Porandubas Políticas

Porandubas nº 258

12/1/2011

Saudação aos presidentes

Juscelino Kubitschek, presidente da República, foi ao Ceará com Armando Falcão, ministro da Justiça. Sebastião Nery conta que Falcão, cearense, levou JK a um desafio de cantadores. Um cego estava lá, com sua viola, gemendo rimas. Juscelino chegou, cumprimentou-o. O cego respondeu na hora :

- Kubitschek, ai, meu Deus, que nome feio. Dele eu só quero o cheque porque do resto ando cheio.

Um ano depois, a mesma cena. Jânio Quadros, presidente, vai a Fortaleza, há um desafio de cantadores. Chega com os óculos grossos e longos bigodes, um cantador o vê, saúda :

- Vou louvar o meu patrão que já vem chegando agora. Engoliu a bicicleta e deixou o guidão de fora.

Nunca mais ninguém levou presidente para ouvir cantador no Ceará.

Lula, o revisor

Os depoimentos de familiares de mortos na Itália, vítimas do terrorismo, pouco deixam dúvidas : Cesare Battisti esteve diretamente envolvido com os crimes. Um dos familiares chega a contar, de maneira dura, que viu a cara de Battisti. Confirma que este atirou pelas costas em seu familiar. O Judiciário da Itália, por sua vez, não faria uma condenação sem provas. Sem argumentos. Sem um escopo acusatório denso. Sob esse prisma, a extradição decidida pelo Supremo Tribunal Federal, em dezembro do ano passado, apresenta-se como o caminho mais adequado. Lula negou a extradição. Francisco Rezek, que já foi ministro do Supremo e hoje integra a Corte de Haia, é enfático : Lula não poderia agir como revisor do STF e nem da Carta Magna. Um absurdo. Fiquei meditando sobre a índole de Lula. E, olhando para os meus botões, chego à inferência. O STF está diante do lema : dar a Lula o papel de revisor ou fazer valer a sua decisão anterior. Confiram em fevereiro.

Lula, o diplomático

Luiz Inácio continuará caminhando pelos palanques. Aqui e alhures. Vai circular sob patrocínio de seu Instituto, cujas ações estarão voltadas para o continente africano e outras plagas onde ele poderá semear os programas sociais da era Lula, como Bolsa Família, Minha Casa, Minha Vida, Luz paraTodos etc. Lula deverá continuar a fazer perorações recheadas de metáforas e simbolismo. A mídia lhe dará visibilidade. Nesse ponto, emergirá a dissonância : apesar de falar como ex-presidente, seu discurso poderá ser entendido como a extensão do pensamento da presidente Dilma. Dor de cabeça para o Itamaraty. Pois a linha que embasa a visão da diplomacia brasileira será ajustada. Não conterá tanta ênfase em defesa de regimes como o do Irã. O país deve resgatar o bom relacionamento com as grandes Nações. Hoje, um pouco embaçado. O viés diplomático de Lula poderá prejudicar esse esforço.

Lula, o carismático

Pergunta recorrente : e o estoque de carisma de Lula não se esgotará ? Resposta : não, no curto prazo. O estoque tem massa suficiente para atravessar grandes distâncias.

A nova gestão

Vejo com otimismo o escopo da nova gestão pública que se inaugura no país sob a égide da responsabilidade : melhorar a qualidade dos serviços; reequilibrar as finanças; cortar despesas de custeio; revisar contratos; extinguir cargos comissionados; aumentar a eficiência do gasto público; promover um salto de desenvolvimento, socialmente equilibrado e ambientalmente equilibrado, e por aí vai. É natural que um repertório tão pleno de promessas sérias e boas intenções faça parte da rotina de quem começa a navegar o barco. Mas a saúde financeira dos Estados, de tão debilitada, impõe razoável dose de credibilidade ao discurso dos comandantes que assumem o leme até o final de 2014.

Pérolas da nova safra do ENEM

- Lavoisier foi guilhotinado por ter inventado o oxigênio.
- A harpa é uma asa que toca.
- O vento é uma imensa quantidade de ar.
- O terremoto é um pequeno movimento de terras não cultivadas.
- Os egípcios antigos desenvolveram a arte funerária para que os mortos pudessem viver melhor.

Passaportes

Não vejo corrupção no fato de representantes com mandato do povo terem direito a passaportes diplomáticos. Errado é concedê-los a amigos da Corte.

Blitzkrieg

Para alcançar êxito, os novos governantes deveriam se inspirar no princípio maquiavélico e realizar uma blitzkrieg agora, quando iniciam o ciclo administrativo. Entre o meio e o final de governo, será mais complexa a missão de reformar processos. Alguns conhecem a receita por já terem-na aplicada em seus Estados. Diminuir despesas de custeio é a primeira disposição. A folha de salários tem sido uma área crítica. Nos últimos 10 anos, os gastos com custeio nos Estados saíram do índice de 1,1% para mais de 6% do PIB.

PT X PMDB

Vamos convir : ninguém aguenta mais a lengalenga entre PT e PMDB. Muitos jornalistas, nesse interregno sem notícias de impacto, "cozinham" matérias : retocam velhas abordagens. Impressiona a capacidade de não dizer nada de novo e repetir o mantra : o fisiologismo do PMDB. Que coisa mais falsa. Todos os partidos são fisiológicos. E mais : fisiologia por fisiologia, quem está correndo com mais sede ao pote é o PT. Que tem 19 ministérios. Que nomeia cargos para o 2º escalão de maneira despudorada. Que invadiu territórios tradicionais daquele partido. O PSB, de Eduardo Campos, também se engalfinha. E pega seu filão. O PDT, idem. A maior parte dos articulistas tem preguiça de fazer conexões. E o PT acaba sendo elevado à condição de sigla incorruptível.

Mais pérolas do ENEM II

- A unidade de força é o Newton, que significa a força que se tem que realizar em um metro da unidade de tempo, no sentido contrário.
- Lenda é toda narração em prosa de um tema confuso.
- O nervo ótico transmite ideias luminosas ao cérebro.
- A febre amarela foi trazida da China por Marco Polo.
- Os ruminantes se distinguem dos outros animais porque o que comem, comem por duas vezes.

Cursinho

A Câmara decidiu abrir um curso para ensinar aos novos deputados suas funções e atividades. Não será uma Escolinha do Professor Raimundo. Mas Tiririca será um dos alunos.

Audácia é pouco

Algumas empresas de prestação de serviços são mesmo audaciosas. Arriscam-se a prestar serviços à Superintendência Regional do Trabalho em São Paulo, órgão fiscalizador das relações trabalhistas entre o patrão e o empregado, deixando de depositar o FGTS de seus colaboradores. Mas a virada já começou. Tais empresas fichas-sujas estão sendo afastadas e outras estão na mira da Superintendência.

Vender barato sai caro

Pesquisas apontam : a maior parte dos Policiais Militares feridos ou mortos em conflitos urbanos está a serviço de empresas que "vendem" serviços de segurança. São policiais que fazem "bico". Por isso mesmo, sem qualquer registro trabalhista ou outras obrigações legais, estes serviços são bem mais baratos que os prestados por Empresas Regulares de Segurança. Ocorre que o risco da atividade é transferido para o Estado. No caso de infortúnio, é o Estado que arcará com o custo do afastamento do serviço dos policiais e, até mesmo, com as consequências de sua morte. Urge acender uma lupa mais forte sobre empresas inescrupulosas.

Mais pérolas do ENEM III

- Péricles foi o principal ditador da democracia grega.
- O problema fundamental do terceiro mundo é a superabundância de necessidades.
- O petróleo apareceu há muitos séculos, numa época em que os peixes se afogavam dentro d'água.
- A principal função da raiz é se enterrar.
- A igreja, ultimamente, vem perdendo muita clientela.
- O sol nos dá luz, calor e turistas.
- As aves têm na boca um dente chamado bico.

O Harakiri de Aurélio

Aurélio Miguel, o vereador do PR na Câmara Municipal de SP, quer reinventar a tradição do Harakiri. Levou para o plenário da Casa uma espada sugerindo que o vereador Goulart (PMDB) fizesse dela uso em um Harakiri, costume dos samurais para a autopunição após uma derrota. Consistia no suicídio com um corte no estômago. O vereador Goulart obedeceu a decisão do seu partido em fechar questão e votou em José Police Neto (Netinho) para a presidência da Câmara. Atendendo à disposição do Diretório Municipal, honrou, portanto, o código partidário. Se Aurélio Miguel portasse efetivamente a bravura que quis demonstrar, poderia usar a espada curta (wakizashi) para praticar o ato honroso ante a derrota de seu candidato Milton Leite. Como era costume dos samurais.

Troccoli

A Itália decidiu dar refúgio ao uruguaio Jorge Troccoli, que teria contribuído para o desaparecimento de muitos oposicionistas da ditadura uruguaia. Alega que Troccoli, um dos agentes da Operação Condor, tem dupla cidadania. Perde força a Itália com a exigência de extradição de Cesare Battisti.

Mais pérolas do ENEM IV

- O coração é o único órgão que não deixa de funcionar 24 horas por dia.
- Quando um animal irracional não tem água para beber, só sobrevive se for empalhado.
- A insônia consiste em dormir ao contrário.
- A arquitetura gótica se notabilizou por fazer edifícios verticais.

Poetisa maior

Getúlio Vargas tinha uma admiração enorme pela poetisa Rosalina Coelho Lisboa, mulher de um dos diretores da Cia. Sul América de Seguros. Um dia, conversava com Agripino Grieco, o crítico feroz :

- Você não acha, Agripino, que a Rosalina é a maior poetisa do Brasil e da América do Sul ?

- Da América do Sul não direi, presidente, mas com toda a certeza ela é a maior da Sul América.

A novela da terceirização

A novela da Terceirização de Serviços se estende desde 1974, quando se aprovou a Lei do Trabalho Temporário (6.019). Depois, veio o Enunciado 331 do TST dando orientação para a Terceirização em atividades meio, distinguindo-as das atividades fim. Nos últimos anos, desenvolveram-se estratégias de ação e reação, de pressão e contrapressão. Projetos foram apresentados e alguns, como o 4302/98, até votados. Mas as resistências se tornaram insuperáveis, principalmente por parte da CNI, que não aceita a questão da solidariedade em substituição à responsabilidade subsidiária, nos termos da modificação do dispositivo aprovada pelo Senado.

Chegando ao consenso

Hoje, tramita um bom projeto para a Terceirização, de autoria do deputado Paulo Delgado (PT-MG), mas, para avançar, precisaria ser agregado aos outros que lá estão. Pano de fundo : já existe razoável consenso de que esta matéria chegou ao fundo do poço e precisa ser normatizada. Importantes lideranças pretendem caminhar com a ideia. O próprio Paulinho da Força Sindical acredita que chegou o momento de dar encaminhamento definitivo à matéria. Cândido Vaccarezza, líder do governo na Câmara, luta para chegar a um acordo. E o vice-presidente da República, Michel Temer, prontifica-se a continuar a luta pela aprovação das regras da Terceirização.

Sou solidário e não pago

Antônio Carlos Portela era um senhor rico e bom. Dava aval a todo o mundo, em Petrópolis. Gostava de política. Gostava demais. Quando chegava, a campanha eleitoral, sua maneira de ajudar os amigos era avalizar empréstimos para as despesas de campanha. Na última eleição, avalizou um título para um candidato a deputado, que perdeu feio e ficou em dificuldades de pagar. O gerente do banco, sabendo que não receberia do devedor, foi ao avalista :

- Senhor Portela, o título está vencido. Preciso que o senhor pague. Como avalista, o senhor é solidário.

- Sou, sim. Sou muito amigo dele e estou inteiramente solidário com ele. Se ele não pagou, é porque tem seus motivos. Porque estou solidário, não pago também.

Conselho às lideranças empresariais

Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes e líderes nacionais. Na última coluna, o espaço foi destinado à presidente Dilma Rousseff. Hoje, seu conselho se dirige às lideranças empresariais:

1. O território das relações do trabalho será intensamente ocupado pelas Centrais Sindicais no ciclo político-administrativo que se abre.

2. Em decorrência deste fato, os setores produtivos precisam definir focos de interesse, projetos prioritários, estratégias de ação político-institucional e escolha de parceiros para o longo percurso a ser caminhado.

3. Urge mapear projetos do interesse de cada setor; matérias em tramitação; relatores dos projetos; bancadas aliadas e engajadas com escopos doutrinários; presidentes e participantes de Comissões Técnicas no Senado e na Câmara; e definição de uma agenda institucional.

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Colunista

Gaudêncio Torquato jornalista, consultor de marketing institucional e político, consultor de comunicação organizacional, doutor, livre-docente e professor titular da Universidade de São Paulo e diretor-presidente da GT Marketing e Comunicação.