A crise econômica bate na política
É apenas aparente a tranqüilidade que o governo exibe de público a respeito dos efeitos da crise econômica mundial sobre a economia nacional. Faz parte do papel do governo tentar conter o pessimismo. Em muitos casos, as expectativas transformam-se em realidade. No íntimo, porém, a preocupação é grande. Não só pelos estragos que pode fazer na economia, ainda não totalmente mensuráveis, mas principalmente pelos desarranjos que pode provocar nos projetos políticos do presidente Lula e de seu partido, o PT - os outros partidos da base aliada podem pular do barco a qualquer hora. Lula sabe que boa parte de sua popularidade está ligada à boa fase econômica que o país vive, que permitiu a queda do desemprego e o aumento da renda dos assalariados. Não há nenhum milagre. Por isso, o quase "desespero" governista de encontrar fórmulas de combater os efeitos da crise sem ter de apelar para remédios muito amargos que impliquem pesados cortes de gastos ou sacrifícios em programas que ele considera essenciais. E a equipe econômica ainda não achou o roteiro do milagre. O que explica em parte certas tergiversações, certas vacilações e os desencontros de opinião entre o ministério da Fazenda e o BC.
A política econômica do Brasil I
Segue preocupante o andamento das políticas "anti-cíclicas" do governo Lula. Como ressaltamos por diversas vezes nesta coluna, isso não se deve propriamente ao fato de que as políticas de expansão do crédito sejam inadequadas. A questão vital é outra : falta uma política coordenada e integrada e não apenas partes dela. A cada dia a crise internacional se espalha por aqui e é preciso se antecipar aos seus efeitos. Veja o caso do setor agrícola, cujo crédito se contraiu velozmente no exato momento em que os preços das commodities em geral estão a despencar mundo afora. Há sinais de que as empresas supridoras de insumos agrícolas estão reduzindo o volume dos seus adiantamentos, os agricultores estão plantando menos e o segmento de implementos agrícolas está com a produção despencando, algo ao redor de 20% já nestes últimos dois meses.
A política econômica do Brasil II
Portanto, o ponto é que a discussão sobre a macroeconomia brasileira não se resume apenas à questão da taxa de juros ou dos investimentos do PAC. O governo Lula deveria criar um programa exclusivo para "tratar" da crise. Amplo e que mostrasse de maneira transparente e consistente o que está sendo feito para reduzir os efeitos da crise externa. Há também que se ampliar a despesa de comunicação social de forma a tentar influenciar todas as camadas da população em relação à deterioração de expectativas.
O mercado está de olho na recessão...
Os próximos passos do BC em relação à taxa de juros certamente não são o assunto mais relevante para o mercado financeiro e de capital. O que se está tentando estimar é o tamanho da crise. As notícias sobre vendas fracas em quase todos os setores econômicos estão assustando investidores e bancos. Estamos assistindo neste exato momento a mais uma rodada de contração de crédito, embora os números divulgados pelo BC ainda não evidenciem isso. A primeira rodada veio com a crise aguda dos bancos norte-americanos. Agora, os bancos estão a verificar que a crise está se espalhando rapidamente. Foi por esta razão que o crédito dos bancos privados subiu apenas 1,8% em outubro, comparativamente a setembro, e os dos bancos públicos aumentou 5,2%.
...e também no Copom
Já começaram as apostas sobre como o Copom do BC se comportará na semana que vem, em sua última reunião do ano. Pelas últimas declarações de Henrique Meirelles, tudo deve ficar como está. O resto do governo, a começar do presidente Lula, porém, não concorda. Já se pôde ver nos jornais do fim de semana as pressões indiretas de sempre para forçar o diretores do BC a tocarem na Selic. Para baixo.
Barak já é Presidente ?
As pressões para que Barak Obama lance um plano amplo e substantivo no sentido de conter a recessão estão aumentando mesmo que o presidente não tenha feito o seu juramento presidencial, previsto para o dia 20/1/09. O consumo e o investimento nos EUA estão a cair de forma acentuada e acima do esperado. Em outubro, o consumo regrediu 1%, o que somente ocorreu sete vezes desde 1959. A confiança dos empresários está no nível mais baixo dos últimos 25 anos e o investimento das empresas deve cair para patamares ao redor de 1980. Note-se que há pouco espaço para os governos de Estados e municípios americanos investir em função da Lei de Responsabilidade fiscal. Portanto, nada compensa no curto prazo.
Barak agirá ?
Há pontos a favor para que Obama apresente o seu plano de recuperação econômica. Fundamentalmente, é preciso evitar que as expectativas se deteriorem ainda mais e com mais velocidade, sobretudo após as festas de fim de ano. O outro lado da moeda é que uma decepção agora seria fatal para o governo do primeiro presidente negro da história dos EUA. Além disso, ao mesmo tempo em que há muito a ser feito pelo governo neste momento, há pouco espaço no orçamento das famílias para consumir. Estas estão endividadas e, muitas delas, desempregadas.
Anote aí.
O contexto para Obama é muito difícil e, sob muitos aspectos, é impossível. Assim, qualquer estratégia empresarial ou de investimentos pessoais tem de contemplar extrema atenção aos primeiros passos. Sejam os de agora, sejam os do futuro. Os EUA representam um quarto da economia mundial. É de lá que virão os sinais de recuperação ou depressão. A China será ou não o fator de aceleração deste processo. Dependendo do que acontecer a partir de Obama ficará mais evidente se a crise será séria ou trágica.
Os bancos estatais
Não é segredo para ninguém que o governo quer ampliar o poder e a participação dos bancos oficiais no sistema financeiro nacional. Está aí a MP 443 que não deixa ninguém mentir. O governo alega razões "técnicas" para incentivar a competição. Semana passada ele mandou o BB os spreads de seus empréstimos para forçar os bancos privados a seguirem a mesma trilha. O BNDES está muito perto de virar um "banco de varejo" nesta época de crise. Pode ser que as ações, emergencialmente, se expliquem. No longo prazo, há riscos. O uso político dos bancos estatais no Brasil é uma história recorrente, com prejuízos sempre pagos pelo contribuinte. Sabe-se que o Proes (dos bancos públicos) custou mais de cinco vezes o Proer (para os bancos privados). No último relatório do BC sobre o setor financeiro verificou-se a diferença entre uns e outros : a inadimplência nos bancos oficiais, em outubro, estava em 8,9% ; nos bancos privados nacionais em 4,8% ; nos bancos estrangeiros em 3,7% (aqui no Brasil, porque lá fora...).
Banco do Brasil e as compras
Ainda assim, a ansiedade na diretoria e no conselho do Banco do Brasil é gigantesca ! Há um enorme inconformismo com o fato de que o banco estatal não é mais o maior do Brasil. O Banco está planejando comprar outras instituições de forma agressiva para retornar a ser o primeirão da fila... Resta saber quais os riscos para os investidores em suas ações e para a Viúva.
Petrobras e a falta de transparência
A Petrobras é uma empresa estatal de capital aberto e tem de prestar todas as informações relevantes no que se refere ao seu desempenho operacional e financeiro. É claro que é preocupante que a estatal esteja recorrendo a empréstimos de curto prazo para pagar salários e impostos. Todavia, é comum que as empresas em geral recorram a tais empréstimos. O mais preocupante é que as notícias da empresa indiquem grandes investimentos, inclusive no "famoso" pré-sal enquanto lhe faltam recursos de curto prazo. Além disso, analistas e investidores estão preocupados com o aumento sistemático de despesas indiretas com pessoal e outros gastos da estatal. Num momento em que o preço do petróleo gravita ao redor de US$ 50/barril é bom ficar de olho : a Petrobras pode ser o novo "mico" do mercado de ações.
Citibank : começou o processo de venda de ativos ?
O Citibank anunciou que está vendendo a NikkoCiti Trust and Banking, uma pequena instituição japonesa que faz custódia e processamento de ativos do mercado financeiro. O ex-gigante banco norte-americano está lutando para equilibrar as suas cotações na bolsa bem como as suas finanças. A venda da filial brasileira é uma possibilidade, mesmo que não existam informações formais sobre o tema. Muita gente por aqui está de olho nesta oportunidade.
Rubin, o bem pago
O ex-secretário do Tesouro dos EUA durante a gestão de Bill Clinton, Robert Rubin, ganhou US$ 115 milhões - exclusive opções - para comprar ações desde 1999. Ele é membro do board do Citibank, um banco perto do colapso. Rubin é daqueles queridinhos do mercado financeiro e dos políticos (inclusive de Obama). Foi cotado para retornar ao Tesouro dos EUA. Recusou, é claro ! É mais fácil ganhar dinheiro num banco que, a despeito do fracasso, lhe dá excelente retorno.
As brigas na teles
O mercado financeiro e o setor de telecomunicações foram bombardeados na semana passada com a notícia de que a Telecom Itália (TI) estaria disposta a vender a TIM no Brasil para suprir seu caixa. A informação foi prontamente desmentida aqui e não há indicações seguras de que isso esteja para ocorrer. De qualquer modo, há um nó na área de telefonia móvel no Brasil que precisará em algum momento ser desatado. A Telefônica é sócia da Vivo junto com a Portugal Telecom. Por estar também na TI, indiretamente participa da TIM no Brasil. Por um acerto com as autoridades brasileiras, a espanhola não tem ingerência na empresa brasileira. Em algum momento, porém, esta questão terá de ser resolvida. Sabe-se também que os portugueses não querem deixar a Vivo, mas não estão satisfeitos com a situação atual. Como isto tudo vai acabar ? Quem vai comprar quem ? Quem vai controlar ? Algumas das sugestões exigem alterações no marco regulatório da área celular. É possível ? Por que não, uma vez que já se cometeu um "casuísmo" para permitir a compra da Brasil Telecom pela Oi. É estranho o silêncio de algumas empresas da área, que inicialmente se puseram contra as alterações no PGO para beneficiar o negócio BrOi e depois estrategicamente se recolheram.
As brigas com as teles
As companhias telefônicas asseguram que não é significativo o número de insatisfeitos com os serviços que elas prestam, embora uma boa pesquisa nos cadastros dos órgãos de proteção ao consumidor não comprove tal informação. Agora, acaba de surgir uma outra pesquisa que também contraria a "tranqüilidade" das teles. No ranking do Yahoo! dos dez termos mais acessados de 2010, encabeçado por "BBB8", aparece, em décimo lugar a "portabilidade numérica". Ora, se há satisfação com o serviço, por que há tanta gente se informando sobre esta facilidade ? Outra pergunta : num mundo tão competitivo, por que as companhias não fazem campanhas agressivas para tirar consumidores umas das outras ? Em suma : quem tem medo da portabilidade ?
A Anatel e as conveniências do tempo
Em abril, depois de selada a então proibida legalmente compra da Brasil Telecom pela Oi, a Anatel começou a analisar a alteração no PGO para tornar limpo o negócio. No fim de outubro terminou toda complexa análise do processo, um tempo recorde para suas ações até agora. Em junho, ela começou a analisar uma norma que proíbe as tevês por assinatura a cobrarem pelos pontos extras na casa. Já adiou duas vezes sua decisão, a última na semana passada, por noventa dias, que se extinguirão no fim de fevereiro. Levará mais tempo nessa questão tão mais simples do que foi a do PGO. Não se discute o certo e o erro das medidas aqui. Estranha-se apenas a presteza quando o negócio é do interesse de empresas e quando pode (não se diz que vai) beneficiar o consumidor.
Sem reforma tributária
O governo vai passar o seu rolo compressor para tentar aprovar a proposta de reforma tributária em primeiro turno na Câmara esta semana. Vai ser apenas "para inglês ver", para ter um "troféu" para exibir mostrando seu esforço para combater a crise em vários campos. Será votado – se for – apenas o texto básico. Todas as emendas polêmicas, que alteram substancialmente o relatório do deputado Sandro Mabel ficarão para o ano que vem. De tudo o que está por lá, talvez só saia com rapidez uma anistia fiscal que o PMDB apresentou e que já não é tão combatida assim no governo.
E sem reforma política
Vem aí também esta semana o relatório da reforma política, preparado pelo deputado João Paulo Cunha. Ponto-chave : fim da reeleição com um mandato de cinco anos para presidente da República, governadores e prefeitos. É uma das apostas de Lula, mas a oposição e até parte dos aliados são contra. Exigiria muita barganha. Pode comover os deputados, pois seus mandatos passariam a ser de cinco anos. Do jeito que está morrerá no Senado : reduz os mandatos dos senadores de oito para cinco anos. Embora não prejudique "direitos adquiridos", não é uma sugestão popular em Brasília. Deve ir para o arquivo.