisfação no qual mergulha o corpo partidário. O partido está insatisfeito com um 'certo' desprezo do governo. Não se trata apenas de queixas contra o menor espaço que tem hoje, comparado ao dos tempos de Lula. Trata-se da constatação de que a coalizão, na prática, não funciona. O Executivo quer os votos do PMDB. E só. Não faz consultas ao partido. Na hora H, a presidente Dilma vale-se da habilidade e do perfil harmônico do vice-presidente Michel Temer para acalmar os ânimos. Mas há limites nessa história de "vem-aqui-e-chega-pra-lá".

Mais reuniões

Diante da crise que pode se alastrar pelos desvãos do Parlamento, o vice-presidente Michel passa a ter papel transcendental. Não por acaso, a presidente Dilma quer fazer reuniões periódicas com ele. Agenda aberta, conversa franca.

Votação em peso

Por mais que existam divergências internas, o PMDB tem dado exemplo de unidade. Basta ver os votos por ocasião do Código Florestal e do Fundo Complementar do Servidor Público. Mostrou que vota unido. O líder Henrique Alves tem trabalhado com afinco para aprovar as matérias de interesse do Executivo. Mas não tem havido correspondência do governo. Só cobranças. Os peemedebistas desconfiam - e com razão - de que o governo quer minar suas forças e, ao mesmo tempo, ampliar as condições político-eleitorais do PT.

Presidência da Câmara

O PMDB quer presidir a Câmara Federal na próxima legislatura. E seu candidato é Henrique Alves, aliás, o parlamentar com o maior número de mandatos na Casa, 11. Henrique, para assegurar sua posição, procura se equilibrar entre a meta de atender os pleitos do Executivo e as demandas de sua bancada. Satisfazer, ao mesmo tempo, a uns e outros é tarefa quase impossível. Por isso, há um certo grupo - cerca de 20 - que tenta obstruir sua posição de liderança. Mas o vice-presidente, Michel Temer, do alto de sua índole equilibrada, funciona como algodão entre cristais.

Geddel, a trombeta

Há no PMDB alguns perfis que fazem barulho. Quem toca mais alto a trombeta é Geddel Vieira Lima, que exerceu o cargo de líder do partido, foi ministro da Integração Nacional, comanda o PMDB na Bahia, e hoje ocupa uma diretoria da Caixa Econômica Federal. Geddel é uma das melhores cabeças do partido. Pensa bem, mas é muito atirado. Não tem papas na língua. E não se cansa de fustigar, quase diariamente, o governador Jaques Wagner, adversário com quem quer medir forças. Ora, com tantas vozes dissonantes, torna-se mais complexa a tarefa do líder Henrique, de agradar todas as alas do partido.

Ameaça concreta

O PMDB está ameaçado de perder a posição de partido que detém o maior número de prefeituras do país, quase 1.200. O PT poderá tomar o seu lugar. E se isso ocorrer, o partido verá diminuídas as chances de poder vir a ser o parceiro principal do PT em 2014. Eis uma ameaça que paira sobre o PMDB.

Condições para ser governador

Solenidade de promoção da Polícia Militar em andamento, os agraciados com ascenso na carreira da corporação são chamados pelo cerimonial. Um a um recebe diplomação. Absorto em seu lugar, olhar atento a tudo, a maior autoridade presente à solenidade - governador Dinarte Mariz - resolve cochichar à orelha de Luciano Veras, secretário da Segurança do Estado :

- Coronel, eu não estou vendo entre os promovidos aquele meu afilhado que lhe fiz recomendação...

A resposta do secretário justifica o porquê da ausência do indicado pelo governador :

- Eu estive avaliando a carreira dele e observei que não havia condições para ganhar a promoção pretendida pelo senhor.

Sem maiores reservas, Dinarte alardeia sua contrariedade com a exclusão técnica :

- Luciano, que condições você está falando ? Se eu fosse atrás dessas condições nunca teria sido governador. (Quem conta o "causo" é Carlos Santos em seu livro Só Rindo 2)

Blocão

Há um bloquinho na Câmara, composto pelo PSB, PC do B, PMN e PRB. Pois bem, o sonho de Eduardo Campos é dar a esse ajuntamento o nome de blocão. A ideia é atrair o PSD de Kassab. Com essa junção, o bloco teria 110 deputados, que seria o maior da Casa. E, claro, com direito a reivindicar o comando parlamentar. Essa é mais uma ameaça que paira sobre o PMDB.

Mais insatisfeitos

Não é apenas o PMDB que se mostra insatisfeito com a participação no governo Dilma. Outros partidos também estão acusando o isolamento. Entre eles, o PSB, o PDT e o PR. A presidente reluta em nomear um indicado de Valdemar Costa Neto para o Ministério dos Transportes. Paulinho da Força quer indicar, pelo PDT, o novo ministro do Trabalho, mas a presidente tende a escolher o deputado gaúcho, Vieira da Cunha. O PSB, insatisfeito, deu apenas 2 votos favoráveis ao projeto do Fundo Complementar do Servidor Público.

Dilma, a durona

Pois é, depois de um ano, a presidente Dilma deixa ver, na plenitude, seu perfil : durona, cobradora, exigente, detalhista, apuro técnico, rigorosa, mandona, puxadora de orelha. O perfil da presidente amedronta ministros e assessores. Como consequência, distingue-se uma moldura de ministros sem autonomia, medrosos, pouco proativos. Muitas obras estão paradas. Verbas aprovadas para parlamentares não são liberadas. Esse é mais um motivo para descontentamento.

A humildade

"A humildade é virtude lúcida, sempre insatisfeita consigo mesma, mas que o seria ainda mais se não o fosse. É a virtude do homem que sabe não ser Deus". (André Comte-Sponville)

Militares da reserva

Pois é, os militares de pijama conseguiram o que queriam : ampla visibilidade. Fizeram um manifesto contra a Comissão da Verdade. E, de quebra, uma crítica ao governo. A presidente Dilma mandou puni-los. E, com essa decisão, a corrente de solidariedade entre os militares aposentados cresceu. Era o que eles queriam. Ora, a presidente deveria ter fechado os olhos a esses queixumes. Quem está na reserva só tem mesmo, como arma, o direito à livre expressão. Garantido pela Constituição. A impressão é a de que houve erro de conduta por parte do Executivo.

Quadro paulistano

A decisão de Serra, de participar do pleito paulistano, abre as seguintes hipóteses : maior probabilidade de segundo turno é com ele e Haddad. Mas tudo vai depender do papel de Lula. Terá o ex-presidente condições efetivas de participar ativamente do pleito ? Até onde vai a motivação de Marta Suplicy com a candidatura Haddad ? Geraldo Alckmin ajudará de maneira efetiva ou ficará na moita ? Os tucanos estarão todos unidos ou haverá dissidentes/inconformados/indignados, como eventuais perdedores das prévias (Zé Aníbal e Ricardo Trípoli, por exemplo ?).

Lula, corajoso

Quem conversou com Lula, recentemente, o achou muito deprimido. Ora, o ex-presidente passou por uma dura bateria de quimioterápicos. Os estados de depressão são previsíveis. Lula tem sido muito corajoso. Esta Coluna torce pela rápida recuperação deste grande brasileiro.

Governos sem grana

Os governos estaduais estão com a faca no pescoço. Os cofres estão vazios. Muitas obras paradas. Acorrem à Brasília. Ministros fazem ouvidos moucos.

Loucinha pintada

Etelvino Lins tomou posse no governo de Pernambuco. Logo no dia seguinte recebeu a visita de um tio do interior, que queria abraçar o sobrinho glorioso. O velho entrou meio desconfiado, sentou no sofá largo, começou a conversar. Mas tinha uma bronquite de abade. Tossia sem parar. Um emprego do palácio apanhou uma escarradeira toda desenhada em azul e a colocou discretamente ao lado. O velho tossiu, cuspiu no canto do chão. O empregado puxou a escarradeira mais para perto. O velho empurrou com o pé :

- Tervino, tira essa loucinha pintada daqui, senão eu acabo cuspindo dentro.

(Quem conta o "causo" é Sebastião Nery em seu Folclore Político)

O caso Valcke

Esse secretário-geral da FIFA, Jerome Valcke, é mesmo um desastrado. Sugeriu que o Brasil deveria ganhar "um chute no traseiro" para avançar na organização da Copa de 2014. O ministro do Esporte, Aldo Rebelo, pediu que a FIFA troque de interlocutor junto ao Brasil. Pano de fundo : soberania do Brasil e poderio da FIFA na organização/realização do evento. Até onde os poderes de ambos se cruzam ?

Dilma para Merkel

A chanceler da Alemanha, Ângela Merkel, perguntou a presidente Dilma, que criticara "o tsunami" financeiro : "o que você gostaria que nós fizéssemos?". Nossa mandatária respondeu : "primeiro, esterilizem a enxurrada de euros; segundo, queremos fazer boa parceria com Alemanha, desde que haja reciprocidade; terceiro, temos que tomar medidas de proteção à nossa moeda para proteger o mercado".

Ajudando Haddad

A presidente quer ajudar o pupilo de Lula, Fernando Haddad, a se eleger prefeito de São Paulo. Até toparia mexer no Ministério por conta dessa candidatura. Mas já avisou que não vai enfiar o pé na lama. Ajuda de longe. Para evitar desgaste. Aliás, esse tem sido o aviso da presidente aos correligionários.

Epílogo

"Um homem se propõe a tarefa de desenhar o mundo. Ao longo dos anos, povoa um espaço com imagens de províncias, de reinos, de montanhas, de baías, de naus, de ilhas, de peixes, de moradas, de instrumentos, de astros, de cavalos e de pessoas. Pouco antes de morrer, descobre que esse paciente labirinto de linhas traça a imagem de seu rosto". (Jorge Luis Borges)

Conselhos à presidente Dilma

Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes e líderes nacionais. Na última coluna, o espaço foi destinado à José Serra. Hoje, sua atenção se volta à presidente Dilma Rousseff :

1. A insatisfação na base governista tende a se expandir caso não sejam liberadas as verbas aprovadas no Orçamento para as regiões indicadas pelos parlamentares. Em um ano eleitoral, fechar os cofres para a esfera política parece incongruente.

2. A postura técnica, elogiável e recomendada, precisa ter uma contrapartida política. Não se governa sem apoio da base política.

3. A responsabilidade deve iluminar os caminhos decisórios. E vossa Excelência acerta em cheio quando decide colocar a régua no meio das demandas e pressões. Mas tenha cuidado para não exacerbar na postura.

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Colunista

Gaudêncio Torquato jornalista, consultor de marketing institucional e político, consultor de comunicação organizacional, doutor, livre-docente e professor titular da Universidade de São Paulo e diretor-presidente da GT Marketing e Comunicação.