Política, Direito & Economia NA REAL

Política & Economia NA REAL n° 62

28/7/2009
 

Dólar cai no mundo

Na semana passada foi reforçada a tendência de queda do dólar norte-americano em relação a quase todas as moedas relevantes do mundo. Em relação ao euro, a barreira dos 1,40 euro / US$ 1,00 foi superada. Interessante notar que esta queda do dólar veio no exato momento em que surgiram novos sinais de que a maior economia mundial está se estabilizando. Na semana passada foram divulgados novos dados sobre o setor imobiliário dos EUA e os números, senão promissores, mostraram sinais evidentes de estabilização. O presidente do Fed, Ben Bernanke, deu declarações de que "apoia a política do dólar forte". O mercado desprezou tais declarações e os investidores continuaram a buscar oportunidades para arbitrar taxas de juros mais baixas (como a dos EUA e a do Reino Unido) e mais altas (Brasil, Indonésia, Filipinas, etc). Resultado : queda generalizada do dólar no mundo no exato momento em que a volatilidade (risco) cai para os níveis anteriores à fase aguda da atual crise (em setembro do ano passado).

Dólar cai no Brasil

O fortalecimento do Real em relação ao dólar norte-americano é um fenômeno mundial. Trata-se de um fenômeno tipicamente financeiro, motivado pelo fluxo de capital ao redor do mundo. Desta feita, os investidores buscam moedas mais específicas como é o caso do Real. Estão em busca de mais rentabilidade por meio das chamadas operações de "carry trade" (investimento em títulos de renda fixa denominados na moeda local). Há pouca relação destas operações com os chamados "fundamentos". Tudo é mera arbitragem para não dizer "jogada financeira". Os investidores não estão nem aí se há uma crise no Congresso brasileiro, se a economia cresce ou se há riscos fiscais. O único dado importante é se o ganho de curto prazo pode ser realizado e remetido para o país de origem. O resto é "bobagem". Tudo isto deve durar até o fim do ano. Pelo menos.

Governo não tem como segurar o dólar

Não tenhamos dúvidas. O governo e o BC não têm muito a fazer para salvar as exportações da valorização do Real. Dentro do atual regime de câmbio e das regras cambiais a valorização do Real é inevitável. Pode haver muita conversa sobre o assunto, mas tudo vai ficar no blábláblá. O governo não vai enfrentar os investidores financeiros e apenas adulará os exportadores com palavras e algum apoio de crédito.

A bolsa brasileira está cara ?

Desde o final do ano passado, registramos nesta coluna o nosso otimismo de que a recuperação da economia brasileira fosse mais rápida que a média mundial, embora abaixo da Índia e China, países que continuam crescendo com muito mais vigor. A bolsa brasileira subiu muito ao longo dos últimos meses, mais de 40% em termos reais, reflexo da melhor percepção em relação ao país, mas também em função das arbitragens dos investidores internacionais que estavam em busca de ativos em outras moedas que não fosse o dólar. A bolsa brasileira, assim como as de ouros países emergentes, tem uma forte correlação com as cotações das commodities. A recuperação dos preços de alguns produtos primários também ajudou a alavancar as cotações das ações. Em nossa opinião, daqui para frente a bolsa brasileira deve ter um comportamento bem mais moderado. É provável que as bolsas dos países desenvolvidos andem à frente da bolsa brasileira em função de alguns sinais de estabilização e crescimento nestes países. Há ainda um ponto importante : os fundamentos da economia brasileira no curto prazo (seis meses à frente) são bons. Todavia, os riscos fiscais de médio prazo são relevantes e estes não estão "contabilizados" pelos investidores. Vejamos as notas abaixo.

Em tempo : investimentos estrangeiros no mercado de ações e renda fixa

Os investimentos estrangeiros na bolsa brasileira foram negativos em US$ 85 milhões em junho. Em maio tinham entrado US$ 2,5 bi. No ano, o ingresso líquido foi de R$ 3 bi. Nenhum sinal de saída, mas as entradas estão modestas. Na renda fixa o saldo do semestre é de US$ 768 milhões, sendo que em junho as entradas foram de US$ 1,9 bi.

Síndrome eleitoral...

Henrique Meirelles – mas não apenas somente ele – tem sido o principal pregoeiro da tese de que os elevados juros que estão sendo "comprados" e "vendidos" no mercado futuro já seriam a "precificação" dos embates eleitorais de 2010, por causa das incertezas sobre o que virá depois de Lula. E, naturalmente, depois dele, Meirelles ! Fala-se num "risco Dilma" e num "risco Serra", principalmente sobre o segundo. Até gente que sofreu em 2002 com o "risco Lula" e o "lulômetro" abraça tal tese. Ela já frequenta inclusive análises políticas de consultores de instituições financeiras. Não seria mais prudente e objetivo procurar outras razões para esse descolamento dos juros futuros ?

... e síndrome real

Um levantamento do site "Contas Abertas", especializado em análises de orçamentos públicos, com base nos dados do Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal), dá muito mais indícios de que a alta dos juros futuros pode estar mais baseada em preocupações com o mundo real e muito menos em elucubrações eleitorais. São dados quentíssimos dos gastos federais, do primeiro trimestre de 2009, comparados com o mesmo período de 2009. Veja-se :

1. Com pessoal as despesas cresceram de 4,74% do PIB para 5,53%, um aumento de 0,79% equivalente a R$ 10,5 bilhões.

2. Os gastos com a máquina administrativa passaram 15,05% do PIB para 16,96%, 1,91% de crescimento e despesas adicionais de R$ 24,3 bilhões.

3. O dispêndio com investimentos passou de 0,67% do PIB para 0,77%, 0,10 ponto percentual superior, gastos suplementares de R$ 1,3 bilhão.

Pelo que se vê, a política "anticíclica" de Brasília não parece propriamente dirigida para ampliar a infra-estrutura nacional. E é esse excesso de gastos mal direcionados que preocupa no longo e no médio prazo.

O susto eleitoral

Há festas no mercado financeiro e no governo pela "retomada" da economia brasileira. De fato, existem muitos sinais positivos, como, por exemplo, a redução do desemprego em junho. Porém há dados que precisam ser considerados, pesados e medidos para não mergulharmos num otimismo exagerado, que pode ter conseqüências perigosas mais à frente.

1. O seguro-desemprego no primeiro semestre do ano foi sacado por cerca de 4,1 milhões de pessoas demitidas.

2. Segundo diversos especialistas, a diminuição do desemprego se deu em boa parte pelo "desalento", o aumento do número de desempregados que desistiu de procurar emprego.

3. Os saques do FGTS no primeiro semestre foram 24,6% maiores na comparação 2009-2008.

4. O consumo de energia, um bom indicador da atividade econômica, foi 2,7% menor no mês passado.

5. O setor siderúrgico suspendeu investimentos previstos no valor de R$ 26 bilhões; o de papel e celulose, de R$ 12 bilhões.

Radar NA REAL

O destaque da semana passada foi a queda inédita (desde o período anterior ao início da crise) do dólar em relação ao Real. Como explicamos nas notas acima, trata-se de um fenômeno mundial. Esta tendência de queda veio para ficar (no curto prazo). De outro lado, o BC reduziu a Selic para 8,75%. Tudo dentro do esperado. O que vai ocorrer daqui para frente dependerá menos da inflação (que deve ficar baixa) e muito mais da política (eleições do ano que vem e a influência do governo sobre o BC). A situação fiscal se deteriora e são as preocupações com o médio prazo das contas públicas que têm contribuído para a relativa estabilidade das cotações dos títulos prefixados com prazo de vencimento em 2010 e 2011. (Veja notas acima sobre as contas fiscais).

24/7/9

 

TENDÊNCIA

SEGMENTO

Cotação

Curto prazo

Médio Prazo

Juros ¹

 

 

 

 - Pré-fixados

NA

estável

alta

 - Pós-Fixados

NA

estável

estável/alta

Câmbio ²

 

 

 

 - EURO

1,423

alta

alta

 - REAL

1,890

estável

alta

Mercado Acionário

 

 

 

 - Ibovespa

54.457,29

estável

estável/alta

 - S&P 500

979,26

estável

alta

 - NASDAQ

1.995,96

estável/queda

alta

BC dos EUA sob pressão

Não é pouco o trabalho que está a despender o presidente do Fed, Ben Bernanke. Ele tem gastado muita saliva pregando junto ao Congresso e à opinião pública norte-americana que as recentes ações do banco central são justificadas para que se evite uma nova Grande Depressão semelhante à dos anos 30. Além disto, Bernanke procura deixar mais claro (mesmo que não seja completamente possível) como a autoridade monetária vai sair desta política de enorme complacência na concessão de créditos ao sistema financeiro e das taxas de juros negativas (em relação à inflação). Muitos acreditam num cenário de alta da inflação nos próximos anos em função da enorme expansão monetária e fiscal dos EUA. Esta tarefa de Bernanke prosseguirá nos próximos meses. As dúvidas também.

Por aqui, ninguém questiona

Com o Congresso paralisado pelas pelejas corporativas e safadezas com o dinheiro público, não existe o menor questionamento dos políticos, seja dos parlamentares que suportam o governo, seja a débil oposição, em relação a "como o país sairá da atual política de estímulo fiscal e monetário". A mesma pergunta que se faz alhures é perfeitamente cabível por aqui. O bolso do cidadão brasileiro está sob risco e ninguém na área política se importa com isto. O vazio político é assustador.

Uma solução delicada

Será mais complicada do que se imagina a substituição de Henrique Meirelles no BC, quando ele sair para brigar pelo governo de Goiás. Como será um mandato tampão, de nove meses, dificilmente se encontrará um nome de prestígio na área para ir a Brasília. Além do mais, as insatisfações quase públicas de Lula e Guido Mantega com o que eles classificam de excesso de autonomia do BC, também afastam possíveis interessados no lugar. Tudo indica que a solução será "caseira" e a preferência é pelo diretor de Normas e Organização do Sistema Financeiro da instituição, Alexandre Tombini. Tombini é funcionário de carreira do BC, tem sólida formação econômica, porém é tido como um dos ponta-de-lança de Mantega na diretoria dirigida por Meirelles e tem sido apontado como o principal opositor ao conservadorismo dos ditos "mercadistas" da casa. Caso sua indicação não seja bem absorvida externamente, isto pode gerar inquietações no mundo do dinheiro em ano eleitoral.

Opção

Se Lula continuar dizendo que só será candidato novamente à presidência da República em 2014 se a ministra Dilma Roussef não se eleger no ano que vem, as pessoas podem começar a acreditar que ele escolheu a companheira, neófita nessa matéria de urnas, apenas para ser derrotada. E abrir caminho... Aliás, essa suspeita rondou FHC em 2002, na disputa em que Lula venceu Serra. Os maldosos diziam que FHC estava mesmo era de olho num retorno em 2006. Se fato, viu-se que não deu certo.

Nova corrida do ouro

Os números não estão totalmente fechados, mas calcula-se que cerca de 20 dos atuais ministros de Lula deixarão o governo até abril para concorrer a algum cargo eletivo. A data ainda está distante, mas já começou a corrida pelos lugares. Como Lula disse que vai fazer a substituição natural, promovendo o secretário Executivo ao primeiro posto, os titulares tratam de levar para este lugar homens de sua inteira confiança – confiança eleitoral. Muitos dos atuais vice-ministros foram postos lá sem consulta ao seu superior, para tocar o ministério ou até vigiar o chefe da pasta. Lula cedeu aos partidos, porém quis ter algum tipo de segurança.

Qual a real intenção ?

O que pretende Lula com a candidatura de Ciro Gomes em SP com o apoio (constrangido) do PT ? Espezinhar Serra e os tucanos ? Ter um candidato governista que pode ser tornar competitivo no maior Estado da Federação ? Afastar Ciro da disputa presidencial para evitar que ele tire votos de Dilma ?

Tudo pelo social - I

Em entrevista ao The Wall Street Journal, Julius Genachowski, o novo presidente da Comissão Federal de Comunicações, a ANATEL dos EUA, informou que ampliar a oferta de banda larga da Internet é a prioridade de sua gestão por ser "o mais bem-sucedido indutor de crescimento econômico" no país. Enquanto isto, num certo país tropical, dormem nos cofres do Tesouro Nacional mais de R$ 7 bi do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST), o que correspondente a 1% das contas que os usuários pagam por esses serviços. Sem utilização por falta de regulamentação e por deficiências operacionais. Aliás, totalmente sem uso não : mais de R$ 2 bilhões foram jogados no superávit primário e nunca mais voltarão a seu destino.

Tudo pelo social – II

O MPF está cobrando do governo o envio para o ministério da Saúde de R$ 5,8 bi que ele deixou de gastar na área de 2000 a 2008 por não seguir estritamente o que determina a CF/88. Há mais de um ano está pronto para ser votado na Câmara, depois de ser aprovado no Senado, o PL regulamentando a EC 29, que estabelece os percentuais a serem aplicados pelos governos federal, estaduais e municipais nos serviços médico-hospitalares públicos. Embora o governo tenha ampla maioria de deputados, o PL não anda por orientação expressa dos ministros da Fazenda e do Planejamento aos líderes da bancada aliada. Em sua última apresentação ao prefeitos, Lula exortou-os a pressionar os deputados nessa questão. Ela agora vem com um jabuti : a Contribuição Social para a Saúde, uma nova CPMF com alíquota de 0,10%. Como o "tudo pelo social" é também o "tudo pelo eleitoral", podem preparar o bolso.

Corrida ao cofre

Não é de tranquilidade o clima na base aliada do Congresso, nem no Senado, obviamente, nem na Câmara. A insatisfação tem nome e sobrenome : emenda parlamentar. Até agora, nem 10% delas foram efetivamente pagas pelo erário. E congressista faminto é um perigo.

Ele ainda está firme

Não se iludam. Embora o PT tenha puxado parte do seu tapete dos pés do senador José Sarney, o presidente do Senado não dá sinais de que vá desistir. Ele tem armas poderosas – a CPI da Petrobras, a esquecida CPI do DNIT (direto na veia do ministério dos Transportes) e outras começarão a ser apresentadas esta semana. É mais fácil o senador Aloizio Mercadante ouvir uma reprimenda pela nota de sexta-feira pedindo a Sarney para sair de licença do que Lula abandonar agora o senador maranhense.

Pergunta inocente

Vale repetir : alguém tem notícias da oposição e seus candidatos à presidência da República ? Falamos de notícias, fatos, não de futriquinhas políticas. Por exemplo, o governo está prestes a lançar a proposta sobre as novas regras para exploração de petróleo no Brasil, à luz das descobertas do pré-sal, e o que pensa a oposição sobre isso ? Por falar em pré-sal, noves foram os balões de ensaio do ministro Edison Lobão que não é propriamente um expert no assunto e nem tem grande poder de decisão na área. O governo está cada vez mais enrolado na definição das novas regras.

O Cade "tá contigo"

A multa milionária (para os padrões brasileiros), aplicada pelo Cade à Ambev por práticas anticoncorrenciais no programa "Tô Contigo" de relacionamento com seus clientes, pode estar marcando uma importante guinada na atuação do órgão. Mais condizente com o que indica o seu próprio nome e menos focado nas questões de macroeconomia e de economia empresarial. A nova linha desenhada pelo Cade coincide com a nomeação de seu novo presidente, Arthur Badin. Parece que não foi sem razão que algumas grandes empresas nacionais fizeram fortes pressões no Senado para não aprovar o nome do advogado. Nos próximos meses o Cade tem uma agenda explosiva pela frente. Estão para passar pelo seu crivo a compra da Brasil Telecom pela Oi, a compra da Sadia pelo Perdigão e a aquisição do Ponto Frio pelo Pão de Açúcar, entre outros.

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Colunista

Francisco Petros Advogado, especializado em direito societário, compliance e governança corporativa. Também é economista e MBA. No mercado de capitais brasileiro dirigiu instituições financeiras e de administração de recursos. Foi vice-presidente e presidente da seção paulista da ABAMEC – Associação Brasileira dos Analistas do Mercado de Capitais e Presidente do Comitê de Supervisão dos Analistas de Investimento. É membro do IASP - Instituto dos Advogados de São Paulo e do Corpo de Árbitros da B3, a Bolsa Brasileira, Membro Consultor para a Comissão Especial de Mercado de Capitais da OAB – Nacional. Atua como conselheiro de administração de empresas de capital aberto e fechado.