As grandes lições das urnas
Diante de tantas e tão variadas interpretações por parte do mundo político, ao sabor do interesse de cada um, dos resultados das eleições municipais deste agitado e dramático fim de 2008, é bom não esquecer uma antiga lição de vistosas raposas da cena nacional : em política nada é definitivo. Nem o mais feroz adversário será concorrente para sempre, nem o mais fiel aliado estará definitivamente ao lado do parceiro. O derrotado de hoje pode ser o vitorioso de amanhã. E o vencedor do momento não raro perde espaços num outro embate. A maior, mais importante, mais crucial lição destas eleições foi a demonstração, definitiva, da maturidade do eleitor brasileiro. De um modo geral, ele não deixou se influenciar por padrinhos políticos, pelo marketing vistoso, pelas baixarias. A maior prova disso foi o elevadíssimo índice de reeleições : quase 70% dos atuais prefeitos que tentaram um segundo mandato foram bem sucedidos. Nas capitais, apenas o de Manaus, Serafim Correa, não ficará mais quatro anos no comando da prefeitura. Pragmatismo puro, sabedoria popular. O "teste para 2010" não foi conclusivo. Nem para o lado governista nem para o lado da oposição. Por essas e outras, a grande força que emergiu das urnas de 2008 foi o eleitor. Ele é o senhor da razão.
PMDB, um parceiro incômodo
Vai dar mais dor de cabeça para o Palácio do Planalto o fortalecimento do PMDB nessas eleições municipais, ainda mais depois das vitórias em Porto Alegre, em Santa Catarina, no Rio e em Salvador e a conquista da vice em São Paulo. O partido está dando sinais de que não aceita um papel secundário no condomínio do poder federal, quer partilhar os ônus em pé de igualdade com o PT. O primeiro embate virá na decisão sobre as presidências da Câmara e do Senado. Pelos arranjos brasilienses, a vaga da Câmara ficaria com o PMDB (Michel Temer) e a do Senado com o PT (Tião Viana é o preferido). Pela tradição, o PMDB teria direito às duas vagas, pois é o partido majoritário em ambas as casas. Na vez anterior, abriu mão para Arlindo Chinaglia na Câmara. Agora, a bancada do Senado, comandada por Renan Calheiros, diz que não fará esta generosidade. Está a colocar as cartas na mesa para negociar. Para o governo é insuportável ter a Câmara, o Senado e, por tabela, o Congresso comandados pelo PMDB. Ainda mais este PMDB sempre dividido, cortejado pela oposição e ciente de sua força. Lula terá negociações duras pela frente com os peemedebistas. E muitas concessões a fazer. Sem nenhuma garantia de que o partido que um dia já foi o "partido do Dr. Ulysses" estará com ele em 2010.
Em ascensão
Dentro do PMDB, dois nomes saem fortalecidos : o do governador Sérgio Cabral (RJ) e o do ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima (BA). Os dois são apostas de Lula para ocupar a vice numa chapa encabeçada por Dilma Roussef. Geddel é mais guloso e muito maleável.
Em observação
Como se diz popularmente, subiu no telhado o projeto do bloquinho de esquerda (???) governista – PSB, PDT e PC do B – de correr em 2010 com a candidatura própria do deputado e ex-ministro Ciro Gomes. Embora o PSB tenha alcançado algumas vitórias, o desempenho do grupo, em geral, foi pior que ele esperava. Além disso, os três não mostraram muita capacidade de união. Além do mais, o governo não quer aventuras e quer toda a sua base lutando por um mesmo nome. Aquele que Lula indicar. Até agora, Dilma Roussef.
Em observação – parte 2
Também subiram no telhado os projetos de 2010 do ministro Ciro Gomes. Como visto acima, a candidatura do bloquinho, está afastada. Uma vice na companhia de Dilma está mais para o PMDB. E um projeto com Aécio esbarra no PSDB e na consolidação da aliança PSB-DEM a partir de São Paulo.
Administrando vitórias e derrotas
Inicialmente, apenas na semana que vem o presidente Lula reunirá seus aliados para fazer um balanço dos resultados eleitorais e projetar os próximos passos – no Congresso e na corrida eleitoral para 2010. Esse interregno é providencial – é preciso deixar o clima de mágoas que se instalou na base governista :
1) Mágoas de quase todos os partidos com o PT, que mais uma vez, com exceções, mostrou-se pouco disposto a compartilhar espaços com os parceiros.
2) Mágoas de alguns petistas com o presidente Lula por não ter se envolvido mais em suas campanhas. Alguns acham que ele abandonou o partido por aliados nem sempre confiáveis.
A oposição até comemora
Os partidos oposicionistas de fato – PSDB, DEM e PPS – perderam densidade nos municípios em relação ao que haviam conquistado em 2004. Mas, nas circunstâncias, estão até comemorando :
1) Não sofreram a humilhante derrota que o governo imaginava que lhes infringiria dado o prestígio do presidente Lula.
2) No próprio governo, apesar do otimismo demonstrado por Lula, refluiu a tese de que um candidato apoiado por Lula é favorito automaticamente em 2010. A "construção" de uma candidatura a partir do "quase" nada será mais complicada do que se imaginava, inclusive a da preferida Dilma.
3) O inesperado fortalecimento do PMDB, inicialmente, é uma dor de cabeça maior para o governo do que para a oposição.
4) Em que pesem as ameaças e os riscos corridos no primeiro turno em São Paulo, a aliança com o DEM acabou saindo fortalecida exatamente a partir de São Paulo.
Serra e Aécio
À primeira vista, e até prova em contrário, o governador de São Paulo, José Serra, saiu em vantagem em relação do governador de Minas, Aécio Neves, na disputa particular entre os dois pela vaga de candidato da oposição à sucessão de Lula. Aécio fez a aposta mais ousada e teve de lutar mais do que esperava para eleger seu preferido em Belo Horizonte. E ficou sem um aliado forte, porque o PT ficou com ele, ainda assim em parte, em BH. Não vai abrir caminho nacionalmente para suas pretensões. Aquela hipótese de Aécio no PMDB, com apoio de Lula, está morta e com chances remotíssimas de ressuscitar. Serra enfrentou um racha forte no PSDB paulista, esteve para sucumbir por causa da divisão pessoal entre Alckmin (por obrigação partidária) e Kassab (por opção político-eleitoral), mas acabou compensado : ganhou a prefeitura com Kassab (o que parecia impossível), consolidou a aliança com o DEM e fincou um pé no PMDB. Um partido que "nunca se sabe". Hoje as conversas dos tucanos ecoam em outra direção. O sonho é fazer uma chapa pura, tucana. Há indicações de que o DEM abriria mão da vice. É sonho ainda.
As coisas de Minas
Muito estudo vai ser necessário para que se possa entender perfeita e completamente o que ocorreu este ano em Belo Horizonte, a começar da inusitada aliança PSDB-PT em torno de um candidato de uma terceira legenda – Marcio Lacerda, do PSB. Como explicar tantas voltas e reviravoltas - o candidato que saiu do nada saltando em três semanas nas pesquisas para uma possível vitória no primeiro turno, depois para um empate técnico nas urnas, posteriormente para uma possível derrota humilhante no segundo turno nas pesquisas iniciais e, finalmente, para uma vitória até confortável ? É um desafio. Uma coisa é certa, porém : Belo Horizonte é outra demonstração de que a "teoria do poste" é falha. Há várias explicações para a recuperação no segundo turno do combalido Lacerda – entre elas a melhor qualidade da campanha depois do vexame inicial – porém a mais significativa foi a "liberação" do candidato de seus dois padrinhos – o governador Aécio Neves e o prefeito Pimentel. No primeiro turno, Lacerda aparecia como um fantoche de ambos, sem vida própria. O eleitor se recusou a votar em quem não podia conhecer. Quando Lacerda começou a aparecer mais, e Aécio e Pimentel ficaram mais discretos, o mineiro pode ver que havia um burocrata com qualidades para seguir a boa trilha de Aécio e Pimentel. Não basta o padrinho mostrar "eu faço, eu fiz". Precisa deixar que seu apadrinhado também mostre que sabe fazer.
Vovô sabia
O mineiro Aécio Neves quase foi vítima de uma daquelas espertezas políticas que segundo o avô dele, Tancredo Neves, de tão espertinhas acabam comendo o esperto. Vamos à história. Quando armou a inesperada aliança em BH com o PT e o PSB, o governador quis incorporar também o PMDB. Encontrou reações no velho adversário Newton Cardoso e, principalmente no ministro das Comunicações, Hélio Costa, ele mesmo com pretensões ao governo de Minas. Vendo que não conseguiria trazer os peemedebistas para o bloco, Aécio, que tem tentáculos no partido, armou a candidatura de Leonardo Quintão, parlamentar inexpressivo e tido como fiel à sua liderança. O outro concorrente era adversário de Aécio na Assembléia. Quintão venceu a convenção por influência do governador. Depois, fugiu do script e quase derrota Aécio.
Copom: mercado pode estar errado
Na reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central desta semana será decidida a nova taxa de juros básica atualmente em 13,75% ao ano. Segundo o relatório FOCUS do BC que registra as opiniões dos analistas e economistas de mercado a taxa pode vir a ser elevada em 0,25%. É possível que o mercado esteja com um viés de alta em relação ao juro. No momento, o BC pode privilegiar a manutenção da liquidez e não a inflação. Para isso terá de dar sinais para o mercado. Sobretudo, para os bancos.
O mesmo vale lá nos EUA
Também o Federal Reserve vai reunir o seu Comitê de Mercado Aberto (sigla em inglês, FOMC) no qual deve ser decidida a redução da taxa de juros em 0,5%. Deve incrementar ainda mais a liquidez do mercado. Medidas heróicas num mercado difícil.
Mudança de tema
Note-se que no mercado financeiro internacional as inquietações estão se tornando maiores em relação à probabilidade de uma recessão profunda e séria. Evidentemente, as questões relacionadas com a segurança do sistema persistem, mas estão menores que há duas semanas. A eleição americana será daqui a uma semana e é este fato que irá ocupar as atenções dos analistas de plantão. Afinal, sem matéria de macroeconomia a solução é política. Sempre.
Medidas Provisórias 442 e 443
Não será propriamente um teste político a votação das medidas provisórias que introduziram uma série de medidas para aliviar os impactos da crise externa sobre o país. A crise é tão intensa e imprevisível que a oposição terá no máximo um papel moderador no processo de votação. Todavia, não dá para reduzir o papel moderador da oposição, em particular, e do Congresso, em geral. Afinal de contas, as medidas provisórias aumentam dramaticamente a participação do Estado no sistema financeiro, seja de forma direta (via aquisições de carteiras e, até mesmo, do controle capital) ou de forma indireta (por meio das provisões de liquidez via BC, BNDES e bancos oficiais). Há ainda outro aspecto a ser notado em tudo isso : o governo passou de um discurso absolutamente otimista no início da crise mais aguda para ações bastante ousadas, comparáveis aos países nos quais a crise é cruel. Por que será ? É uma pergunta sem resposta clara...