Política, Direito & Economia NA REAL

Política & Economia NA REAL n° 68

8/9/2009

Pré-sal : a fórmula financeira

Não resta dúvida de que o pré-sal é uma extraordinária e importante notícia. Trata-se da maior descoberta de petróleo desde 1976 quando foi descoberto o campo de Cantarell no México. A regulamentação apresentada pelo governo tem duas características gerais : (i) uma forte e decisiva regulação e participação do Estado, via Petrobras e (ii) uma fórmula política para viabilizar a proposta do governo. A Petrobras terá de aumentar o seu capital para bancar o papel a ela destinado nos investimentos do pré-sal. Para ter os direitos sobre cinco bilhões de barris da área do pré-sal a estatal terá de emitir ações. Para manter as suas posições os investidores terão de comprar tais ações, caso contrário haverá diluição desta participação. A grande dúvida é quanto valerão os direitos de exploração da área do pré-sal. Especialistas estimam em algo como US$ 5 e US$ 10 por barril. Por estas contas a Petrobras, terá de emitir entre US$ 25 e US$ 50 bilhões em ações. Estas contas e o papel de principal investidora no novo negócio do pré-sal tornam as ações da Petrobras muito mais arriscadas. Se antes havia o risco "político" relacionado com a gestão da empresa, agora os riscos operacionais e financeiros completam uma equação cujos resultados não são tão visíveis. Haverá muita inquietação com o tema nos próximos anos.

Pré-sal : a fórmula política

Ao contrário do que se comentou, o presidente Lula não deu razão aos governadores Sergio Cabral, José Serra e Paulo Hartung na questão da partilha dos royalties do pré-sal. Jogou o problema para o Congresso, onde espera que os outros 24 governadores massacrem seus colegas do Rio de Janeiro, de São Paulo e do Espírito Santo, num eventual embate nos plenários da Câmara e do Senado. O cálculo primário é simples : os três Estados contam com apenas 6 senadores e 126 deputados num Senado de 81 membros e uma Câmara de 513 parlamentares. Seria uma lavada. No entanto, a conta a ser feita é outra. O Rio de Janeiro, o mundo político, empresários, a sociedade de um modo geral, está se mobilizando para defender o que eles classificam como o interesse geral do Estado. O Rio tem mais de 11 milhões e meio de eleitores. É um dos Estados mais petistas e mais lulista e onde ele consegue seus melhores desempenhos na região Sul e Sudeste. Para se chegar ao eleitorado fluminense é preciso somar, por exemplo, o número de eleitores de Alagoas, Ceará, Maranhão e Sergipe. E o que pode acontecer caso a população do Rio fique convencida de que o presidente e sua preferida eleitoralmente trabalham para prejudicar o Estado na divisão dos dividendos do pré-sal ? Pode ser uma sangria de votos na candidatura de Dilma. Aliás, o mesmo pode ocorrer em São Paulo e no Espírito Santo, com mais de 26 milhões e meio de votos.

O efeito Marina -1

Até as vésperas do anúncio dos projetos de mudança do marco regulatório da área de petróleo, o Fundo Social que vai ser criado para distribuir recursos do pré-sal contemplaria apenas as áreas de saúde, educação e ciência de tecnologia. Miraculosamente, na festa-comício de segunda-feira, foi citado também o meio ambiente.

O efeito Marina – 2

Outro milagre : o governo já está arrancando da algibeira de promessas "um PAC" do Meio Ambiente.

O efeito Marina – 3

A expressão "desenvolvimento sustentável" foi incorporada ao vocabulário da ministra Dilma Roussef e vai frequentar cada vez mais o discurso da preferida de Lula.

Comendo pelas bordas

O governo está sendo muito bem sucedido nos seus esforços, comandado pelo senador Romero Jucá, de barrar os depoimentos mais explosivos que a oposição quer ouvir na CPI da Petrobras. A oposição requer e os aliados atropelam. Para não parecer que não querem qualquer apuração, aceitam depoimentos de técnicos do segundo escalão. A tática pode se revelar perigosa. Na semana passada, dois técnicos do TCU, depuseram sobre as auditorias feitas na refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, e demonstraram que a própria companhia admitiu sobrepreço de R$ 64 milhões na obra e está renegociando pelo menos dois contratos. Pego de surpresa, Jucá tentou desqualificar os técnicos, tática que já não funciona mais. Sem alardes, sem depoimentos pirotécnicos, a oposição está formando um bom acervo sobre alguns negócios da Petrobras. Um manancial para um relatório que pode não agradar ao governo.

Esqueçam o que eu disse : biocombustíveis

Quando ainda tinha os biocombustíveis como um dos carros-chefe de seus discursos, principalmente fora do Brasil, um dos argumentos do presidente Lula para defender o etanol brasileiro era o de que ele era um combustível limpo, renovável, ao contrário do petróleo. O presidente aparecia como um arauto do fim da era dos combustíveis fósseis. Toda esta pregação quase religiosa foi para debaixo do tapete na euforia do pré-sal. Tudo é marketing. Agora, será preciso ajustar o discurso para a reunião sobre mudanças climáticas em dezembro, na Noruega.

Classificados petrolíferos

Os projetos do pré-sal nem bem começaram a tramitar no Congresso e já é violenta a briga nos bastidores pelos cargos na "Petro-Sal", 130 empregos inicialmente, entre eles uma presidência e no mínimo uma meia dúzia de diretorias. Preenchidos sem concurso e com salários de mercado, ou seja, sem a necessidade de obedecer ao teto de remuneração dos servidores públicos de carreira. PMDB e PT já estão recolhendo currículos.

No galinheiro

Peemedebistas e aliados outros no Senado estão se articulando para indicar o senador Renan Calheiros para relator os projetos do pré-sal numa das comissões pela qual eles deverão passar na casa dos senadores.

As duas faces do FGTS

Nos últimos meses o governo Lula liberou cerca de R$ 8 bilhões do FGTS para capitalizar empresas do setor de construção civil. O mesmo governo está barrando o uso do FGTS pelos trabalhadores para comprar ações da Petrobras. Quem comprou ações da estatal com dinheiro do FGTS, no governo Fernando Henrique Cardoso, teve seu capital valorizado em mais de 800%. No mesmo período, o Fundo rendeu pouco mais de 50%. Agora temos o pré-sal e a necessidade de capitalização da Petrobras. O governo não deveria reavaliar o tema ?

G-20 : a discórdia sobre os estímulos

O encontro neste último fim de semana dos ministros responsáveis pela economia e os presidentes dos bancos centrais das vinte maiores economias mundiais foi concluído com duas importantes concordâncias e uma substancial discordância. No que se refere ao sistema financeiro, os ministros avaliaram que seria importante dar uma passo à frente e regulamentar o pagamento de bônus aos administradores dos bancos, bem como traçar novas regras sobre a capitalização das instituições financeiras (aumentar os requisitos de capital do sistema financeiro). Do ponto de vista da manutenção dos estímulos fiscais e monetários, já há desacordo : alguns ministros já sinalizam que devem iniciar um maior aperto monetário e fiscal a partir do final deste ano. Nenhum ministro das principais economias (G-7) deseja estar comprometido com metas econômicas que os impeçam de mudar de política, caso se perceba que a crise está sendo superada.

G-20 e os EUA

O G-20 é hoje o principal fórum econômico para discussão de temas multilaterais. Foi fortalecido em função do fato de que alguns países emergentes (China e Índia, sobretudo) passaram a ser financiadores fundamentais dos déficits fiscais dos EUA. A importância do G-20 está diretamente relacionada com o equacionamento do déficit americano. Maior o déficit, mais importante o G-20. E vice-versa. A importância "política" do G-20 é muito relativa, embora se faça muito alarde com o tema, inclusive no Planalto Central brasileiro.

Radar "NA REAL"

Não há muita novidade no front econômico e financeiro na volta das férias no hemisfério norte. Embora não existam sinais vitais de que a recuperação tenha começado nos EUA – há apenas uma "estabilização dos indicadores" -, em outras economias importantes (França, Alemanha e Japão) já há sinais mais vigorosos. As moedas principais estão estáveis entre si, este é um ótimo sinal, as bolsas não apresentam maiores variações (positivas e negativas) e as taxas de juros dos títulos de renda fixa, sobretudo os do tesouro norte-americano, estão em consonância com o momento em que vivemos. De nosso lado, não alteramos o nosso radar. O momento é de transição. Alguma "realização de lucros" pode haver, mas o que os investidores esperam mesmo são indicadores novos e positivos de consumo e investimento. A crise passou, mas a recuperação ainda não é visível. O momento é de moderação das expectativas. Nada de pessimismo, mas também não há razão para euforia.

4/9/9

TENDÊNCIA

SEGMENTO

Cotação

Curto prazo

Médio Prazo

Juros ¹

- Pré-fixados

NA

estável

alta

- Pós-Fixados

NA

estável

estável/alta

Câmbio ²

- EURO

1,4330

estável/alta

alta

- REAL

1,8450

estável/baixa

alta

Mercado Acionário

- Ibovespa

56.652,28

estável/queda

estável/alta

- S&P 500

1.016,40

estável/queda

alta

- NASDAQ

2.018,78

estável/queda

alta

(1) – Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais)
(2) – Em relação ao dólar norte-americano
NA – Não aplicável

Mais uma da Índia

A indústria automobilística indiana tem um mercado que representa 19% do tamanho do mercado chinês. Neste ano, a Índia deve se tornar maior exportadora de autos que a China e deve superar em poucos anos a Coréia do Sul e Tailândia como centro produtor. Os aspectos positivos indianos são a mão-de-obra barata e uma eficiente política industrial (combinação de impostos baixos e estímulos de investimentos públicos) que atrai indústrias internacionais para o país. Há ainda o aspecto ecológico : assim como o Japão, a Índia dedica-se à exportação de veículos leves e de baixo consumo de combustível, enquanto outros países asiáticos estão com a produção de veículos menos "ecológicos". A Índia deve ser maior destaque dentre os países emergentes neste futuro próximo. Os sinais vindos daquele país são promissores. A indústria automobilística é mais um destes sinais.

Panorama visto de Minas - 1

O governador Aécio Neves vai vender muito caro a condição de candidato do PSDB à Presidência da República. Aécio, indicam assessores, não vai rachar o tucanato nem fazer "beicinho" se não for o escolhido. Mas não aceita o fato consumado da candidatura irreversível de José Serra como alguns tucanos apregoam. De quando em vez, alguém "planta" na imprensa que ele aceitou ser o vice numa chapa pura do PSDB. Não é fato e dificilmente o será.

Panorama visto de Minas - 2

O governador José Serra, se vier a ser o candidato do PSDB, só terá uma votação expressiva em Minas Gerais se o acordo dos tucanos for transparente e com Aécio satisfeito. Se os mineiros sentirem que Aécio foi passado para trás a coisa não funciona.

Disputa vice-presidencial

Cresce a disputa entre os aliados para ver quem será o candidato a vice na chapa de Dilma, um cargo no Brasil meramente decorativo e honorífico. De um entusiasmado Michel Temer na cerimônia de lançamento do pré-sal.

"Este é um projeto extraordinário! Podemos comemorar 50 anos depois um novo mote nacionalista : o pré-sal, presidente, é nosso".

Trem bala

De um especialista na questão de transportes :

1. O trem bala não sai sem muito dinheiro federal. E o governo já está disposto a bancar pelo menos 70% de seus custos (R$ 34 bilhões). O discurso oficial é de que será uma obra para a iniciativa privada.

2. O trem só é verdadeiramente rentável no trecho Campinas- São Paulo- São José dos Campos. Ao fim das contas, somente este trecho será tocado a tempo da Copa de 2014. O Rio de Janeiro corre o risco de ficar olhando para o vento.

A palavra do lobista Dirceu

Como se sabe, José Dirceu foi cassado em função de seu envolvimento com o "mensalão". Faz hoje política de bastidor como no caso da renúncia do irrenunciável Aloysio Mercadante – foi ele quem articulou politicamente para que o senador paulista ficasse no cargo. Além de política de bastidor, José Dirceu faz lobby. Vejamos o que o líder da esquerda revolucionária nos anos sessenta diz em seu blog sobre o Trem de Alta Velocidade (TAV) :

"Precisaremos, realmente, de recursos do BNDES, mas acredito que os fornecedores de material rodante e dos sistemas de segurança e comunicação tem muito interesse em financiar o TAV. E temos a vantagem, nesse momento em que encaminhamos sua implantação, de contar com recursos para esse tipo de investimento no mundo, principalmente da parte dos fornecedores, Japão, China, França, Estados Unidos e Alemanha."

Estará José Dirceu trabalhando para alguém neste caso ?

Uma calculadora nova

O Ministério do Planejamento esqueceu-se de prever na linha de despesas do Orçamento de 2010, recursos para o ressarcimento aos estados da Lei Kandir, verbas para o pagamento do reajuste dos aposentados que ganham acima do salário mínimo, acertado por Lula com os sindicatos, e ainda recursos para novas despesas com pessoal, aumentos e contratações, decididas na última semana. Somente os dois primeiros "esquecimentos" gerarão despesas adicionais de R$ 8,2 bilhões. Além do mais, o ministério de Paulo Bernardo imagina que o governo arrecadará R$ 110 bilhões a mais em 2010 do que arrecadará este ano e mais do que recolheu no "glorioso" ano de 2008.

Nada de imposto novo

A base aliada desistiu de atender ao pedido do ministro da Saúde José Gomes Temporão para restabelecer a CPMF, apelidada de Contribuição Social para a Saúde (CSS). Por razões meramente eleitorais, não porque acha que o brasileiro paga imposto demais para serviços públicos de menos.

A Internet e as eleições

É ridícula, senão inútil, as propostas aprovadas pelo Senado Federal que dão conta da censura aos comentários sobre políticos na internet durante o processo eleitoral de 2010. O relator da proposta é o tucano mineiro Eduardo Azeredo. Se até o dia 3 de outubro não for rejeitada, terá força de lei. Enquanto Obama se elegeu nos EUA democraticamente por meio de campanha cujo principal fator de articulação foi a rede mundial, no Brasil a internet será isolada do processo como se isto fosse possível.

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Colunista

Francisco Petros Advogado, especializado em direito societário, compliance e governança corporativa. Também é economista e MBA. No mercado de capitais brasileiro dirigiu instituições financeiras e de administração de recursos. Foi vice-presidente e presidente da seção paulista da ABAMEC – Associação Brasileira dos Analistas do Mercado de Capitais e Presidente do Comitê de Supervisão dos Analistas de Investimento. É membro do IASP - Instituto dos Advogados de São Paulo e do Corpo de Árbitros da B3, a Bolsa Brasileira, Membro Consultor para a Comissão Especial de Mercado de Capitais da OAB – Nacional. Atua como conselheiro de administração de empresas de capital aberto e fechado.